MG: empresário projeta prostíbulo e sauna mista em shopping
O empresário Elias Tergilene, dono de uma rede de centros de compras em Belo Horizonte e em pelo outras quatro cidades do norte e nordeste do País, avisa que vai inaugurar "em no máximo quatro meses" o prostíbulo que vai funcionar no 4º andar do UAI Shopping. O empreendimento é localizado ao lado da rodoviária da capital mineira e a poucos metros da Rua Guaicurus, região boêmia que tem dezenas de hotéis e pensões que funcionam como casas de prostituição desde a primeira metade do século XX e que ficou conhecida por ser o local onde trabalhou como prostituta a socialite mineira Hilda Furacão, nos anos 1950.
A história de Hilda, que foi casada com Paulo Valentim, ex-jogador de Atlético-MG, Botafogo e Boca Júniors, foi contada em um livro pelo escritor Roberto Drummond (1939-2002) e reproduzida por uma minissérie da Rede Globo. Ela morreu na Argentina, em 2014.
O projeto do UAI Shopping prevê a construção de 55 quartos que serão alugados para as prostitutas que quiserem trabalhar no local. "Nós queremos ter um quarto confortável que sirva como residência dessa menina, porque muitas delas trabalham no quarto o dia inteiro, não trocam nem o lençol e dormem naquele lugar. Então tem que ter água quente, um bom sanitário, armário para guardar roupas e um colchão que ela durma e descanse", explica. O espaço vai ocupar a área onde existia uma academia e terá ainda um bar e uma sauna mista, para a utilização de pessoas com qualquer orientação sexual.
O processo de seleção das mulheres que desejarem trabalhar nos quartos do centro de compras será realizado pela Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), uma das entidades parceiras da Fundação Doimo, também presidida por Tergilene, e que de acordo com a descrição no site da fundação, é uma entidade sem fins lucrativos, de assistência social que apoia a organização e desenvolvimento econômico e social.
"Pautada no assessoramento de identidades estigmatizadas em termos étnicos, cultural, sexual; e grupos e indivíduos com inserção precária ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal. Para isso, seus projetos sociais são prioritariamente realizados em áreas cultural e socialmente degradadas (zona de conflito, favelas, tráfico de drogas e prostituição),” diz o texto.
O empresário enfatiza a vocação social da Fundação Doimo e garante que as prostitutas que trabalharem no local pagarão valores mais em conta no aluguel dos quartos e terão segurança, assistência médica, psicológica e ainda a opção de reocupação profissional. "Hoje elas pagam R$ 180 (pelo aluguel de um quarto nos hotéis da Rua Guaicurus) por período (12 horas). A Aprosmig falou que tem que ser em torno de R$ 70, porque ela faz um programa de R$ 50 e quase já pagou o quarto. Vamos fazer um preço que ela trabalhe, tenha roupas de cama, almoce e conto com a secretaria de saúde aqui, que até agora não se manifestou, que venha pra cá. Vou ceder um espaço para a secretaria de saúde, sem aluguel, para que ela esteja aqui dentro, junto com a gente", convoca.
"Queremos fazer exames de Aids e sífilis, em todas elas. Queremos saber porque essa menina entrou na prostituição. Ela ganha R$ 20, 30 mil com a prostituição, então qual atividade econômica vou dar a essa menina para que ela saia? Porque, se eu der uma função de secretária ganhando um salário mínimo e meio, ela não vai sair da prostituição", prevê Tergilene, que ainda revela como é a rotina de algumas das mulheres que trabalham como prostitutas durante o dia nos hotéis da Guaicurus e à noite em boates e casas de luxo de outras regiões da capital mineira: “Muitas destas meninas vêm pra cá durante o dia e fazem programa a R$ 50, cada. À noite vão para uma boate dessa para fazer programa a R$ 500. Elas trabalham direto, quase full time. Então elas começam a cheirar cocaína e tomar muito energético, para conseguirem ficar acordadas. Então precisamos fazer um combate às drogas. Porque muitas, para se prostituírem, estão se drogando", afirma.
Tergilene afirma que o UAI Shopping vai terceirizar a administração para um "empresário que já tem know how na administração de prostíbulos em Belo Horizonte. É uma pessoa que já tem três prostíbulos aqui e que funcionam em imóveis locados. O dono do imóvel não opera a prostituição. Ele aluga o imóvel para alguém operar", continua. Ele diz ainda que vai solicitar à Prefeitura de Belo Horizonte autorização para a mesma atividade comercial em que estão inscritos os estabelecimentos da Rua Guaicurus, conhecidos popularmente como os Sobe e Desce.
"Fizemos uma consulta no site da prefeitura e todos estes prostíbulos operam com alvarás de hotel e pensão. Se eu simplesmente for no site e pedir um alvará de (para funcionar como) pensão, eu consigo o alvará porque a atividade está regulamentada no Código de Posturas do município. E qualquer um consegue um alvará aqui na região de pensão. Não consegue de motel, mas ninguém está registrado como motel. Está registrado como pensão e como hotel", enfatiza. Para restringir o acesso de crianças e adolescentes menores de 18 anos e ainda garantir a segurança de clientes e prostitutas, o 4º andar do shopping terá entrada isolada e independente, portas com detectores de metais, câmeras de segurança e vigilantes contratados.
A Secretaria Municipal de Serviços Urbanos da Prefeitura de Belo Horizonte (SMSU) confirmou que, para o empresário obter o alvará de localização e funcionamento de atividade econômica, ele deve realizar uma consulta prévia no site da PBH e inserir o índice cadastral da área para verificar se a atividade pretendida é permitida no espaço e sob quais condições.
A SMSU disse ainda que a prefeitura faz ações fiscais planejadas previamente e também quando recebe denúncias ou reclamações. No ato da fiscalização, a equipe verifica se o estabelecimento possui Alvará de Localização e Funcionamento vigente e se a atividade desenvolvida é a permitida no documento.
A secretaria esclarece que, de acordo com o artigo 1º da lei 7.936, de 12/1/2000, novos motéis só podem ser abertos às margens de estradas e rodovias, e que em Belo Horizonte há 19 hotéis e motéis licenciados na rua Guaicurus e região, mas todos obtiveram a liberação antes da lei citada entrar em vigor.
O advogado criminalista José de Assis Santiago Neto, membro do Instituto de Ciências Penais de Belo Horizonte e do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, explica que segundo o Código Penal Brasileiro, prostituição não é crime no país. "Crime é a exploração de qualquer pessoa que seja, ainda que maior de idade", afirma. "Nesse caso específico (do UAI Shopping) existe a possibilidade da incursão no artigo 229 do Código Penal, que diz ser crime "manter por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente, com pena que varia entre 2 e 5 anos de reclusão".
Para Santiago, "a grande discussão que essa questão traz é em relação a descriminalização ou legalização da atividade, ou seja, permitir que casas de prostituição existam, devidamente fiscalizadas, tributadas, até para facilitar que as pessoas que trabalham com essa atividade tenham acesso a direitos que qualquer pessoa tem, como saúde e segurança. A lei diz que ter um hotel não é crime. Então o proprietário diz, se eu te alugo um quarto, não é crime, o que você faz dele não tenho nada a ver", raciocina. "Precisamos tirar essa atividade da ilegalidade, das sombras, já que não conseguimos controlar, principalmente por causa da exploração", completa.
A reportagem ouviu alguns comerciantes que têm lojas no shopping. Um deles, que preferiu não se identificar, diz que está preocupado quanto à presença das garotas de programas, e que o movimento de frequentadores pode provocar a fuga de clientes. "A ideia assusta, a região já não é muito agradável, se acontecer pode prejudicar a gente," disse. Já os lojistas Miro Júnior e João Cassiano Fróes discordam e até veem vantagem na iniciativa. "Elas (as prostitutas) são pessoas que merecem o nosso respeito e são pessoas dignas, trabalhadoras", avalia Júnior. "A Guaicurus é toda assim, loja embaixo, prostíbulos em cima. As lojas daqui estarão de portas abertas para elas", completa Cassiano.
Se diz que não está preocupado com as partes legal, burocrática e econômica do futuro empreendimento, Elias Tergilene revela que a repercussão do assunto também não tira o sono dele e da família. "Se tiver que pagar o preço de as pessoas não virem aqui comprar, eu vou pagar esse preço. Se a sociedade for tão hipócrita a esse ponto, vai ser mais um dado da nossa pesquisa, olha, temos um país hipócrita. O cara vai lá no prostíbulo, usa a menina, paga e depois vem dar lição de moral", analisa.
E continua: "os evangélicos que estão entrando nas redes sociais e estão fazendo comentários, eu quero dizer pra eles que em um determinado momento da vida eu também fui evangélico. Eu não quero comentários e críticas, eu quero que eles venham aqui me ajudar no projeto. Porque se eles têm um projeto a partir da Bíblia, que eles tragam a Bíblia pra cá e vamos trabalhar juntos. Crítica e hipocrisia eu sei que vão acontecer, agora, estou precisando é de ajuda. E quem vai vir ajudar? Na hora de patrocinar o Miss Prostituta (desfile de profissionais do sexo promovido pela Fundação Doimo em 2013 e 2014), não aparece ninguém. Na hora de fazer críticas e comentários maliciosos no Facebook, parece que é um bando de gente à toa que fica só 'feicebucando' e criticando. O tempo que estão usando para criticar nas redes sociais, vem aqui conhecer, bater papo e apresentar um projeto social que a gente consiga resgatar essa menina", convoca.