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No Complexo do Salgueiro, operações policiais violentas não abalam domínio do tráfico

Comunidade na Baía de Guanabara foi cenário de outras ações que resultaram em civis mortos, como oito pessoas em 2017 e o menino João Pedro em 2020

24 nov 2021 - 21h07
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RIO - À beira da Baía de Guanabara e em uma das regiões mais pobres do Estado do Rio, o Complexo do Salgueiro é uma comunidade pobre e repleta de nuances. Mas tem uma característica em comum com outras favelas: o domínio do tráfico. Nela, são comuns relatos sobre homens armados circulando pela região, parte do município de São Gonçalo, a segunda maior cidade fluminense em população.

A área também é usada por criminosos especializados em roubo de cargas. A favela não deve ser confundida com o morro homônimo na zona norte da capital fluminense, onde fica a sede da Acadêmicos do Salgueiro, escola de samba tradicional do carnaval carioca.

"Eu moro no complexo do Salgueiro, milhares de outras pessoas também. Se tivéssemos condições financeiras, estaríamos morando em condomínios na Barra (da Tijuca)", afirmou, em uma rede social, uma moradora, na segunda-feira, 22.

Nesse dia, foram retirados oito corpos de um manguezal na região, depois de uma operação do Batalhão de Operações Especiais (Bope) após a morte de um sargento baleado por criminosos. O resgate do lamaçal foi feito por parentes dos mortos: os bombeiros alegaram falta de segurança para entrar na comunidade. Moradores denunciaram sinais de mutilação e tortura nos cadáveres.

Investigações foram instauradas para apurar em que circunstâncias as mortes aconteceram. Organizações da sociedade civil cobraram transparência e responsabilização pelo caso, cujas suspeitas iniciais recaem sobre a atuação policial. Especialistas destacam a necessidade de se entender a dinâmica dos eventos e se a operação ocorreu em um caráter ilegal de vingança após a morte do sargento no local no sábado passado.

60 mil pessoas moram na região, aponta estimativa

Na comunidade do outro lado da baía, a presença constante de criminosos é facilitada pela geografia do lugar. Além de estar às margens da baía, o complexo fica à beira da Rio-Manilha (trecho da BR-101). A localização facilita a entrada e saída de drogas e de outros produtos de origem criminosa.

Policiais apontam o traficante Antônio Ilário Ferreira, o Rabicó, como chefe do bando que domina o Salgueiro. Não há dados oficiais, mas estimativas indicam que aproximadamente 60 mil pessoas moram na região.

Apesar de muitas vezes ser referida simplesmente como favela do Salgueiro, a região é composta por localidades bem diferentes. O bairro do Salgueiro possui boas casas e melhor infraestrutura. É nas partes mais afastadas que existe mais pobreza e presença mais ostensiva de traficantes armados.

Esse é o caso da região do mangue, onde os cadáveres foram encontrados. Barreira e Sítio são outros pontos da comunidade listadas entre as mais pobres. Nelas, há muitas famílias em situação de vulnerabilidade social.

A presença do Estado na região é tão precária quanto a situação das famílias. Não são raros os relatos de moradores que não podem contar com refrigerador para preservar alimentos ou mesmo de um ventilador para tentar se refrescar no calor, porque o fornecimento de energia é caótico. Assim, os "gatos" (ligações clandestinas) de luz são comuns - assim como o risco que esse tipo de recurso acarreta.

Entrega de encomendas ou cuidado com as ruas, cada vez mais esburacadas, praticamente inexistem. O argumento para o abandono é quase sempre o mesmo: o perigo oferecido por traficantes.

Nas redes sociais, moradores do Salgueiro relatam o medo constante em que vivem. A insegurança é tão grande que mesmo a Polícia Civil só foi para o local, para começar a investigar a ação policial que resultou nas mortes, depois que a região estava mais estabilizada, com apoio da Polícia Militar.

É justamente nesse aspecto que o Estado se faz mais presente no Complexo do Salgueiro. Operações policiais na região, como a do Bope no fim de semana, são constantes.

Foi lá que, em 18 de maio de 2020, policiais mataram a tiros João Pedro Mattos, um garoto negro de 14 anos. Já em novembro de 2017, oito pessoas foram mortas a tiros em ação do Exército e da Polícia Civil. O domínio dos criminosos, porém, parece não se abalar com as incursões dos agentes.

"Moro no Complexo do Salgueiro e só me sinto seguro quando estou em casa ou na igreja orando", escreveu um morador, na semana passada, em uma rede social. / COLABOROU WILSON TOSTA

Estadão
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