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Seleção 'às cegas' aumentou em 80% diversidade nas contratações da B3, diz gerente

Bolsa de Valores adotou 'currículo oculto' nos processos seletivos a fim de eliminar vieses reforçados por estereótipos e ampliar representatividade de mulheres, pessoas negras e com deficiência

24 jan 2023 - 05h10
(atualizado às 08h13)
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Manuela Alves, gerente de Desenvolvimento Organizacional, Cultura e Diversidade da B3
Manuela Alves, gerente de Desenvolvimento Organizacional, Cultura e Diversidade da B3
Foto: Estadão

Um dos desafios para as empresas evoluírem em termos de diversidade e inclusão (D&I) é lidar com os vieses inconscientes. São pensamentos construídos de acordo com referências culturais e sociais, expressando estereótipos e preconceitos. Para endereçar essa questão, um dos artifícios é realizar processos seletivos às cegas com o uso, por exemplo, do currículo oculto.

Com esse recurso, algumas informações dos candidatos são omitidas para evidenciar apenas o que é essencial para a vaga, como o histórico profissional e acadêmico. A B3, Bolsa de Valores brasileira, adotou a ferramenta em 598 processos seletivos conduzidos entre setembro de 2021 e agosto de 2022 e viu resultados expressivos: 467 pessoas com perfis de grupos subrepresentados foram contratadas.

"No último ano, a gente aumentou a nossa contratação diversa de 53% para 80%, aumentou bastante a representatividade", destaca Manuela Alves, gerente de desenvolvimento organizacional, cultura e diversidade da companhia.

Dos 2.887 funcionários da B3, 37% são mulheres, 24% são pessoas negras e 5,2% são pessoas com deficiência. Nos cargos de liderança, elas representam, respectivamente, 29%, 12% e 2%. Esses são os três grupos prioritários da empresa nesse momento. Quanto às companhias listadas, 37% não têm mulheres no conselho de administração.

Ao adotar medidas intencionais para ampliar a diversidade e equidade na companhia, a B3 serve de exemplo para organizações de diversos setores, segundo a gerente. Em entrevista ao Estadão, Manuela Alves fala sobre as iniciativas.

O currículo oculto foi adotado para contratações em quais áreas da B3?

A gente adotou para 100% das áreas aqui da B3. Quando a gente fala de diversidade e inclusão, a gente tem de olhar para todas as práticas, desde a atração das pessoas de públicos diversos, a chegada delas, a inclusão, até o desenvolvimento, engajamento e retenção. A partir do momento que eu trabalho a minha marca empregadora e começo a mostrar representatividade para que públicos minorizados se sintam representados, interessados em trabalhar na B3, eu tenho a etapa de recrutamento e de seleção, realmente. Então, o currículo oculto é uma prática que ajuda a minimizar vieses e, nessa etapa, a gente entendeu que aplicar o currículo oculto era uma forma da gente minimizar esses vieses inconscientes.

Como o recurso funciona na prática?

A gente tira algumas informações, como o nome da universidade, o endereço, o nome da pessoa para não identificar o gênero dela, e a partir do momento que o gestor olha esses currículos, ele define qual tem mais sentido para sua posição e vai para a entrevista. Só na entrevista ele descobre quem é a pessoa. A gente tira essas informações para minimizar, de fato, os vieses.

Quais foram os resultados dessa prática até agora?

No último ano, a gente aumentou a nossa contratação diversa de 53% para 80%, então, dos processos seletivos que a gente vem fazendo, com aplicação de short list diversa, a gente aumentou bastante a representatividade na B3. De 2018 para 2019, a gente tinha 8% de negros e eu estou fechando 2022 com mais de 24%. A gente entende que essa, inclusive, é uma das práticas que ajudou a evoluir.

Uma vez que o endereço é omitido, as vagas possibilitam flexibilidade geográfica?

Na verdade, a gente atua no modelo híbrido. Predominantemente, hoje, a gente tem mais pessoas de São Paulo aqui, mas também tem em todo o Brasil algumas pessoas no esquema de teletrabalho.

Com o currículo oculto, algum perfil diverso se destacou nas contratações?

Desde o ano passado, a gente tem uma meta corporativa de aumento de representatividade de três públicos que impactam 100% na companhia, desde assistentes até o nosso CEO. São pessoas com deficiência, mulheres na liderança e negros. Então, a gente vem trabalhando intencionalmente o aumento de representatividade desses públicos. O que eu vejo que a gente mais aumentou de fato são pessoas negras.

E quais têm sido os reflexos das novas contratações, além de maior representatividade?

A gente vê diversidade como um meio, não como um fim. A gente entende que diversidade é uma forma de ser, de fato, uma empresa mais inovadora, ter resultados mais sustentáveis, ter um ambiente inclusivo e seguro para que as pessoas possam ser quem elas são. O que a gente percebe é que, desde que começamos a trabalhar diversidade intencionalmente, a diversidade faz parte da nossa cultura, vê que isso está em todos os níveis, em todos os lugares, não é só uma coisa da área de recursos humanos ou de sustentabilidade. Acho que impactou muito a cultura da B3.

A partir dessas contratações, quais são as iniciativas para engajar e reter esses profissionais?

A gente trabalha muito por meio do desenvolvimento, que é um dos nossos valores como companhia. Tem, por exemplo, um programa de estágio destinado para negros, uma grade de mentoria de desenvolvimento específica para que essas pessoas se integrem e se sintam de fato incluídas na companhia. Tem programa de mentoria para mulheres e, em 2022, lançamos a segunda edição, muito com foco em liderança, e priorizamos 50% das vagas para mulheres negras. Então, a gente tem todos esses mecanismos, mas é muito através do desenvolvimento da pessoa que chega, do gestor, da companhia inteira, para que todo mundo entenda, de fato, como incluir e desenvolver, porque todo mundo é responsável por fazer isso também. A gente é responsável por criar esse ambiente realmente seguro, livre de assédio para que as pessoas possam ser quem elas são.

Recentemente, a B3 anunciou regras de D&I para as empresas listadas na bolsa. Há alguma forma de apoiá-las nessa jornada?

A B3 tem um duplo chapéu. Um como empresa listada, com todas essas ações de mentoria, inclusão e currículo oculto, e outro de indutor de prática de mercado. No começo de 2022, a gente fez um programa para formação de negros no mercado financeiro, em que capacitou e certificou mais de 125 pessoas, que não necessariamente vão trabalhar na B3, a gente conecta essas pessoas com nossos clientes. Outra iniciativa que suporta um pouco essa regra foi um programa de formação para conselheiros negros junto com o IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) e a Iniciativa Empresarial pela Igualdade para formar uma turma de 33 executivos negros para sentar em cadeira de conselho.

De que outras formas vocês esperam impactar o mercado?

Como a gente tem evoluído quanto companhia listada, às vezes os nossos clientes nos procuram para saber como fizemos algo, como fizemos censo, então a gente desenha guias de boas práticas junto com a nossa experiência e compartilha, faz treinamento com os RHs das empresas, com as áreas de sustentabilidade, para que o mercado também avance nesse lugar de inclusão.

Você vê desafios nessa jornada de trabalhar diversidade e inclusão no mercado financeiro, que é mais tradicional?

As barreiras para diversidade e inclusão são comuns aos mercados. Eu vejo que a principal forma da gente, de fato, evoluir a pauta é com educação, no desenvolvimento, falando sobre. Quando a gente começou a falar de diversidade e inclusão na B3, a primeira coisa que a gente fez foi criar o nosso núcleo de diversidade, porque a gente tinha de ouvir as pessoas dos públicos minorizados para que entendesse qual era o caminho. Entendo que os principais desafios são endereçados com educação, com a gente falando sobre e com as pessoas não tendo medo de perguntar, de errar, porque a gente sabe que está todo mundo evoluindo e aprendendo também. As empresas são muito mais abertas hoje em dia do que anteriormente.

Estadão
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