Amigos e parentes se despedem de médico morto a facadas
Sensação de impotência entre pessoas próximas reflete o sentimento da população com relação à disparada da violência
O sentimento de perplexidade e consternação marcou o enterro do médico Jaime Gold, de 56 anos, morto a facadas em um assalto na terça-feira na Lagoa, Zona Sul do Rio. Emocionados, amigos e curiosos se dividiam entre a sensação de impotência pela perda de controle da violência e a revolta pela impunidade. Numa espécie de protesto solitário, o aposentado Mário Luiz Vides, de 60 anos, foi até o cemitério Israelita do Caju, na Zona Portuária, em sua bicicleta, vindo de São Gonçalo, cidade da Região Metropolitana. Ele acompanhou a cerimônia do lado de fora e representava informalmente os ciclistas, que têm se sentido cada vez mais vulneráveis à violência.
O ciclista parecia não acreditar em mais uma morte violenta na cidade: “Eu quis vir aqui para homenageá-lo. Não consigo nem expressar meu sentimento”. Mesmo admitindo que andar de bicicleta virou ‘esporte de risco’ na cidade, e já com a informação de que um menor de 16 anos havia sido preso pela manhã como suspeito do crime, ele criticou a redução da maioridade penal: “Isso não resolve. Cada um tem que fazer a sua parte: a Justiça, a Polícia, a Prefeitura... Precisamos de cadeias e instituições decentes para (abrigar os) menores.”
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Amigo de Jaime há 4 anos, o advogado Fernando Freire seguiu na mesma linha e cobrou ação: “Uma pessoa foi brutalmente assassinada. Uma pena que nossas autoridades não levem tão a sério, porque realmente estamos entregues”. Ao ser informado da prisão do suspeito de 16 anos, Freire disse que a penalização não resolve: Não é por aí (apenas a prisão), a coisa é mais forte, vem da base. É preciso educação, oportunidade e zelo pelas famílias que não têm condição social de evoluir. É o Estado que tem que tomar conta disso”.
Mas o sentimento de revolta e a cobrança por endurecimento da lei ficou nítido entre alguns presentes. O aposentado Hertz Haideram, de 83 anos, amigo do pai de Jaime Gold, diz ter acompanhado o crescimento do médico e, indignado, questionou aos jornalistas: “Por que isso continua acontecendo? É o quarto caso na Lagoa. Se ele (o autor das facadas fatais) for ‘de menor’, vamos pagar uma pensão a ele”, ironizou.
Amigo do médico há 35 anos, o advogado Gabriel Monteiro não escondia sua revolta e, num discurso radical, chegou a falar em ‘vingança’. “Essas pessoas que o mataram provavelmente muitos foram beneficiados pela generosidade dele. Na UFRJ o Jaiminho comprava remédio do próprio bolso, atendia de graça. O sentimento que tenho agora, mais do que revolta, é de vingança. Precisamos parar com esse falso sentimento de que esses assaltantes são vítimas”.
Muito abalada, a família do médico não quis falar com a imprensa. A ex-mulher Márcia Amil, e os filhos do casal, Clara e Daniel, chegaram por volta das 8h30 ao cemitério. Clara deixou o local, por volta dos meio dia, cercada por três amigas. Os pais de Jaime Gold também não deram declarações. Cerca de 150 pessoas estiveram presentes ao cemitério israelita e acompanharam o ritual judaico de velório e sepultamento do médico na parte da manhã.