Polícia do Rio indicia madrasta acusada de envenenar enteados com chumbinho
Cíntia Mariano Cabral está presa desde o dia 20 de maio depois que um enteado passou mal e foi levado ao hospital
A Polícia Civil do Rio de Janeiro anunciou nesta quinta-feira, 7, o indiciamento de Cíntia Mariano Cabral, de 49 anos, presa sob suspeita de matar sua enteada envenenada e tentar matar seu enteado da mesma forma. O inquérito foi encaminhado para o Ministério Público do Estado do Rio, que vai analisar se denuncia Cintia à Justiça, arquiva o caso ou pede a continuidade da investigação. Ela está presa desde 20 de maio.
No dia 15 daquele mês, Bruno Carvalho Cabral, de 16 anos, almoçou na casa que seu pai, Adeílson Cabral, dividia com a então mulher, Cintia - Adeílson era separado de Jane Cabral, mãe de Bruno - em Padre Miguel, na zona oeste do Rio. O adolescente passou mal após a refeição - ele reclamou do gosto do feijão e estranhou a presença de uma substância azul.
O adolescente se sentiu zonzo, ficou molhado de suor e logo não conseguia mais falar, com a língua enrolando. Foi internado no Hospital Municipal Albert Schweitzer, em Realengo (zona oeste do Rio), e conseguiu se recuperar da intoxicação - teve alta quatro dias depois.
Cintia foi presa no dia 20 sob a suspeita de tentar envenenar o enteado. Inicialmente ela afirmou à Polícia Civil que a substância azul detectada no feijão era um tempero industrializado para alimentos. Depois, em depoimento oficial e acompanhado por advogado, manteve-se em silêncio.
A partir da suposta tentativa de matar o enteado, a madrasta começou a ser investigada também pela morte da irmã de Bruno, Fernanda Carvalho Cabral, de 22 anos. Ela morreu em 28 de março, após apresentar sintomas semelhantes aos do irmão e passar 13 dias internada no mesmo hospital.
Quando ela chegou à unidade de saúde ainda não havia suspeita de envenenamento, por isso não houve tratamento imediato específico para isso. O corpo de Fernanda foi exumado em 26 de maio e os exames realizados pelo Instituto Médico Legal foram inconclusivos, devido ao tempo passado desde a morte. Mas, segundo a polícia, o conjunto de informações permite concluir que ela foi envenenada.
A perícia indicou que Fernanda foi vítima de intoxicação por algum inibidor da enzima acetilcolinesterase, fundamental para a propagação do impulso nervoso. Esse tipo de inibição é produzida por carbamatos (substâncias popularmente conhecidas como chumbinho) e pesticidas e causa exatamente os sintomas apresentados por Fernanda e Bruno.
Também foi feito exame do material gástrico de Bruno, que identificou dois tipos de pesticidas no estômago dele.
O delegado Flavio Rodrigues, titular da 33ª DP (Realengo) e responsável pela investigação do caso, concedeu entrevista coletiva nesta quinta-feira e comentou a conduta da madrasta quando o enteado reclamou do gosto do feijão. "Chama muita atenção a indiciada recolher o prato de Bruno e levar ao cooktop, apagar a luz e servir mais feijão. Como isso vai passar despercebido? Quem de nós faria isso em nossa casa se reclamássemos do gosto amargo da comida? Quando alguém reclama de gosto, geralmente joga a comida fora. Mas ela recolhe o prato e serve mais feijão. E só o garoto reclamou do gosto do feijão. Foi o primeiro evento que chamou a atenção", afirmou.
O delegado também citou os depoimentos prestados por dois filhos biológicos de Cíntia, que afirmaram ter ouvido dela a confissão do crime. "Lucas fala: 'Minha mãe me confessou em uma conversa que tive com ela que envenenou o Bruno e a Fernanda há dois meses porque não queria dividir a atenção do companheiro. Minha mãe confessou isso para mim'. Há 21 anos na polícia, eu nunca tinha visto alguém vir a público pedir justiça por um crime praticado pela própria mãe", afirmou.
O Estadão procurou a defesa de Cintia para que se pronunciasse sobre o indiciamento, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.