STF proíbe desqualificação de mulheres vítimas de violência sexual
Por unanimidade, Supremo invalida estratégia jurídica de mencionar histórico sexual da vítima em julgamentos de violência contra a mulher
O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quinta-feira (23), por unanimidade, ser inválida a prática de desqualificar e culpar as mulheres vítimas de violência - incluindo crimes sexuais - durante o julgamento.
Prevaleceu o voto da relatora, Cármen Lúcia, no sentido de impedir que a vida sexual pregressa da vítima seja utilizada como argumento para desqualificação moral por policiais, advogados e juízes durante depoimentos em delegacias, audiências e decisões judiciais em todo o país.
Esse entendimento foi seguido pelos ministros Edson Fachin, Dias Toffoli, Flávio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes e o presidente Luís Roberto Barroso.
"O que se pretende aqui é não permitir que, por interpretações que são dadas aos dispositivos legais, haja alguma abertura para que o próprio Estado-juiz e o Estado que faz a investigação revitimizem a mulher", argumentou Cármen Lúcia.
"Vítimas sofrem questionamentos sobre vida sexual"
Segundo a relatora, essas práticas, desprovidas de base legal, "foram construídas em um discurso que distingue mulheres entre as que 'merecem e não merecem' ser estupradas". A ministra afirmou que as vítimas de crimes sexuais são acusadas de serem promíscuas por suas vestimentas e sofrem questionamentos sobre a vida sexual.
Além de impedir a valoração da vida sexual da mulher, a ministra votou para proibir utilização da tese de legitima defesa da honra pelo réu acusado de crime sexual para justificar a violência e pedir a absolvição.
Pela proposta, os órgãos envolvidos na apuração e no julgamento do caso também deverão impedir a desqualificação das vítimas, sob pena de responsabilização.
"A maneira pela qual a vítima é tratada e reconhecida pelo processo penal revela toda forma de discriminação, preconceito e de manutenção da desvalorização indigna das mulheres", afirmou.
Inicialmente, os ministros tinham decidido que a vedação valeria para casos de crimes sexuais. Mas, ao final do julgamento, os ministros decidiram estender para todos os crimes de violência contra a mulher - os delitos previstos na Lei Maria da Penha e a violência política de gênero, por exemplo.
Caso Mari Ferrer
Um dos casos que motivaram a ação da PGR ocorreu com a modelo e influenciadora digital Mariana Ferrer. Durante audiência na qual prestou depoimento na condição de vítima de estupro, ela foi constrangida pelo advogado do acusado.
O episódio provocou a aprovação da Lei Mari Ferrer, norma que protege vítimas e testemunhas de constrangimentos. No ano passado, o juiz responsável pelo caso foi advertido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
md (Agência Brasil, ots)