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Projeto trata dependentes de crack com café e limão em SP

Método é usado por cerca de 90 dependentes químicos; projeto funciona em casa ocupada e corre risco de despejo

28 jul 2015 - 14h00
(atualizado às 15h16)
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“Falta algo no nosso organismo. Muitas vezes não temos consciência do que é que está faltando, mas às vezes a lembrança é tão forte que a gente chega a sentir o gosto da droga. E o café tira o gosto de qualquer coisa ingerida.”

Limão para reduzir os efeitos da abstinência e café para limpar o organismo: este é o método do projeto Crack Zero
Limão para reduzir os efeitos da abstinência e café para limpar o organismo: este é o método do projeto Crack Zero
Foto: Wagner Machado / Terra

O relato é de Maurício Augusto Pacheco, 35 anos, que largou o último semestre da faculdade de Direito quando conheceu o crack, sete anos atrás. “Foi um trago e amor à primeira vista”, conta. Há cinco meses sem usar drogas, Pacheco hoje luta contra o vício com a ajuda dos voluntários do projeto Crack Zero, que usa um método pouco convencional para tratar os dependentes químicos: café e limão.

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Segundo Luciano Celestino da Silva, 39 anos, criador do projeto, o café tem a função de limpar o organismo; já o limão reduz os efeitos da abstinência. “Não é remédio, isso está bem claro. O limão não cura. Mas ele causa um impacto direto no vício, na crise de abstinência”, diz Silva, que também é líder comunitário em Heliópolis (zona sul).

Ex-usuários relatam dias de vício e recomeço longe do crack:

Adriano José de Lima Silva, 33 anos, consente. “A abstinência bate, e quando bate a gente começa a ficar nervoso. Então a gente toma um pouco de limão e já acalma os nervos, começa a caminhar de novo”, diz ele, que entrou no projeto há três meses e, desde então, está “limpo”. Antes disso, morava com a mulher e a filha pequena em uma Kombi, usando “todo tipo de droga todos os dias”.

De acordo com a psiquiatra Camila Magalhães Silveira, pesquisadora do Programa de Álcool e Drogas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), não há estudos científicos a respeito do uso de café e limão no tratamento da dependência química. Ela diz, contudo, que a ressocialização é fundamental no combate ao vício em crack.

“O que a gente percebe é que muitas vezes eles precisam de um cuidado, de alguém que os ajude a passar pela fase da abstinência. Então, se existe sucesso (no projeto), ele está mais vinculado a isso. São pessoas que estenderam a mão e ofereceram um placebo”, disse.

Longe das drogas, Kátia colabora como cozinheira na casa do Sacomã do projeto Crack Zero
Longe das drogas, Kátia colabora como cozinheira na casa do Sacomã do projeto Crack Zero
Foto: Wagner Machado / Terra

O Crack Zero nasceu em 2011 e hoje trata cerca de 90 dependentes químicos. Para o seu idealizador, levar o projeto adiante é como uma missão. “É um compromisso. Eu tinha uma dívida, e chega uma hora em que você precisa fazer alguma coisa para se completar”, diz Luciano Silva.

Os trabalhos são feitos em duas casas na zona sul da capital: uma no Ipiranga, onde vivem 20 pessoas, e outra no Sacomã, que abriga o restante dos internos. Para alimentar tanta gente, o projeto vive de doações de supermercados, sacolões e simpatizantes. Também há ajuda de igrejas, além de culto evangélico toda semana. “Agradeço a Deus por ter sido acolhido aqui”, diz Adriano Silva.

Despejo

A casa do Ipiranga é emprestada, mas o local onde o projeto funciona no Sacomã é, na verdade, um imóvel ocupado. A pedido da proprietária, a Justiça de São Paulo já havia autorizado a reintegração de posse, mas a decisão foi suspensa temporariamente após um recurso de representantes do Crack Zero.

“Nós tentamos alugar o imóvel. Essa proposta foi feita, mas a proprietária não quis”, diz Luciano Silva, que faria uma “vaquinha” para pagar o aluguel. A informação foi confirmada pela advogada Jackeline Pollin, que representa a dona do imóvel. “Essa casa faz parte de um inventário e a família só aceita a venda. Minha cliente é uma senhora aposentada de mais de 80 anos. Ela precisa desse dinheiro”, disse Pollin.

“Não quero nada de ninguém, quero um espaço para trabalhar”, diz Luciano Celestino da Silva, criador do Crack Zero, sobre risco de despejo
“Não quero nada de ninguém, quero um espaço para trabalhar”, diz Luciano Celestino da Silva, criador do Crack Zero, sobre risco de despejo
Foto: Wagner Machado / Terra

A fim de tentar evitar o despejo, Luciano Silva procurou a Prefeitura de São Paulo, e a Secretaria Municipal da Saúde esteve no local. A pasta, no entanto, informou que não pode firmar qualquer parceria com o projeto Crack Zero, o qual considera um "equipamento de acolhida".

"Além de estarem em local invadido, a entidade não está constituída como pessoa jurídica, o que impede qualquer parceria. Após esse passo, a entidade deve cumprir todas as medidas legais e possuir um estatuto ou contrato social. A partir disso, a ONG poderá participar de chamada pública para parcerias", informa a secretaria, em nota. A Prefeitura de São Paulo mantém desde janeiro de 2014 o projeto "De Braços Abertos", que oferece emprego e moradia para usuários de droga na região da Cracolândia, no centro da capital.

Fonte: Terra
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