Arthur do Val: 37 deputados pedem cassação de membro do MBL
Parlamentares de diversos partidos pediram a cassação do deputado; Do Val chamou a mobilização de 'injustiça'
As declarações do deputado estadual Arthur do Val (Podemos-SP) que depreciaram mulheres ucranianas mobilizaram ao menos 37 parlamentares da Assembleia Legislativa de São Paulo a assinar representações no Conselho de Ética da Casa. Segundo a presidente do Conselho, Maria Lúcia Amary (PSDB), nove pedidos individuais e dois coletivos serão avaliados, em sua maioria acusando o colega de quebra de decoro parlamentar e pedindo a cassação de seu mandato.
Ao menos 24 parlamentares assinaram um documento conjunto que pede a cassação do mandato do político, motivados pela divulgação de áudios de caráter machista e sexista. Outros deputados também entraram com representações individuais e coletivas ou corroboraram pedidos de organizações.
Parlamentares ouvidos pelo Estadão assumem a possibilidade de Arthur do Val perder seu mandato se o caso chegar à votação plenária. A cassação exige que mais da metade da Casa vote favoravelmente - ao menos 49 votos no caso da Alesp. Os deputados reforçam, porém, que os procedimentos do regimento serão respeitados e que Arthur do Val tem direito a defesa.
Entre outras declarações, do Val afirmou que as mulheres ucranianas são "fáceis porque são pobres". Ele passou a semana de carnaval no Leste Europeu sob alegação de acompanhar a guerra e colaborar com a Ucrânia após a invasão russa.
Em nota, o deputado afirmou que lutará "contra a injustiça", se referindo à iniciativa de parlamentares que pedem a cassação do seu mandato.
"Dei uma declaração lamentável, admito e peço desculpas por isso; além de tudo, perdi minha noiva e prejudiquei meus amigos. Isso tudo é sinal dos tempos: ladrões ficam impunes, gente honesta perde o mandato. Lutarei até o fim contra esta injustiça", escreveu.
Representações
A primeira representação coletiva foi assinada por Carlos Gianazzi (PSOL); Dr. Jorge do Carmo (PT); Emídio de Souza (PT); Gil Diniz (PL); José Américo (PT); Leci Brandão (PC do B); Luiz Fernando T. Ferreira (PT); Márcia Lia (PT); Maurici (PT); Mônica da Mandata Ativista (PSOL); Patrícia Bezerra (PSDB); Paulo Fiorilo (PT); Professora Bebel (PT); Ricardo Madalena (PL) e Teonílio Barba (PT).
Posteriormente, outros nove deputados também assinaram o documento. São eles: Ataíde Teruel (Podemos), Carlos Cezar (PSB), Castello Braco (sem partido); Coronel Telhada (PP); Coronel Nishikawa (PSL); Daniel Soares (DEM); Major Mecca (PSL), Isa Penna (PSOL) e Valéria Bolsonaro (PRTB).
Outras duas organizações pediram a cassação do parlamentar: o Movimento Contra a Corrupção Eleitoral e a Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil. Esta última ainda foi assinada por quatro deputadas da Alesp.
De acordo com a deputada Maria Lúcia Amary, presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Alesp, a bancada do PSDB também entrou com uma representação coletiva contra Arthur.
Entre as representações individuais está a do deputado Ataíde Teruel, do Podemos. No documento, escreve que "não há alternativa senão a cassação do mandato do deputado indigno".
Em seu pedido, Janaina Paschoal (PRTB) diferiu dos colegas e pediu investigação sobre a arrecadação financeira do Movimento Brasil Livre (MBL) na Ucrânia. "Peço para apurar a questão das doações (MBL) e, se ficar comprovado que utilizou uma desculpa humanitária para levantar um valor que não chegou à totalidade (da doação),peço cassação", afirmou a deputada.
Arthur enfrentará um pedido de expulsão dentro do Podemos requerido pelas presidentes do Podemos Mulher Nacional e estadual de São Paulo, respectivamente, Márcia Pinheiro e Alessandra Algarin. "Eu não vou forçar o partido a me aceitar, de jeito nenhum. Se o partido não me quer eu saio", afirmou.
Procedimento
Ao Estadão, Maria Amaryinformou que as possíveis sanções ao deputado são advertência, censura verbal ou escrita, perda temporária do mandato ou até perda efetiva do cargo.
Amary afirmou ainda que receberá os pedidos formalmente nesta segunda-feira e dará andamento ao processo. O Conselho de Ética deve se reunir nesta quarta-feira, 9, para apurar como serão encaminhadas as representações. O prazo para a resolução será de 30 dias, de acordo com o regimento. "É importante que a gente dê uma resposta à sociedade" defendeu a deputada.
O presidente da Alesp, Carlão Pignatari (PSDB), afirmou que a fala de Arthur do Val foi "repugnante e inaceitável", disse que a Casa "rejeita em absoluto as opiniões pessoais" do deputado e que "irá investigar a conduta com o rigor e a seriedade que requer."
Vice-presidente do Conselho de Ética, o deputado Barros Munhoz (PSB), corrobou que o grupo colegiado concorda que existe urgência em tomar uma decisão. "Os fatos são muito claros e evidentes. Não há muita coisa a ser questionada", disse.
Áudios
Na última sexta-feira, passaram a circular na internet áudios de Arthur do Val contendo declarações consideradas machistas e misóginas sobre mulheres ucranianas. "A fila das refugiadas, irmão. Imagina uma fila de sei lá, de 200 metros ou mais, só deusa. Sem noção, inacreditável, é um bagulho fora de série. Se pegar a fila da melhor balada do Brasil, na melhor época do ano, não chega aos pés da fila de refugiadas aqui", disse o parlamentar a um grupo de amigos no WhatsApp.
O deputado havia viajado à fronteira da Ucrânia para, segundo ele, prestar apoio aos refugiados que saem do país após os bombardeios da Rússia. De volta ao Brasil, Arthur do Val confirmou a veracidade dos áudios, pediu desculpas pelas declarações e retirou sua pré-candidatura ao governo de São Paulo.
As declarações do político também foram repudiadas por Sérgio Moro, pré-candidato à Presidência pelo Podemos. Antes mesmo de "Mamãe Falei" retirar sua pré-candidatura em São Paulo, o presidenciável afirmou que não aceitaria dividir palanque com ele no Estado.
Precedente
A ação contra Arthur do Val acontece cerca de um ano após a punição ao deputado estadual paulista Fernando Cury (sem partido), que teve o mandato suspenso por seis meses na Alesp por cometer importunação sexual contra a colega parlamentar Isa Penna.
A primeira pena determinada foi de afastamento por 119 dias, após aprovação do relatório do deputado Wellington Moura (Republicanos), para preservar os empregos dos funcionários do gabinete de Cury — admite o próprio Moura no voto — uma vez que, quando o decreto da suspensão é de menos de quatro meses, não há necessidade de convocação do suplente.
Isa Penna classificou a punição como "legalização do assédio", ao Estadão, logo após o anúncio. Um mês depois, a decisão do conselho foi revista pelo plenário — a Casa decidiu pela suspensão de 180 dias. Durante o período, o Fernando Cury não recebeu salário. Penna definiu a punição como uma "vitória histórica", mas considerava que a pena mais correta seria a cassação./Levy Teles, Gustavo Queiroz e Davi Medeiros