Empresário deu entrevista meses antes de ser executado sobre ‘pessoas que orquestraram plano’ para matá-lo
Antônio Vinícius Lopes Gritzbach teria delatado o PCC ao Ministério Público; ele foi morto a tiros no Aeroporto de Guarulhos (SP)
O empresário que foi executado a tiros no Terminal 2 do Aeroporto de Guarulhos (SP), nesta sexta-feira, 8, deu uma entrevista seis meses do crime contando que foi alvo de "pessoas que orquestraram um plano" para matá-lo. Antônio Vinícius Lopes Gritzbach, de 38 anos, foi delator do Ministério Público e teria entregado membros do Primeiro Comando da Capital (PCC) em uma delação.
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O corretor de imóveis estaria jurado de morte pela organização criminosa, e foi vítima de um sequestro que teria sido sequestrado pelo grupo no passado. O motivo seria a acusação de desvio de R$ 100 milhões da facção e de ter ordenado matar o traficante Anselmo Becheli Santa Fausta, conhecido como Cara Preta, e de seu motorista, Antônio Corona Neto, o Sem Sangue.
Cara Preta teria entregado os valores a Gritzbach para que fossem investidos em criptomoedas, mas com a morte do criminoso em 2021, o PCC chamou o empresário para "conversar" na casa de outro integrante do grupo. Ao programa Domingo Espetacular, da TV Record, ele afirmou que não conhecia Anselmo pelo apelido, e que sua relação era de cliente.
“A minha atribuição era intermediar a compra e venda de imóveis. [Ele me procurou e disse] que queria investir. Fez uma compra de R$ 12 milhões. Ele era uma pessoa que tinha família, que frequentou o escritório algumas vezes. Não tinha inimizade, descontentamento [entre os dois].”
Ao ser questionado como recebeu a morte de Anselmo, Gritzbach afirmou que não foi “fácil”, e que em “momento nenhum” achou que seria acusado do crime. “Não mandei matar ninguém. Eu não tive participação nenhuma. Em nenhum momento o Anselmo me incomodou. [Estou sendo acusado injustamente] porque talvez teria um plano deles que deu errado e eu não morri. Pessoas que orquestraram um plano de me matar”, declarou.
Ele teria ficado sob a mira dos criminosos por 9 horas, durante um “tribunal do crime”, segundo seu depoimento à Polícia, mas foi liberado com a promessa de reaver o montante. No entanto, foi preso e decidiu contar o que sabia sobre a facção. Sua defesa ofereceu em setembro de 2023 uma delação premiada ao MPSP, homologada em abril deste ano pela Justiça.
O corretor de imóveis acusou dirigentes ligados a empresas que agenciam jogadores de futebol de terem lavado dinheiro do PCC. Um dos envolvidos com uma dessas empresas estaria presente no sequestro, no qual o delator foi torturado, e seria o mais violento dos sequestradores.
Em depoimento, Gritzbach afirmou que esse homem o mandou ligar para familiares e se despedir, além de ameaçar esquartejar a vítima.
Execução
O caso ocorreu na entrada do Terminal 2 por volta das 16h10 da tarde. Imagens de câmeras de segurança do aeroporto mostram o momento em que atiradores saem de um veículo estacionado e executam o empresário. Gritzbach levava uma mala de rodinhas quando é foi surpreendido pelos criminosos.
Ele tenta fugir, é atingido pelos disparos e cai perto da faixa de pedestres. É possível ver outras pessoas correndo por causa do tiroteio. Após o crime, os atiradores fogem. Além dele, outras três pessoas ficaram feridas.
Uma dupla da Guarda Civil Municipal (GCM) de Guarulhos estava em ronda próximo à entrada onde houve o tiroteio até por volta das 13h, quando identificaram um suspeito de ter adulterado a placa de um carro.
Depois disso, eles o conduziram para a delegacia do aeroporto. Como a ocorrência demorou três horas para ser registrada, segundo eles, os agentes não faziam ronda na hora da execução.
Celulares recolhidos
De acordo com o colunista do UOL, Josmar Josino, quatro PMs foram contratados para fazer a escolta do empresário, que desembarcava no terminal 2 do aeroporto, onde sofreu uma emboscada. Eles buscariam Gritzbach após a viagem para o Nordeste com a namorada e um motorista.
Agentes da 3ª Delegacia de Atendimento ao Turista (Deatur) do aeroporto de Guarulhos apuraram que os policiais usavam um veículo GM Trailblazer e um Volkswagen Amarok para fazer a escolta, no entanto, esse segundo carro teve um problema mecânico e não conseguiu chegar à área de desembarque. A Amarok foi deixada em um posto de combustível.
Com o Trailblaze, um policial chegou ao terminal 2, junto com o filho de Gritzbach, de 11 anos, e um estudante amigo do empresário, de 23. Eles também tiveram seus celulares apreendidos pela Polícia.
A namorada do empresário deixou o local com um policial militar que fazia parte da escolta do empresário e não foi ouvida. Já os policiais foram encaminhados para a 3ª Deatur, onde prestaram depoimento, deixaram os celulares e foram liberados. A Corregedoria da PM também deve investigar a conduta do grupo.
Segundo a TV Globo, um investigador disse que, como o delator do PCC seria visado por ter delatado a organização criminosa, o mais lógico seria que todos os agentes que cuidavam da segurança do empresário deixassem o carro quebrado para trás e seguissem para o aeroporto. No entanto, ao que parece, dos quatros, três ficaram cuidando do veículo com defeito.
O celular de Gritzbach também foi recolhido no local do crime e passará por perícia. O aparelho pode ajudar nas apurações a partir de trocas de mensagens que deverão ser extraídas. A Polícia também acredita que a vítima já tinha sendo monitorada desde sua saída de Goiás, já que os assassinos sabiam o horário que ele desembarcaria.
As autoridades suspeitam que os criminosos foram avisados do momento em que o empresário desembarcaria para que o ataque ocorresse no momento em que ele saísse do saguão do aeroporto.
O Terra solicitou à Secretaria de Segurança Pública e à Corregedoria das Polícias um posicionamento sobre o caso, mas não obteve retorno até o momento. O espaço permanece aberto para manifestações.
Quem era Gritzbach
Gritzbach era relator do Ministério Público, e teria entregado membros do PCC em uma delação. Aos investigadores, pessoas próximas da vítima disseram que ele temia pela própria vida, e que sabia que membros do PCC tinham conhecimento de sua colaboração com o Ministério Público.
Na delação, ele falou sobre o envolvimento com a organização criminosa, a maior do país, com o futebol e o mercado imobiliário. Ele também deu informações sobre os assassinatos de líderes da facção, como Cara Preta e Django, mencionando a corrupção policial e suspeita de pagamento de propina na investigação da morte de Cara Preta.
Conforme o portal Metrópoles, em dezembro de 2023, Vinícius havia sido alvo de um suposto atentado na sacada do apartamento em que morava na zona leste da capital paulista.
O empresário ficou preso até 7 de junho de 2023, quando ganhou liberdade condicional e passou a usar tornozeleira eletrônica.
Em junho deste ano, a polícia foi mobilizada para atender a um suposto sequestro do empresário. O DHPP foi acionado após a esposa de Vinícius e os dois seguranças dele ligarem para o advogado de defesa, informando que houve uma movimentação suspeita, de um carro para outro.
Ao dar seu depoimento, Gritzbach demonstrou nervosismo. O teor do depoimento não foi revelado, e o caso segue sendo investigado.
Gritzbach atuou na Porte Engenharia e Urbanismo como corretor de imóveis entre 2014 e 2018, segundo a empresa. Ele afirmou ter conhecido membros da facção criminosa devido ao trabalho, por meio de um corretor de imóveis.
A Porte é investigada pelo Ministério Público Estadual (MPE), por suspeita de ter vendido mais de uma dezena de imóveis para traficantes de drogas, segundo a delação. Gritzbach também afirmou que executivos da construtora sabiam do pagamento de imóveis em dinheiro em espécie e também de registros de bens cujo nome do verdadeiro proprietário ficava oculto, segundo o Estadão. À reportagem, a Porte diz que "não é investigada pelo Ministério Público".
"A Porte jamais tolerou qualquer atividade ilícita de qualquer colaborador e se dispôs a oferecer auxílio documental às autoridades competentes sobre as ações do ex-corretor no período em que atuou na empresa", informou por meio de nota.