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Bolsonaro errou ao ir a ato e não dar exemplo à população, avaliam infectologistas

Segundo médicos, presidente expôs manifestantes ao risco, não se protegeu e ainda passou ao país mensagem de que surto não é coisa séria

15 mar 2020 - 16h53
(atualizado em 17/3/2020 às 15h38)
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SÃO PAULO - Para médicos especialistas em doenças infecciosas, o presidente Jair Bolsonaro errou três vezes neste domingo, 15, ao desrespeitar a quarentena e ter contato com participantes dos atos realizados neste domingo: ao ignorar a recomendação de isolamento e expor os manifestantes ao risco de contaminação pela covid-19 (caso esteja com o vírus incubado); ao não proteger a si próprio e ter contato com uma aglomeração que pode incluir pessoas infectadas; e ao não dar o exemplo à população de que a orientação do Ministério da Saúde de evitar aglomerações deve ser levada a sério.

"Em primeiro lugar, como autoridade do País, seria importante ele dar esse exemplo de se resguardar. Se a gente não dá exemplo, fica difícil para a população aderir, achar que é sério, achar que tem importância. Nesse contexto, todos nós temos que manter a coerência. Cabe a nós, pessoas públicas, profissionais da saúde, pessoas de agências, dar o exemplo de coerência", opinou a médica Nancy Bellei, professora de infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia.

Para o epidemiologista Eliseu Waldman, professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), a conduta de Bolsonaro entrou em conflito com as recomendações das autoridades sanitárias. "O Ministério da Saúde fala uma coisa e o presidente, não com palavras, mas com atos, fala outra", disse ele, destacando que não é a primeira vez que Bolsonaro desconsidera o alerta mundial sobre a pandemia e minimiza o surto.

No último dia 10, por exemplo, quando o mundo já tinha 113 mil casos e 4 mil mortes confirmadas pela doença, Bolsonaro declarou, em discurso nos Estados Unidos, que "a questão do coronavírus" era "muito mais fantasia". "Não é tudo isso que a grande mídia propaga pelo mundo todo", disse.

Os médicos consultados pelo Estado explicaram que o fato de o presidente ter tocado as mãos e os celulares dos manifestantes e conversado com alguns deles expôs todos esses contatos mais próximos à contaminação, caso o presidente esteja com o vírus.

"A gente ainda não sabe para o coronavírus o potencial de transmissibilidade de uma pessoa sem sintomas. Agora, tudo que a gente não sabe, a gente deve prevenir e não esperar a experiência demonstrar. Se essa transmissão for possível como é possível para influenza (gripe), eu não preciso nem tossir nem espirrar. Se eu estiver do lado de uma pessoa com influenza e falar, eu transmito para ela. Se isso for possível também para coronavírus, ele pode transmitir. Então não é uma atitude de bom senso", explica Nancy.

De acordo com o infectologista Celso Granato, professor da Unifesp e diretor médico do Grupo Fleury, o correto seria Bolsonaro manter o isolamento por 14 dias desde o último contato que teve com um caso confirmado, o que ocorreu na última quarta-feira, quando o presidente se encontrou com Fabio Wajngarten, secretário de comunicação do governo que testou positivo para a doença após retornar de viagem aos Estados Unidos.

"Os dados que a gente tem é que é um vírus resistente, com alta transmissão. Pegar no celular e em outros objetos pode deixar uma 'impressão digital com o vírus'. É um risco potencial", explica o especialista.

Ele ressaltou que o presidente deveria ter evitado a aglomeração também para se proteger. "Se eu fosse um conselheiro dele, eu falaria para evitar. Ele é o presidente do Brasil e é um senhor (Bolsonaro tem 64 anos, faixa etária de risco para complicações da covid-19). Ficou batendo na mão de todo mundo. E se tiver alguém lá com vírus incubado?", questiona o médico.

4 perguntas para... Nancy Bellei, professora de infectologia da Unifesp e consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia

Quais são os riscos de uma pessoa que deveria estar em isolamento ter esse contato com os manifestantes?

Não estou por dentro dos exames dele, mas se ele é um contato próximo de um caso confirmado, neste momento que estamos em um esforço máximo de contenção do vírus para evitar uma situação pior, acho que, em primeiro lugar, como autoridade do País, seria importante ele dar esse exemplo de se resguardar. O ideal seria ele se manter em quarentena. Tivemos reunião em Brasília, mais de 50 especialistas, e chegamos num consenso de que nesse momento a gente deveria endurecer a vigilância e que os contatos domiciliares de pessoas positivas e de viajantes internacionais deveriam fazer um isolamento voluntário. O segundo ponto é que eu acho que nós temos que ser os primeiros que dão exemplo para a população. Se a gente não dá exemplo, fica muito difícil explicar uma determinada situação.

Fica difícil para a população acreditar na seriedade da crise?

Sim, fica difícil para a população aderir, achar que é sério, achar que tem importância. E nesse momento, em vários Estados, nós estamos pedindo um preço altíssimo para crianças da rede pública que vão ficar sem aula. Os pais vão ter que se virar para trabalhar, há um impacto econômico, crianças se alimentam na escola, crianças têm vulnerabilidade social. Nesse contexto, todos nós temos que manter a coerência. Cabe a nós, pessoas públicas, profissionais da saúde, pessoas de agências, dar o exemplo de coerência.

Então mesmo que ele não estivesse classificado como caso suspeito, seria problemática essa atitude pelo mau exemplo?

É, as crianças vão ficar sem aula, os pais vão ter que se virar e alguns em manifestação? Quer dizer: uns pagam o preço e outros mantêm todas as atividades?

Quanto às pessoas que tiveram contato com ele, tem risco de transmissão caso ele esteja contaminado?

A gente ainda não sabe para o coronavírus o potencial de transmissibilidade de uma pessoa sem sintomas. Agora, tudo que a gente não sabe, a gente deve prevenir e não esperar a experiência demonstrar. Se essa transmissão for possível como é possível para influenza (gripe), eu não preciso nem tossir nem espirrar. Se eu estiver do lado de uma pessoa com influenza e falar, eu transmito para ela. Se isso for possível para coronavírus, ele pode transmitir. Então não é uma atitude de bom senso.

Estadão
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