Silvio Almeida foi acusado publicamente de assédio ou importunação sexual por 6 mulheres
Caso envolvendo o ex-ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania é investigado pela Polícia Federal
Desde que a organização Me Too confirmou que recebeu denúncias de assédio sexual contra Sílvio Almeida, ex-ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, seis mulheres vieram a público contar que foram vítimas do jurista e profesor. Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial, uma advogada e quatro ex-alunas de Almeida relataram o caso para a mídia. A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público do Trabalho apuram as acusações. Silvio Almeida nega.
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O escândalo se tornou público em 5 de setembro deste ano, quando a ONG, que apoia vítimas de violência sexual, confirmou ter recebeido denúncias contra o ex-ministro e prestou atendimento jurídico e psicológico às vítimas. A informação foi inicialmente divulgada pelo Metrópoles.
Anielle Franco
O comportamento inadequado do ex-ministro teria começado durante o período de transição entre os governos Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda em 2022. Silvio Almeida teria passado a mão entre as pernas de Anielle durante reuniões oficiais. Uma delas teria ocorrido em maio de 2023, conforme informou o Metrópoles.
Anielle Franco prestou depoimento à PF no início de outubro. Em entrevista ao Fantástico, ela falou que não tinha nenhuma relação com Almeida antes de começarem a trabalhar no mesmo governo.
"A gente também nunca teve nenhum tipo de intimidade para que eu desse qualquer tipo de condição para ele fazer o que ele fez. Nenhuma. Existe uma coisa na sociedade que a gente precisa diferenciar: o que é se aproximar ou cantar uma pessoa com respeito, e o que é violentar, importunar e assediar uma pessoa. É bem diferente isso", declarou.
Segundo a chefe da pasta de Igualdade Racial, as importunações do ministro duraram "mais de ano", e começou com "falas e cantadas mal postas". "E vai escalando para um desrespeito pelo qual eu também não esperava. Até situações que mulher nenhuma precisa passar, merece passar ou deveria passar", disse.
Quando questionada sobre as notícias de que o ex-ministro a teria tocado por debaixo da mesa durante uma reunião, que aconteceu em 16 de maio de 2023, Anielle se emocionou.
"Não é normal a gente passar por isso em pleno 2024, independente de quem faça, sabe? Você tocar, assediar ou violentar o corpo de uma mulher é uma das coisas mais abomináveis que pode existir [...] Anielle foi vítima. Mas Anielle, hoje, enquanto ministra de Estado, enquanto mãe, feminista, negra, irmã, tem uma responsabilidade também nesse lugar de combater e de fazer com que esse País vire um lugar melhor para todos nós", desabafou.
A ministra aponta que achava que essas importunações parariam sozinhas e que, quando ela falasse, seria respeitada -- o que não aconteceu, segundo a ministra.
"E esse foi o último momento em que eu tentei. Quando de fato mais uma barreira é rompida, mais uma fala ou desrespeito acontece. E aí eu entendi que não tinha como", disse, complementando que Almeida era "bem desrespeitoso".
Ela ainda diz que se sentiu "invadida, vulnerável, exposta" ao fazer a denúncia.
Isabel Rodrigues
Isabel Rodrigues, professora e ex-amiga de Silvio Almeida, afirmou em um vídeo publicado em seu Instagram que foi vítima de assédio em agosto de 2019, durante um almoço com o ex-ministro e outros colegas de curso. Ela o conheceu em uma reunião da Escola do Governo, quando ele era membro do Conselho Pedagógico.
Segundo contou, eles se tornaram amigos e, na ocasião em que foi assediada, havia assistido a um curso do ex-ministro em parceria com outros colegas. Após este evento, todos foram almoçar em um restaurante na Praça da República.
"Ele estava do lado direito e eu do lado esquerdo. Eu estava de saia, ele levantou a saia e colocou as mãos nas minhas partes íntimas. Eu fiquei estarrecida, fiquei com vergonha das pessoas, porque é assim que as vítimas se sentem, as vítimas ficam com vergonha e esse caso teve muitos retornos na minha vida. Demorou pra eu entender que eu estava sendo vítima de violência sexual", relatou.
Ao Metrópoles, ela disse que decidiu divulgar a sua história depois que o jurista e professor desqualificou suas supostas vítimas. "Ele as chamou de mentirosas e disse que fazem parte de um grupo. Não pude me calar", afirmou. Ela também foi ouvida pela PF.
Ex- alunas
À coluna de Guilherme Amado, uma ex-aluna de Silvio Almeida na Universidade São Judas, que não teve o nome revelado, afirmou que foi assediada em 2007. Ela afirma que ele se comportou como um "predador sexual".
"A gente estava conversando quando ele chegou. Eu não me sentia muito à vontade com a presença dele, então dei um passo para trás para evitar cumprimentá-lo. Ele me olhou e falou assim: 'Você não vai me dar um beijo com essa sua boca gostosa, não?'. Aí eu travei e ele me puxou, me deu um beijo no canto da boca, quase meio lábio. Entrei em choque e saí da roda de pessoas. Todos os outros continuaram", relatou.
Ainda de acordo com ela, o professor tinha um "comportamento de medir com o olhar", e mordia os lábios quando olhava para as estudantes. "O jeito que ele abraçava a gente, pegava um pouco abaixo do seio. Era escancarado, fora do normal", acrescentou.
Outra ex-aluna da mesma instituição contou ao Metrópoles que teria sofrido o assédio em 2017, em um café dentro da faculdade.
"Eu e Silvio Almeida estávamos no café, conversando sobre o projeto de iniciação científica, quando ele colocou as duas mãos nas minhas pernas, com vontade, e foi subindo o máximo que conseguiu, enquanto falava normalmente. Eu estava de saia. Me afastei, fiquei muito aflita. Fui embora, nem assisti à aula naquele dia e pensei em largar a faculdade", afirmou.
Uma terceira ex-aluna de Almeida na mesma faculdade contou que sofreu assédio em 2009, quando o ex-ministro integrava a banca de avaliação de sua monografia. Conforme o relato dela ao Intercept, o professor a telefonou por várias vezes, após ter conseguido seu contato com alguém que ela não sabia.
"Acho que a gente devia sair para conversar sobre o seu tema, porque eu não quero que você saia prejudicada", teria dito o jurista na ocasião. Na época, a estudante não procurou a reitoria, pois não tinha provas. "Fiquei com medo de ele realmente me prejudicar na monografia".
A sexta denúncia também é de uma ex-aluna de Silvio. Em entrevista a Sônia Bridi, para o Fantástico, ela contou que o então professor a convidou para sair algumas vezes. Ao ser a última a entregar uma prova, o ex-ministro foi em sua direção e ficou muito próximo.
"Eu achei que fosse para pegar a prova. Mas ele continuou se aproximando ao ponto de chegar muito próximo, e eu fui dando os passos para trás. Só que eu já estava bem próxima da parede, porque eu sentei nas últimas fileiras. Era menos de um palmo. Nariz com nariz. Três, quatro dedos. Chegou muito próximo ao ponto de, em algum momento, a cabeça ir um pouco mais para trás para afastar", relatou.
Ela contou que só teve ciência da gravidade quando viu a reportagem de Anielle. "[A atitude] Foi muito próxima de se tornar algo maior".
Silvio Almeida nega
Desde quando as denúncias de importunação sexual se tornaram públicas, o ex-ministro negou as acusações. No último dia 6, ao Fantástico, a defesa de Almeida comentou o caso.
"Em primeiro lugar, ele nega veementemente todas essas referências feitas em desfavor dele. Em segundo lugar, e o mais importante, é que essa investigação, para a defesa, continua sigilosa. Nós não tivemos acesso a nenhum depoimento, nem da ministra, nem de outras pessoas. Sabemos através da imprensa. O que não é razoável é que, em plena vigência da Constituição, que se chama de 'Constituição Cidadã', a defesa saiba de episódios esparsos a partir do noticiário, da imprensa escrita, falada, televisada. Evidentemente, quando esses fatos forem impostos - esses fatos não, essas versões, vamos contraditar todos eles e a verdade vai prevalecer", disse o advogado Nélio Machado.