Centro de São Paulo vê cenas de violência em ato contra a Copa
Bombas de gás lacrimogênio, lixo queimado nas ruas, uma agência bancária depredada, muita correria e pessoas feridas. Esse foi o saldo do protesto que ativistas pretendiam que fosse o mais volumoso e organizado ato contra a Copa do Mundo deste ano em São Paulo.
Após se concentrar na avenida Paulista, os cerca de 1.500 manifestantes começavam a descer a rua da Consolação, no centro de São Paulo, quando os primeiros sinais de tensão começaram a surgir.
Até então, o ato seguia pacífico e até com tons de bom humor. Naquele momento, cada vez mais pessoas começavam a se juntar ao grupo, que começava a dar a impressão de que adquiriria um tamanho considerável.
Mas repentinamente grupos de mascarados surgiram do meio da multidão, correndo em direção ao início do cortejo.
Minutos depois, em frente a uma grande porta metálica de uma loja, manifestantes e policiais que cercavam a marcha começaram a se desentender. As razões não eram claras.
Supostas testemunhas acusaram a polícia de iniciar a violência, outras disseram que manifestantes radicais teriam tentado evitar que a PM adotasse sua nova formação tática - que em caso de tumulto tenta confinar os manifestantes em uma pequena área - e atirado pedras.
Em seguida, o mesmo grupo de policiais começou a disparar bombas de gás lacrimogêneo e o corre-corre começou. Algumas dezenas de metros adiante, manifestantes radicais queimaram lixo no meio da rua, para dificultar a aproximação da polícia, e também atiraram pedras.
Um ônibus foi cercado por manifestantes e os passageiros foram obrigados a descer.
Surgindo do meio da confusão, um pequeno grupo de profissionais de imprensa carregava, com ajuda de manifestantes, um colega ferido.
Colocado no chão metros à frente, ao abrigo das bombas e pedradas, o fotógrafo ferido falava: "É a minha perna esquerda, explodiu uma bomba nela". As roupas cortadas às pressas revelaram um grande hematoma, sem sangramento. "Não sinto a perna, não sinto a perna", dizia.
Os ferimentos não colocavam a vida dele em risco. Mas, quando sua perna começava a ser imobilizada, ouviu-se gritos: "Saiam daí porque vão incendiar o ônibus".
Houve novo corre-corre, mas o incêndio não se concretizou. A polícia continuou avançando em linha, chegando ao local e permitindo que colegas de imprensa e manifestantes levassem o homem ferido a uma área onde poderia receber atendimento profissional.
O confronto continuou por mais alguns minutos. Uma loja de automóveis e um banco sofreram depredações.
A tática da polícia, vitoriosa em manifestações violentas anteriores, parece não ter funcionado desta vez. Ao invés de serem contidos em uma área limitada, os manifestantes se espalharam por uma série de ruas próximas. Pequenos grupos radicais deixaram um rastro de lixo queimado por onde passaram.
Pouco mais de uma hora após o início da marcha, às 19h, o movimento estava completamente dispersado. Ao menos oito pessoas foram detidas.
Além da loja e do banco, foram destruídos uma cabine da Polícia Militar e um vidro de um dos carros da corporação foram quebrados.
Planejamento
A manifestação da quinta-feira foi a primeira do ano organizada pelos grupos Comitê Popular da Copa em São Paulo e Movimento Passe Livre - dois dos grupos envolvidos na organização de protestos que levaram dezenas de milhares de pessoas às ruas no ano passado.
O dia de protestos foi batizado de "15M" e começou logo cedo. Por volta de 6h30, movimentos de sem-teto e sindicalistas, em suposta coordenação com os organizadores do protesto da tarde, bloquearam a rodovia Anhanguera, na zona oeste, a Ponte do Socorro, na zona sul e a avenida Radial Leste, em frente ao estádio do Itaquerão, na zona leste - além de ao menos outros três pontos pela cidade.
Os bloqueios fizeram o trânsito já difícil da cidade se tornar caótico, mas não houve episódios de violência.
À tarde, quando começou a concentração do ato principal na Avenida Paulista ficava evidente o trabalho de produção e o capricho dos manifestantes.
Um projetor de imagens desenhava com luz dados sobre os gastos da Copa do Mundo sobre a fachada de um prédio alto. Os manifestantes também fizeram uma partida de futebol - com um time rico e um time pobre - e um esqueleto de três metros de altura que usava o uniforme da seleção brasileira.
Naomi Santos e a amiga Larissa fizeram uma Taça Fifa de papelão, que erguiam no topo de uma haste feita de canos de PVC.
"Vim participar do movimento porque acho todas as reivindicações importantes para a gente conquistar os nossos direitos, que não são dados, são conquistados", disse Larissa. "Tenho 19 anos e vim defender os direitos dos jovens, como ter universidade. Também quero uma distribuição mais justa dos recursos para saúde e moradia."
Vanessa Santos, uma das envolvidas com a organização, disse à BBC Brasil que uma das críticas fundamentais do grupo é a forma como o Estado se organizaria sem consultar o povo, "seguindo a cartilha das grandes corporações".
Vanessa disse que o grupo quer organizar mais atos e espera que eles atinjam a proporção das manifestações do ano passado durante a Copa das Confederações.
"Em junho do ano passado a gente não recebeu os jogos da Copa das Confederações porque o Itaquerão não ficou pronto. Mas para a Copa do Mundo o Itaquerão vai ficar pronto - até que está morrendo trabalhador para isso acontecer".
"Se em junho, quando não estava pronto, a gente já teve aquelas grandes mobilizações, a gente acredita que esse ano com certeza o nosso junho vai se repetir como foi no ano passado - com a população tomando as ruas e reivindicando os seus direitos."
Mas pelo menos nesse primeiro ato da coalizão de grupos, as coisas parecem não ter ocorrido como o planejado. Isso porque a maioria deles afirma um dos objetivos é que os atos não acabem em violência.