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Tragédia em Santa Maria

RS: associação de familiares de Santa Maria conta com apoio internacional

27 mai 2013 - 10h44
(atualizado às 10h56)
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<p>O grupo se formou após a tragédia que matou mais de 200 pessoas em Santa Maria</p>
O grupo se formou após a tragédia que matou mais de 200 pessoas em Santa Maria
Foto: Fernando Borges / Terra

Após quatro meses da tragédia da Boate Kiss, em Santa Maria (RS), que resultou na morte de 242 pessoas, uma associação criada para apoiar e confortar familiares de vítimas foi muito além de seu objetivo inicial. Ela acabou ganhando força política e institucional e já ganhou reconhecimento fora dos limites do Rio Grande do Sul e das fronteiras do País.

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A ideia de criar a associação partiu de dois pais de vítimas da tragédia, Adherbal Ferreira, que perdeu a filha Jenefer no incêndio da casa noturna, e Léo Becker, que nunca mais pôde abraçar a filha Érika. As meninas eram amigas, mas os pais se conheciam mais por relações comerciais. Depois da tragédia, eles se aproximaram e, após reuniões e mobilizações, a Associação de Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM) foi fundada em fevereiro e oficializada em março.

Aos poucos, a associação foi ganhando legitimidade, sendo informada passo a passo sobre o inquérito da Polícia Civil que investigava a tragédia e, depois, da denúncia do Ministério Público sobre o caso. Quando a Defensoria Pública do Estado entrou com uma ação cível para pedir indenizações pelo que aconteceu, a AVTSM foi convidada a participar. Depois, a própria associação virou coautora do processo.

Mas foi espalhando seus objetivos e suas ideias que a AVTSM ganhou notoriedade mundo afora. Na última quarta-feira, o presidente da associação, Adherbal Ferreira, o vice, Léo Becker, e o coordenador da AVTSM, professor Sergio Madruga, estiveram em Brasília para um encontro promovido pelo Instituto Sprinkler Brasil alusivo aos cem dias da tragédia. Na capital federal, eles fizeram contato com a diretora executiva da Phoenix Society for Burn Survivors, Amy Acton. A entidade norte-americana dá apoio para vítimas de queimaduras e prometeu ajuda para a AVTSM.

No mesmo evento, os representantes da AVTSM também fizeram contato com outro estrangeiro: o americano Russ Fleming, diretor-geral da International Fire Sprinkler e presidente da National Fire Sprinkler Association. Desde bem antes disso, a associação já tem estreita relação com familiares de vítimas da tragédia na boate Republica Cromagnon, na Argentina. Representantes da associação do país vizinho visitaram Santa Maria e, inclusive, fizeram uma homenagem em Buenos Aires para os mortos da Kiss, quando a tragédia completou três meses. Os contatos internacionais também incluem o embaixador de Israel no Brasil, Rafael Eldad, que fez questão de contatar representantes da AVTSM em sua visita a Santa Maria, no dia 15 de maio.

As conexões dentro do Brasil também se espalharam. O presidente da AVTSM, Adherbal Ferreira, já esteve em Fortaleza (CE) para apresentar a associação em uma das mesas do 8º Congresso Norte-Nordeste de Psicologia. No Ceará, a associação estreitou relações com o Instituto Felipe Melo, que tem o objetivo de explorar o poder de mudança dos jovens para agir de forma a criar uma sociedade mais solidária. A entidade nasceu a partir da morte de Felipe, em 2012, quando ele teve um acidente ao praticar alpinismo na Nova Zelândia.

Celebridades como a atriz Cissa Guimarães, que virá a Santa Maria para falar pessoalmente com familiares de vítimas, e a jornalista Sandra Annemberg, também já manifestaram seu apoio.

Em meio a críticas por neutralidade em relação ao papel do poder público no episódio do incêndio da Kiss, a associação vai ganhando força. O sucesso está ligado exatamente a posições mais comedidas. Afinal, a AVTSM está quase chegando aos 700 associados. São pessoas que não se conheciam antes da tragédia e que têm visões diferentes entre si sobre as formas de cobrar por justiça. Foi mantendo o equilíbrio que a associação chegou longe. Apesar disso, nos próximos dias, a AVTSM deve tomar uma atitude radical e oficializar sua saída da mesa da CPI que investiga a tragédia na Câmara de Vereadores de Santa Maria, por não concordar com o andamento dos trabalhos.

Incêndio na Boate Kiss

Na madrugada do dia 27 de janeiro, um incêndio deixou 242 mortos em Santa Maria (RS). O fogo na Boate Kiss começou por volta das 2h30, quando um integrante da banda que fazia show na festa universitária lançou um artefato pirotécnico, que atingiu a espuma altamente inflamável do teto da boate.

Com apenas uma porta de entrada e saída disponível, os jovens tiveram dificuldade para deixar o local. Muitos foram pisoteados. A maioria dos mortos foi asfixiada pela fumaça tóxica, contendo cianeto, liberada pela queima da espuma.

Os mortos foram velados no Centro Desportivo Municipal, e a prefeitura da cidade decretou luto oficial de 30 dias. A presidente Dilma Rousseff interrompeu uma viagem oficial que fazia ao Chile e foi até a cidade, onde prestou solidariedade aos parentes dos mortos.

Os feridos graves foram divididos em hospitais de Santa Maria e da região metropolitana de Porto Alegre, para onde foram levados com apoio de helicópteros da FAB (Força Aérea Brasileira). O Ministério da Saúde, com apoio dos governos estadual e municipais, criou uma grande operação de atendimento às vítimas.

Quatro pessoas foram presas temporariamente - dois sócios da boate, Elissandro Callegaro Spohr, conhecido como Kiko, e Mauro Hoffmann, e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos. Enquanto a Polícia Civil investiga documentos e alvarás, a prefeitura e o Corpo de Bombeiros divergem sobre a responsabilidade de fiscalização da casa noturna.

A tragédia fez com que várias cidades do País realizassem varreduras em boates contra falhas de segurança, e vários estabelecimentos foram fechados. Mais de 20 municípios do Rio Grande do Sul cancelaram a programação de Carnaval devido ao incêndio.

No dia 25 de fevereiro, foi criada a Associação dos Pais e Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia da Boate Kiss em Santa Maria. A associação foi criada com o objetivo de oferecer amparo psicológico a todas as famílias, lutar por ações de fiscalização e mudança de leis, acompanhar o inquérito policial e não deixar a tragédia cair no esquecimento.

Indiciamentos

Em 22 de março, a Polícia Civil indiciou criminalmente 16 pessoas e responsabilizou outras 12 pelas mortes na Boate Kiss. Entre os responsabilizados no âmbito administrativo, estava o prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer (PMDB). A investigação policial concluiu que o fogo teve início por volta das 3h do dia 27 de janeiro, no canto superior esquerdo do palco (na visão dos frequentadores), por meio de uma faísca de fogo de artifício (chuva de prata) lançada por um integrante da banda Gurizada Fandangueira.

O inquérito também constatou que o extintor de incêndio não funcionou no momento do início do fogo, que a Boate Kiss apresentava uma série das irregularidades quanto aos alvarás, que o local estava superlotado e que a espuma utilizada para isolamento acústico era inadequada e irregular. Além disso, segundo a polícia, as grades de contenção (guarda-corpos) existentes na boate atrapalharam e obstruíram a saída de vítimas, a boate tinha apenas uma porta de entrada e saída e não havia rotas adequadas e sinalizadas para a saída em casos de emergência - as portas apresentavam unidades de passagem em número inferior ao necessário e não havia exaustão de ar adequada, pois as janelas estavam obstruídas.

Já no dia 2 de abril, o Ministério Público denunciou à Justiça oito pessoas - quatro por homicídios dolosos duplamente qualificados e tentativas de homicídio, e outras quatro por fraude e falso testemunho. A Promotoria apontou como responsáveis diretos pelas mortes os dois sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr, o Kiko, e dois dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Augusto Bonilha Leão.

Por fraude processual, foram denunciados o major Gerson da Rosa Pereira, chefe do Estado Maior do 4º Comando Regional dos Bombeiros, e o sargento Renan Severo Berleze, que atuava no 4º CRB. Por falso testemunho, o MP denunciou o empresário Elton Cristiano Uroda, ex-sócio da Kiss, e o contador Volmir Astor Panzer, da GP Pneus, empresa da família de Elissando - este último não havia sido indiciado pela Polícia Civil.

Os promotores também pediram que novas diligências fossem realizadas para investigar mais profundamente o envolvimento de outras quatro pessoas que haviam sido indiciadas. São elas: Miguel Caetano Passini, secretário municipal de Mobilidade Urbana; Belloyannes Orengo Júnior, chefe da Fiscalização da secretaria de Mobilidade Urbana; Ângela Aurelia Callegaro, irmã de Kiko; e Marlene Teresinha Callegaro, mãe dele - as duas fazem parte da sociedade da casa noturna.

Fonte: Especial para Terra
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