'Não tive nem chance de defesa', diz babá agredida por esposa de policial em condomínio
Advogado para quem babá trabalha tentou defendê-la das agressões e acabou baleado pela esposa do policial; caso ocorreu em Manaus (AM)
"Eu não tive nem chance de defesa. Eu me sinto humilhada, é assim que eu me sinto". Esse foi o relato emocionado da babá Claudia Gonzaga de Lima em entrevista ao Fantástico neste domingo, 27, ao relembrar as agressões que sofreu no condomínio em que trabalha pela esposa de um policial civil, Jussana Oliveira Machado. A suspeita e seu marido, o policial Raimundo Nonato Machado, foram presos após o ocorrido.
"Eu só senti quando ela me empurrou. Quando eu me virei, eu já fui apanhando literalmente, né? Ela já foi me batendo, me dando socos. Sabe uma pessoa sem valor? É assim que eu me sinto. Só o que eu quero, o que peço a Deus, é que isso não aconteça com mais ninguém", disse a babá ao programa da TV Globo.
O patrão de Cláudia, o advogado Ygor de Menezes Colares, de 35 anos, foi baleado na perna por Jussana após tentar ajudar a babá. O caso ocorreu no último dia 18, em Manaus, no Amazonas. Câmeras de segurança registraram o momento do disparo e também as agressões.
Segundo o Fantástico, Cláudia é babá do filho de 2 anos de Ygor, que mora no condomínio com a família há três anos e é vizinho de porta do casal agressor. O advogado relatou que, até o dia da primeira queixa dos vizinhos contra Cláudia, em julho, nunca tinha tido problemas com eles.
"O Nonato e a Jussana me procuraram semanas antes de todo esse ocorrido, alegando que a Cláudia estava fazendo fofoca sobre eles no condomínio. A Cláudia negou veementemente qualquer ato de fofoca e eles ficaram irritados. Eles gostariam que eu demitisse a Cláudia", afirmou Ygor.
Antes do dia da agressão, já tinham ocorrido dois episódios entre o casal e a babá no condomínio. Imagens obtidas pelo Fantástico mostram que, no dia 3 de julho, aconteceu o primeiro episódio de truculência contra Cláudia. Na ocasião, ela estava saindo com a criança que cuida para passear, quando o policial e a esposa apareceram.
"Fui sair com o bebê para passear. Eu chamei o elevador, que já tinha descido, e fiquei lá aguardando", relembrou ela. Em seguida, o policial aparece no corredor e entra na frente do carrinho do bebê. "A esposa dele disse que não entraria no elevador de jeito nenhum comigo. Só que quando o elevador chegou, eles entraram, e quando eu fui entrar ele me impediu. Me xingou e colocou o pé no carrinho do bebê para eu não entrar", acrescentou a babá.
Dez dias depois ocorreu o segundo episódio. Nesta segunda ocasião, câmeras de monitoramento também flagraram quando Jussana se aproximou de Cláudia, que estava sentada em uma área comum do condomínio. Em seguida, ela falou algumas palavras e apontou o dedo para a babá, que ficou sem reação.
"Começou a me xingar, me ameaçar, dizer que só não iria bater ali mesmo por conta das crianças que estavam ali e em respeito ao bebê que estava comigo, mas que me pegaria lá fora", contou a babá.
Após esse segundo episódio, Ygor foi à delegacia com Cláudia e registrou queixa por ameaça, injúria e ofensas por parte de Jussana. O advogado relatou à suspeita que havia registrado boletim de ocorrência contra ela. Depois disso, a mulher também registrou um B.O, alegando que teria sido ameaçada de morte por Ygor.
“Nunca a ameacei. Não faz parte da minha índole esse tipo de conduta”, disse o advogado. Até que no último dia 18 ocorreram as agressões. Segundo Ygor, ele costumava pedir um carro de aplicativo para levar a babá para casa após ela encerrar o expediente.
No dia do ataque, ele foi até a varanda do apartamento dele fazer o pedido e ver se o carro havia chegado enquanto a funcionária descia. Mas o que viu foi uma cena de violência contra a babá do filho dele no estacionamento do condomínio. Ygor então desceu para tentar ajudar a funcionária, mas foi agredido pelo casal. Pouco depois, foi atingido por um disparo de arma de fogo.
"Se eu não tivesse aparecido ali, eu não sei o que teria acontecido mais com a Cláudia. Eu me senti na obrigação de defender a Claudia naquele momento, mesmo sabendo que ele podia estar armado ali. Eu diria que foi o pior momento da minha vida", relembra o advogado sobre o dia da agressão.
Josemar Berçot, advogado de Ygor e Cláudia, acredita que a babá tenha sido vítima de discriminação. "A única hipótese que nós conseguimos enxergar diante do quadro, das testemunhas das situações anteriores, é que havia uma nítida discriminação contra a senhora Cláudia pela condição social, socioeconômica dela, em ser uma babá", afirmou.
Já a defesa dos agressores nega ao Fantástico que a motivação tenha sido por preconceito e afirma que o tiro não foi proposital. "O motivo dos fatos não tem nada a ver com discriminação. Foi a respeito dessa confusão que já havia entre as duas. A violência, nesse caso, ela é injustificável, não tem justificativa para a forma como eles agiram. Mas o disparo foi acidental", alegou Arthur da Costa Ponte, advogado de Raimundo e Jussana.
Agressões e disparo de arma
Segundo uma reportagem do Jornal Nacional, o disparo foi feito pela mulher do investigador Raimundo Nonato Machado - que é quem passa a arma para ela. Vídeos exibidos no telejornal mostram o momento em que o investigador dá ordens para esposa, Jussana Oliveira Machado, espancar a babá Claudia Gonzaga de Lima.
“Bate a cabeça dela! Na cabeça dela... Bate. Quebra a cara dela”, teria dito o policial civil a sua esposa. Ele é quem aparece nas imagens usando camiseta preta e bermuda vermelha.
Durante a briga, o policial segue incentivando as agressões, e, já no chão, a babá é agredida com socos. Em seguida, consegue levantar e pedir ajuda.
Pouco depois, o advogado Ygor de Menezes tenta apartar a briga e ajudar a babá, que trabalha para ele. No entanto, ele leva um soco do investigador e eles começam a brigar.
O policial então passa a arma a sua mulher e ela começa a ameaçar quem tenta chegar perto da briga, além de agredir a babá com uma coronhada na cabeça. Depois, o advogado é jogado no chão, e a companheira do policial atira e acerta a perna de Ygor.
As imagens também mostram que Ygor tenta fugir, mas é perseguido pelo policial, que consegue acertar um soco nele. A discussão só acaba após a polícia chegar ao local.
Segundo o Jornal Nacional, Jussana foi presa em flagrante, enquanto o policial Raimundo teria, inicialmente, assinado um termo de declarações e sido liberado. A medida, no entanto, foi questionada pelo Ministério Público e pela OAB/AM.
Em nota enviada ao Terra, a Polícia Civil do Amazonas (PC-AM) atualizou que o investigador Raimundo Nonato Machado se apresentou, na manhã do último dia 20, na Delegacia Geral, situada na avenida Pedro Teixeira, bairro Dom Pedro, zona centro-oeste, passou por exames de corpo de delito e seguiu para carceragem, onde ficará à disposição da Justiça.
"A PC-AM afirma, ainda, que não compactua com qualquer desvio de conduta de seus servidores e assegura que todas as transgressões administrativas são apuradas", acrescentou a corporação.
Imagens das câmeras de monitoramento, também divulgadas pela TV Band, mostram toda a dinâmica das agressões e o momento em que o advogado é baleado. Assista abaixo: