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Britânico cria tour por melhores grafites de São Paulo

Estudante da Universidade de Oxford fotografou diversos grafites espalhados pela capital paulista

10 jun 2015 - 10h17
(atualizado às 11h49)
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Por Charles Humphreys

Estudante da Universidade de Oxford

Como Caetano Veloso diz na música Sampa, "da dura poesia concreta de tuas esquinas", a beleza de São Paulo não é tão óbvia quanto a de outras cidades.

Com as palavras de Caetano na cabeça, resolvi ir atrás dos grafites de São Paulo e acabei preparando o roteiro abaixo. Ao meu ver, ele revela a essência da vida paulistana e a surpreendente beleza estampada em locais inusitados: de esgotos até os mais altos andares de prédios.

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A viagem pelos grafites é também uma forma de se conhecer a cidade por meio da crítica social exposta na arte urbana.

Fotografei meus preferidos e será fantástico receber dicas dos leitores do 'Para Inglês Ver' com registro de arte urbana imperdível em São Paulo e em todo o Brasil.

Vila Madalena & Pinheiros

Em meio à boemia da Vila Madalena, muros e lojas ganham o colorido do grafite. Quem passa pelas ruas Gonçalo Afonso e Medeiros de Albuquerque fica impressionado com a galeria a céu aberto de grafites pintados com tinta spray, feitos principalmente por artistas brasileiros, conhecida como Beco do Batman.

A história do Beco começou na década de oitenta, quando surgiu na parede da rua Harmonia um desenho do homem-morcego dos quadrinhos. A novidade fez com que estudantes de artes plásticas começassem a criar desenhos de influência cubista e psicodélica nas paredes do Beco.

De lá para cá, cada centímetro de muro do Beco foi sendo coberto por intervenções de tinta aerossol brilhantes e estilizadas feitas por grafiteiros reconhecidos internacionalmente como Speto (acima, segundo à direita).

Embora seja uma galeria informal, o espaço é disputado constantemente por artistas que buscam expor seus trabalhos, e por isso foram criadas algumas regras essenciais para garantia da ordem: quem pintou no muro permanece "proprietário" da parte específica que usou. Um grafiteiro deve obter a autorização do "dono" para usar o espaço já coberto.

Hoje em dia, a viela está em constante mudança. Em cada nova visita é possível observar a evolução do Beco ao longo do tempo.

Quem passa pelas proximidades se depara com inúmeras obras de artistas brasileiros de peso, incluindo uma de Paulo Ito que fica na rua Mario de Alencar, e uma de Mundão que fica num estacionamento na rua Harmonia:

Acho este desenho estimulante pela mensagem social que parece passar. Embora o estilo de Paulo Ito não seja realista, este grafite aborda uma realidade social e parece refletir a tendência do ser humano de tentar evoluir permanentemente e se adaptar às novas condições de vida.

É possível que Ito queira dizer que, por mais que tentemos nos reinventar, lá, no lugar mais profundo de nosso ser, seremos eternamente os mesmos.

Este grafite ressalta a atual escassez de água que vem prejudicando a qualidade de vida de milhares de paulistanos. O trabalho de Mundão parece fazer uma crítica ao governo pela falta de organização na utilização da água das represas, e também uma crítica à ação da Polícia Militar (a moça no meio segura um cartaz no qual se lê 'A PM mata mais do que os conflitos na faixa de Gaza').

Na rua Luiz Gama, perto da rua Harmonia, me deparei com um grafite que me chamou a atenção.

Esta intervenção foi realizada por um grafiteiro inglês chamado Fin DAC. Fiquei impressionado pelo realismo que o artista consegue através do aperfeiçoamento de um estilo e técnica atípicos e pouco convencionais que reúnem o uso de estêncil e de tinta.

Outra obra do Fin DAC pode ser vista perto da rua Madalena e me assombrou por razões idênticas.

Quem passa pela rua Paulo Gontijo de Carvalho descobre os desenhos de Crânio, um grafiteiro brasileiro renomado. As suas obras podem ser vistas no Beco do Lira, um beco mais estreito do que o Beco do Batman.

Este grafite acima me fez refletir sobre a situação cada vez mais precária dos índios no Brasil. Crânio se opõe com veemência ao tratamento atualmente dado aos índios pelo governo brasileiro e ao que ele entende ser a exploração desse povo.

Essa crítica é ampliada no grafite seguinte no qual o artista parece fazer alusão aos projetos e empreendimentos governamentais na Amazônia que ameaçam a subsistência do povo indígena.

Eduardo Kobra

As intervenções de Eduardo Kobra se espalham por toda a cidade. Foram as obras dele que mais me impressionaram dentre todos os artistas, pelo seu realismo e sua expressão de movimentos.

A arte de Kobra se dedica a pedir proteção aos animais e a defender seus direitos, como esta a seguir que fica na rua Belmiro Braga, mais conhecida como Beco do Aprendiz.

Este outro está na avenida Brigadeiro Faria Lima, bem perto do Instituto Tomie Ohtake.

Achei estes grafites muito poderosos. Na obra abaixo Kobra aproveita a perturbação e desconforto que causa ao observador e tenta convencê-lo que a tourada "não é cultura, mas sim tortura".

Incluí estas obras porque acho o estilo delas bem diferente do modelo de ilustração que Kobra utiliza na maioria de suas intervenções. Os grafites retratam cenários bem vivos.

Em Pinheiros, a gente se depara com um painel gigante de Kobra que enfeita as paredes laterais da loja da Fnac na rua Pedroso de Moraes. Ali, o artista paulistano usa sua marca registrada em um grafite tão realista que até parece uma fotografia.

Kobra homenageia Chico Buarque e Ariano Suassuna neste painel de onze metros por dezessete metros no qual usou aproximadamente trezentas latinhas de spray!

Ainda em Pinheiros, Kobra exibe seu realismo no mural Club 27, na rua Sumidouro. Com um realismo impressionante ele homenageia seis artistas falecidos aos 27 anos, membros portanto do clube dos 27 – podem ser vistos, de cima para baixo as duplas: Janis Joplin e Amy Winehouse, Jimi Hendrix e Jean-Michel Basquiat e Jim Morrison e Kurt Cobain:

Mas, o grafite mais imperdível de Kobra é incontestavelmente a sua homenagem gigantesca a Oscar Niemeyer.

Quem passa pela Avenida Paulista direção sul se depara com uma ilustração do arquiteto, de 52 metros de altura e 16 metros de largura. Kobra e outros quatro artistas da sua equipe passaram um ano colorindo o edifício Ragi, na Praça Oswaldo Cruz, 124, em frente ao shopping Pátio Paulista.

Kobra a presenteou a São Paulo pelo aniversário da cidade, e também como forma de marcar a data de um ano do falecimento de Niemeyer.

De toda obra de Kobra, acredito que este painel seja o melhor exemplo de seu incrível estilo realista.

Outra obra nesse estilo característico de Kobra fica na Avenida Rebouças, não muito distante da anterior. Neste desenho, Kobra usa sua "marca" para chamar atenção para questões sociais subjacentes que se relacionam aos desabrigados e à pobreza extrema.

Quem passa pelo bairro de Vila Nova Conceição descobre mais duas obras do artista. Na primeira, Kobra imortaliza o craque Paulo Roberto Falcão, numa escala impressionante.

Kobra grafitou a comemoração emocionada de Falcão ao marcar o segundo gol do Brasil contra a Itália no Mundial de 1982, na partida em que a seleção brasileira foi eliminada pelos italianos que venceram por 3 a 2, frustrando o favoritismo do Brasil ao título de campeão.

Kobra também desenvolveu o projeto "Muro de Memórias", no qual ele imortaliza cenas realistas de uma São Paulo antiga, resgatando memórias da metrópole, sua cidade natal.

Estas obras mergulham no passado, revelando cenas e personagens das primeiras décadas do século 20.

Quem passa pela esquina da rua Cardeal Arcoverde com rua Henrique Schaumann encontra dois murais justapostos.

O primeiro chamou minha atenção por ser uma versão do "Monumento às Bandeiras" que existe no parque Ibirapuera. No segundo, gostei do uso das cores-padrão do artista, mesmo sendo uma ilustração que tenta matar as saudades de uma São Paulo antiga.

Quem passa pela avenida Helio Pellegrino pode ver outra obra desse mesmo projeto. Achei o grafite abaixo interessante pela escolha do preto e branco para retratar os habitantes de São Paulo no começo do século 20. Mais uma vez Kobra grafitou com um realismo deslumbrante.

Avenida 23 de Maio

Por último, mas não menos importante, incluo as criações que podem ser vistas ao longo do viaduto Jaceguai e na saída para a avenida 23 de Maio.

Primeiro, nos arcos da pequena rua que liga o viaduto com a avenida 23 de Maio.

Para mim, o grafite mais importante é uma obra de Mauro Neri da Silva, mais conhecido como Moura. Este é apenas um dos inúmeros murais de Mauro que se espalham por toda a cidade.

A legenda "ver a cidade" passa aos habitantes uma mensagem sociourbana cifrada em um jogo de palavras: Ver a cidade ou Veracidade.

Mauro aplica esse duplo sentido em todas as suas criações.

Quem circula pela cidade encontra esses escritos em muros, escadarias e bancos de praças.

As obras chamam a atenção para problemas da cidade que precisam ser percebidos e solucionados, como a pobreza extrema e a questão dos desabrigados, entre outros.

Ao se chegar à saída para a avenida 23 de Maio, se vê a enorme intervenção feita por Nina Pandolfo, Nunca e Osgemeos.

O que diferencia este grafite dos outros é justamente o tamanho e a localização. Embora nenhum dos elementos do mural, feito em conjunto pelos três artistas, carregue uma mensagem específica, o trabalho deve ser apreciado por sua beleza absoluta. Como é o caso de praticamente todas as obras de Nunca e Osgemeos.

Grafite "fotografado" do espaço vira GIF:
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