PM suspeito de obstruir investigação em caso Marielle é preso
Operação Entourage, da Polícia Civil e do MP-RJ, mira milícia de Orlando Curicica na zona oeste do Rio; suspeitos de clonar carro usado no crime também foram detidos
Foi preso nesta sexta-feira, 31, um policial militar acusado de atrapalhar as investigações sobre a morte da vereadora do Rio Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes, em março de 2018. A operação, feita pela Polícia Civil e pelo Ministério Público do Rio, foi contra a milícia de Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, na zona oeste carioca. Curicica, hoje em presídio federal, foi acusado de envolvimento no assassinato.
O PM preso na Operação Entourage é Rodrigo Jorge Ferreira, o Ferreirinha, braço armado da quadrilha e acusado de mentir para a polícia, obstruindo as investigações no caso da execução da parlamentar. No fim de 2017, Ferreirinha teve um desentendimento com Curicica, para quem trabalhou como motorista.
Jurado de morte pelo ex-parceiro, Ferreirinha disse à Polícia Civil que o bando de Curicica seria responsável pela morte da vereadora. Declarou ainda que o mandante do crime seria o vereador Marcelo Siciliano (PHS). Os dois sempre negaram envolvimento no assassinato. No mês passado, uma investigação da Polícia Federal concluiu que Ferreirinha mentiu, atrapalhando as investigações.
Ainda assim, o delegado Daniel Rosa afirmou que a participação de Orlando Curicica no crime não está totalmente afastada. "A investigação prossegue", disse. "Nenhuma hipótese está descartada."
Já Rafael Carvalho Guimarães e Eduardo Almeida Nunes Siqueira, também detidos na operação, são acusados de serem responsáveis pela clonagem de carros para a milícia de Curicica. Ele é um ex-PM, que está preso em Mossoró, no Rio Grande do Norte. "Acreditamos que a prisão dos dois (Rafael e Eduardo) vai trazer novos elementos para a investigação (do caso Marielle e Anderson)", afirmou o delegado Daniel Rosa, da Delegacia de Homicídios da Capital.
Segundo o delegado, Rafael e Eduardo clonavam carros a serem usados em crimes da própria quadrilha. Mas esse também era um negócio oferecido para outros grupos criminosos.
"É uma prática comum dessas organizações para usar nas próprias ações e também para gerar lucro para a quadrilha", disse Rosa. "Eles pegam veículos roubados e usam referências de outros carros (legais) do mesmo modelo e da mesma cor para despistar a polícia; quando coletamos um dado, uma imagem, numa investigação, somos remetidos a um veículo bom, de uma pessoa do bem."
A reportagem não conseguiu falar com a defesa dos acusados na tarde desta sexta-feira.
Investigação
Marielle Franco e Anderson Gomes foram assassinados em 14 de março do ano passado. O acusado de ser executor do crime foi o PM reformado Ronnie Lessa, que está preso. Até hoje não se sabe quem teria sido o mandante do assassinato. As investigações seguem em sigilo de Justiça.
Pelo menos 200 policiais participaram da operação desta sexta, que prendeu oito pessoas. Outras nove investigados já se estavam na cadeia por outros crimes. A organização criminosa é acusada de atuar em 14 comunidades da zona oeste, aterrorizando moradores e comerciantes.
Os inquéritos policiais, instaurados pela Delegacia de Homicídios do Rio, revelaram que o grupo opera na exploração ilegal de serviços básicos na região, como transporte, lazer, alimentação e segurança. Os criminosos cobram taxas de proteção aos comerciantes da localidade, pedágios aos trabalhadores de transporte alternativos (vans e mototáxis), além de dominar associações de moradores das regiões.
Os integrantes da quadrilha são acusados de homicídios, ameaças, torturas, grilagem de terras, roubo, contrabando, entre outras atividades ilícitas. Os crimes praticados pelo bando são, em sua maioria, cometidos com extrema violência, incluindo execução de testemunhas e tentativas de homicídio de autoridades responsáveis pelas investigações. Os membros dessa quadrilha fazem imperar a "lei do silêncio" entre os moradores da localidade em que exercem o controle criminoso.
Diretor do Departamento Geral de Homicídios, o delegado Antônio Ricardo Nunes contou que autoridades, juízes e policiais envolvidos na investigação da milícia de Curicica foram ameaçados de morte e estão agora sob escolta. "Gostaria de destacar que essa quadrilha ameaçou autoridades, juízes e delegados, e essa é uma demonstração do Estado de que esse tipo de crime não vai ficar impune."