Bolsonaro defende discurso sobre Ustra e 'nazismo de esquerda' no último dia em Israel
Em um encontro nesta terça-feira em Jerusalém com representantes da comunidade brasileira, presidente lembrou a polêmica causada pela menção ao coronel morto em 2015.
No último compromisso oficial de sua viagem a Israel, o presidente Jair Bolsonaro citou o discurso que proferiu na votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em abril de 2016, quando homenageou o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o primeiro militar reconhecido pela Justiça brasileira como torturador.
Em um encontro nesta terça-feira em Jerusalém com representantes da comunidade brasileira de uma cidade próxima a Tel Aviv, Bolsonaro mencionou o discurso do impeachment sem, no entanto, mencionar o nome de Ustra.
Ele lembrou a polêmica causada pela menção ao militar morto em 2015 e disse que, alguns dias depois do discurso, "um dono de um instituto de pesquisa (...) falou que, depois daquele voto meu, não pelo voto, mas pelo que eu falei, eu nunca mais me elegeria sequer vereador na capital do meu Estado, o Rio de Janeiro".
"E aconteceu exatamente o contrário", completou o presidente.
A menção ao discurso do impeachment foi feita logo depois de Bolsonaro se classificar como, "além de um patriota, um democrata, acima de tudo".
"No ano de 2016, tivemos um fato marcante em nosso país, uma presidente perdeu seu mandato. E ali, tiveram os deputados alguns segundos para dar um recado e para votar contra ou favorável o impeachment. Eu votei favorável. As palavras ali proferidas por mim tiveram impacto dentro e fora do Brasil por alguns dias, mas eram palavras que estavam sedimentadas, em João 8:32, a verdade tinha que ser conhecida", disse o presidente aos representantes da comunidade brasileira.
Discurso polêmico
O discurso de Bolsonaro na sessão que autorizou o impeachment de Dilma, em 17 de abril de 2016, causou polêmica e protestos de entidades de defesa dos direitos humanos. Na ocasião, Bolsonaro comparou o impeachment ao golpe militar de 1964.
"Perderam em 1964, perderam agora em 2016. Pela família e pela inocência das crianças em sala de aula, que o PT nunca teve. Contra o comunismo, pela nossa liberdade. Contra o Foro de São Paulo, pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o pavor de Dilma Rousseff", disse Bolsonaro na ocasião.
Durante o regime militar, entre 1970 e 1974, Ustra foi o chefe do DOI-Codi do Exército em São Paulo, órgão de repressão política do governo militar. Ali, sob o comando do coronel, ao menos 50 pessoas foram assassinadas ou desapareceram e outras 500 foram torturadas, segundo a Comissão Nacional da Verdade.
A menção de Bolsonaro ao discurso acontece dias depois de o governo ter se envolvido em polêmicas a respeito das comemorações dos 55 anos do golpe militar de 1964.
No último dia 25, o presidente havia determinado que o Ministério da Defesa comemorasse o golpe. As comemorações chegaram a ser proibidas pela Justiça após pedido da Defensoria Pública da União, mas a decisão acabou derrubada por uma desembargadora no sábado.
No domingo, o Planalto divulgou por um de seus canais de comunicação oficial - um número de WhatsApp para o envio de comunicados ao público - um vídeo defendendo o golpe de 1964. O mesmo vídeo foi divulgado nas redes sociais pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente.
Questionado algumas vezes sobre o vídeo durante a viagem a Israel, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, afirmou que o Planalto não comentaria sua divulgação.
Nazismo de esquerda ou direita?
Em Jerusalém, Bolsonaro também foi questionado por repórteres se considera o nazismo - regime responsável pelo genocídio de 6 milhões de judeus, além de homossexuais, deficientes, Testemunhas de Jeová, entre outros - como um movimento de esquerda ou de direita.
"Não há dúvidas (de que foi um movimento de esquerda), Partido Nacional Socialista da Alemanha", disse o presidente, aludindo ao nome oficial do partido liderado por Adolf Hitler.
Pouco antes, reportagem da BBC News Brasil havia revelado que o Yad Vashem, museu do Holocausto em Jerusalém visitado pelo presidente nesta terça, localiza o nazismo como parte do surgimento de diversos grupos de direita radical na Alemanha do entreguerras.
A classificação do Partido Nazista como parte da direita vai de encontro com opiniões expressadas pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
Em um post recente em seu blog, Metapolítica 17, Araújo escreveu que "a esquerda fica apavorada cada vez que ressurge o debate sobre a possibilidade de classificar o nazismo como movimento de esquerda", explicando que, em um sua opinião, o nazismo foi um movimento esquerdista.
O presidente decidiu antecipar em duas horas o retorno ao Brasil, marcado para a manhã desta quarta-feira.
Segundo o porta-voz Rêgo Barros, a antecipação se deu por motivos logísticos e porque Bolsonaro irá se encontrar na quinta-feira com parlamentares para discutir a reforma da Previdência.
Muro e nazismo
O chanceler Ernesto Araújo também foi questionado por repórteres sobre como reagia ao fato de o museu visitado por Bolsonaro considerar o nazismo como um movimento de direita.
Perguntado se concordava com a definição dada pelo museu, ele disse que "essas definições de esquerda e direita, tem que ser visto o que se entende por elas. Nesses últimos dias têm surgido várias publicações, artigos que procuram identificar um pouco isso, estudar um pouco isso sob a perspectiva que eu procurei apontar de ver semelhanças e proximidades entre esses movimentos nazistas da Europa de metade do século 20 e movimentos de extrema esquerda", disse o ministro.
"Eu lancei foi esse debate (...), acho que é importante que as pessoas discutam o que é o conteúdo de diferentes movimentos totalitários e ver o que eles têm em comum", disse Araújo, que afirmou que a associação do nazismo com a direita foi usada para "denegrir movimentos que são considerados de direita que não têm nada a ver com o nazismo".
Questionado se a presença do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu na visita de Bolsonaro ao Muro das Lamentações poderia significar o reconhecimento da demanda de Israel sobre a soberania de Jerusalém, Araújo negou e disse que o ato "foi um momento puramente religioso".
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