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Temporal na Baixada Santista mata 18 em São Paulo

Tempestade causa deslizamentos de encostas em Santos, São Vicente e Guarujá. Há ainda na região 30 desaparecidos e 200 desabrigados

3 mar 2020 - 22h43
(atualizado às 23h00)
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Um temporal forte em Santos, Guarujá e São Vicente, no litoral sul paulista, deixou pelo menos 18 mortos entre a segunda-feira, 2, e a terça-feira, 3. Houve vários deslizamentos nos três municípios e, conforme balanço da Defesa Civil do Estado, havia ainda 30 desaparecidos e cerca de 200 desabrigados na noite desta terça. Neste verão, o total de mortes por chuvas no Sudeste - São Paulo, Rio, Minas e Espírito Santo - já chegou a pelo menos 140 - 70% a mais do que no verão passado, quando houve 82 vítimas.

Após eventos extremos - como chuvas de mais de 100 milímetros em um só dia em Belo Horizonte (janeiro) e na capital paulista (fevereiro) -, o total de desabrigados e desalojados no período passa de 87 mil, segundo dados da Defesa Civil compilados pelo Estadão.

Vítimas

2019 / 2020

  • São Paulo 41 / 42
  • Minas Gerais 18 / 72
  • Espírito Santo 7 / 15
  • Rio de Janeiro 16 / 11

A combinação de efeitos de longo prazo das mudanças climáticas, temperaturas mais baixas nos oceanos e falhas urbanísticas nas cidades leva aos desastres, dizem especialistas (mais informações nesta página) "Há um tempo, chuvas de 120 milímetros no mesmo dia eram a cada 50 ou 100 anos. Agora, vemos isso se repetir em poucas semanas", diz Ivan Carlos Maglio, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP).

O Núcleo de Gerenciamento de Emergência da Defesa Civil do Estado indicou que a chuva acumulada nos temporais mais recentes no Guarujá foi de 282 milímetros; em Santos, no mesmo período, chegou a 218 mm. A média histórica prevista para a Baixada Santista durante todo o mês de março é de 257,3 milímetros.

Nesta terça, o Guarujá era o local com mais mortos (15) e desaparecidos (19). Um dos locais mais atingidos foi o Morro do Macaco Molhado, onde cinco morreram - incluindo dois bombeiros que tentavam encontrar uma mãe e um bebê após um desabamento, quando a terra deslizou outra vez.

O ajudante de pedreiro Luciano Oliveira, o Aranha, de 59 anos, dormia em casa, no morro, quando houve o deslizamento, por volta de 1h30. Ele ficou soterrado até o umbigo e teve auxílio de vizinhos e bombeiros. "Achei que iria perder metade do corpo. Me ajudaram a sair pela janela." No início da tarde, mesmo com a chuva, Oliveira estava nas proximidades da casa, preocupado em conseguir documentos. Já a casa, de madeira, em que vivia há seis anos, desmoronou. "Não tenho lugar para ir. Perdi tudo, estou só com a roupa do corpo."

Bombeiros estimavam 30 imóveis atingidos no local. "Como algumas (moradias) não estão cadastradas, é difícil fazer estimativa mais próxima da realidade", disse o secretário adjunto de Defesa Civil do Guarujá, Carlos Eduardo Smicelato. A prefeitura prepara um abrigo com 200 vagas, que pode ser ampliado para até 400. O Estado prometeu aluguel social aos desabrigados e a Defesa Civil se mobiliza para tirar moradores de áreas de risco, pois há perigo de mais desabamentos.

Em Santos, deslizamentos atingiram os Morros Santa Maria, São Bento, Vila Progresso e Monte Serrat - muitos moradores abandonaram as casas. A prefeitura distribuiu lonas plásticas a moradores e suspendeu parte das aulas, por dificuldades de acesso. Um colégio acolheu desabrigados.

Houve ao menos quatro quedas de barreira na Rodovia Doutor Manuel Hipólito Rego, em dois pontos da Rio-Santos e mais dois da Guarujá-Bertioga. O VLT da Baixada também amanheceu paralisado, após deslizamento de terra perto do túnel que liga Santos a São Vicente.

Vítimas

No Estado de São Paulo, foram 42 mortes por chuva este verão, número que pode subir diante do total de desaparecidos. No ano anterior, haviam sido 41. Minas é o Estado com mais mortos (72), quatro vezes mais do que no verão anterior. Em Belo Horizonte, temporais em janeiro deixaram 13 mortos e os estragos nas ruas custarão ao menos R$ 300 milhões.

No Rio, um dia após culpar a população pelos estragos causados pela chuva, o prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) disse nesta terça que "talvez tenha" se expressado mal e "até" pediu desculpas. Na segunda, ao visitar Realengo (zona oeste), um dos locais mais prejudicados pelo temporal de sábado, ele havia dito que "a culpa é de grande parte da população, que joga lixo nos rios frequentemente". Ele ainda admitiu problemas na conservação da cidade e culpou a falta de dinheiro.

Ruas de Santos ficam seriamente prejudicadas após forte chuva atingir a cidade.
Ruas de Santos ficam seriamente prejudicadas após forte chuva atingir a cidade.
Foto: Jota Erre / Agência O Dia / Estadão Conteúdo

Já o governo fluminense promete mapear terrenos disponíveis nos municípios afetados pelas últimas chuvas para construir conjuntos habitacionais destinados à população de baixa renda em áreas de risco. No Estado, o número de óbitos por causa de temporais neste verão chegou a 11, ante 16 na mesma estação do ano passado.

O governo federal anunciou há um mês R$ 892 milhões para Minas, Rio e Espírito Santo por causa das chuvas. O Ministério do Desenvolvimento Regional disse nesta terça que avaliará a necessidade de liberar verba para a Baixada Santista. A pasta disse ainda que vai priorizar situações mais críticas. "Em especial os pequenos municípios e os que estão em maior dificuldade econômica." Também afirmou que acompanha in loco estragos causados pela chuva na Baixada Santista. O secretário nacional de Proteção e Defesa Civil (Sedec), coronel Alexandre Lucas, está na região.

'Minha filha ficou presa na madeira'

O desempregado Felipe Oliveira, de 22 anos, morava em um barraco destruído pelo temporal no Morro do Macaco Molhado, no Guarujá. Ele se mudou havia três meses, juntamente com a mulher, grávida, e a filha de 4 anos.

Após o deslizamento, ele deixou a família com a irmã e voltou ao local do desastre. "Consegui pegar só umas roupinhas. Desmoronou, caiu tudo em cima de mim. Minha filha ficou presa debaixo da madeira. Um amigo veio e ajudou. Senão, a gente não iria conseguir sair. Depois fomos à luta ajudar todo mundo."

O cenário no local, onde cinco morreram, era de destruição nesta terça. Barracos vieram abaixo, móveis e eletrodomésticos ficaram destruídos, além de lama e dificuldade para retirar escombros na busca por sobreviventes. O resgate era feito manualmente, pois não havia como usar máquinas. Há risco de novos deslizamentos.

Os bombeiros faziam movimentos minuciosos e eram avisados por apitos sobre a possibilidade de algo pior acontecer. No alto do morro, voluntários, enfileirados, ajudavam a tirar a lama. Um balde passava de mão em mão até ser despejado em área isolada. Nas ruas da parte baixa, a população usava enxadas e carrinhos de mão para retirar material avermelhado.

Entre os moradores, o sentimento era de incredulidade. "Tudo tremia na casa", lembra Bruna da Rocha, de 27 anos, que mora nas proximidades do deslizamento no Morro do Macaco Molhado, no Guarujá, cidade da Baixada Santista mais atingida pelo temporal. "Começou todo mundo a gritar, chorando, pedindo ajuda. Nunca vi algo assim na vida", diz a dona de casa.

E mesmo quem não vivia no morro correu para ajudar. Luiz Vitor Feitosa era um dos que estavam cobertos de lama. Ele nem morava lá, mas foi logo ao saber do deslizamento, preocupado com parentes. "Acordei com meu pai me chamando para ajudar. Já encontraram um tio e uma tia minha mortos", contou ele, ainda na expectativa de encontrar outra tia e mais três primos desaparecidos.

Segundo o Estado, 12,5 toneladas de materiais de ajuda humanitária (colchões, cobertores, cestas básicas, água sanitária e água potável) foram para as cidades afetadas. As redes sociais também tiveram mobilização por doações. O Santos (time de futebol) foi um dos que coletaram donativos. / PRISCILA MENGUE, JOSÉ MARIA TOMAZELA, JOÃO KER, GILBERTO AMENDOLA, MATEUS VARGAS e LUCAS MELO, ESPECIAL PARA O ESTADO

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