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“Tem que estar preparada três vezes mais”, diz Kenya Sade sobre ser uma mulher negra na TV

A comunicadora LGBTQIA+, uma das apresentadoras do The Masked Singer Brasil, alçou voo na Globo ao cobrir festivais de música no Multishow

28 mar 2024 - 05h00
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Apresentadora global Kenya Sade, que é lésbica, comenta que se assumir é também fazer política
Apresentadora global Kenya Sade, que é lésbica, comenta que se assumir é também fazer política
Foto: Rodolfo Sanches/Divulgação

“Angela Davis diz que ‘quando a mulher negra se movimenta, a estrutura da sociedade se movimenta com ela’. Não é mentira. Falam que é uma frase batida, mas não. É muito real. Sei que eu puxo outras e outras e outras e outras”, reflete a apresentadora Kenya Sade, 30, sobre ser uma referência negra na TV e os espaços que tem ocupado.  

A comunicadora, que é uma das apresentadoras do The Masked Singer Brasil, alçou voo na Globo ao cobrir festivais como o Rock In Rio e o Lollapalooza, com maestria, no Multishow. O talento dela, no entanto, vinha se desenvolvendo muito antes, na plataforma Trace Brasil – especializada em cultura afrourbana. Ali, assumiu que a TV também era seu lugar, sendo uma mulher preta retinta e LGBTQIA+. 

“O pós pandemia [da Covid-19] e, principalmente, depois de George Floyd, o mundo se viu obrigado a questionar sobre a diversidade nos espaços. Acho que o Brasil foi um país que acordou muito depois disso”, diz Kenya, em entrevista ao Terra NÓS

Para ela, é preciso “mais diversidade nas telas, na frente e por trás das câmeras”. E concorda que sua chegada em emissoras como a Globo corrobora com esse momento de transformação na mídia brasileira. 

Mulheres pretas confiantes 

Um mecanismo do racismo estrutural, ainda vivemos em uma sociedade que tenta minar a autoestima de mulheres negras, em suas diferentes áreas. Por isso que a trajetória de Kenya, uma personalidade que traduz inspiração e confiança, é transformadora. 

“Porque nos foi ensinado que esse lugar não era nosso. Sempre nos foi contado que ambição era uma coisa negativa, quando, na verdade, é você querer mais”, analisa. 

A apresentadora conta que é uma pessoa espiritualizada, que faz terapia e entende que esses cuidados são necessários para não se sabotar diante das desigualdades.

“Hoje, vivo em um Brasil que me permite estar onde eu estou, mas é uma construção. Sinto que a gente tem que estar muito preparada, três vezes mais preparada”, confessa.  

“Sou uma mulher preta que fala inglês fluente, espanhol, tive uma formação muito boa. Mas sabemos que essa não é a realidade nem da metade das mulheres pretas no Brasil. De toda forma, acredito nessa caminhada e sei que outras de nós chegarão lá [na TV e outros espaços de destaque e poder], já estão chegando, na verdade. E cada vez mais.”

“A gente tem a Maju Coutinho, Cris Guterres, tivemos Glória Maria. Temos tantas outras. E não teremos só uma Kenya.”

Letramento racial 

Além disso, Kenya fala que a confiança em seu potencial vem do fato de ser uma mulher letrada racialmente. “O movimento negro fez um trabalho para que a gente chegasse onde estamos hoje.”

Ela explica que o incentivo para esse letramento veio da mãe, Regina, que é economista. “Fui atrás porque eu tinha essa necessidade de descobrir a minha história, ancestralidade, principalmente sendo uma mulher preta brasileira, mas também que tem uma origem angolana por conta do meu pai”, relembra. 

Entre as autoras feministas negras que leu – e recomenda – ela cita Djamila Ribeiro, Conceição Evaristo e Sueli Carneiro.

Conheça Kenya Sade, apresentadora lésbica que tem brilhado na Globo Conheça Kenya Sade, apresentadora lésbica que tem brilhado na Globo

Um divisor de águas nessa trajetória também foi uma viagem ao Reino Unido e à França. “Onde tive contato com outras mulheres pretas da diáspora. Isso me transformou. Parece que eu me redescobri enquanto mulher negra, me empoderei para chegar no Brasil com toda essa força e confiança”, relata. 

Referências femininas 

A jornalista reflete ainda que sua batalha por representatividade é uma luta coletiva. “Estou acompanhada de outras mulheres que também abriram caminhos”, complementa. E uma delas é a atriz Taís Araújo.

“Ela é uma grande referência para mim. Taís é essa referência de beleza, de excelência de entrega e eu sinto que estou virando também esse símbolo, mas com os pés no chão, para não subir à cabeça. É uma longa trajetória e eu não ando sozinha.”

Outra grande referência para Kenya é a mãe. Ela destaca que Regina apostou todas as fichas nela. “Fui uma criança que pode sonhar. Em nenhum momento ela falava que eu não poderia ser alguma coisa.”

“Acho que ela [minha mãe] já sabia que a trajetória não iria ser fácil. Sou uma mulher preta no Brasil, e  LGBTQIA+. Por conta da minha criação, sou uma mulher muito mais confiante.”

Kenya é casada com a artista visual Thamyres Donadio. Elas começaram o relacionamento em 2019 e moram juntas há pelo menos dois anos. “Levo isso com muita naturalidade. Inclusive, falo da minha esposa o tempo inteiro, é uma parte de mim, é meu grande amor.”

“Falo disso abertamente, sobre ser uma mulher lésbica. Firmar esse nosso relacionamento é, de certa forma, fazer política e dar visibilidade a outras mulheres LGBTQIA+. Além disso, tem muitas pessoas que não se aceitam, é uma maneira de mostrar que é possível estar nos espaços sendo quem você é”, finaliza.

Fonte: Redação Nós
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