Com mortalidade elevada, Rio reabre bares e academias em volta "precipitada" à normalidade
Cariocas acostumados a frequentar academias e mesas de bar nas calçadas da cidade do Rio de Janeiro poderão retornar aos antigos hábitos a partir desta quinta-feira, com o início de uma nova etapa de flexibilização das medidas de distanciamento social contra a Covid-19, apesar da elevada taxa de mortalidade da doença respiratória provocada pelo novo coronavírus na cidade.
Com 6.618 mortes confirmadas pela Covid-19 nos pouco mais de quatro meses desde a chegada da pandemia ao Brasil, a cidade do Rio de Janeiro tem um índice de mortalidade de 980 para cada 1 milhão habitantes, mais de três vezes acima da taxa nacional, de 288 por cada 1 milhão, de acordo com dados do Ministério da Saúde.
Apesar de a cidade estar entre as capitais brasileiras com maior mortalidade provocada pela Covid-19 e da ocupação de 70% dos leitos de UTI na rede pública, a prefeitura autorizou academias, bares e restaurantes a reabrir as portas a partir desta quinta-feira, levando muitas pessoas de volta às ruas.
"Foram dias difíceis em casa, sem fazer nada, sem dinheiro e vendo esses desvios todos de dinheiro no Brasil. Estamos voltando devagar ainda e na esperança de dias melhores para uma vida nova dentro do novo normal", disse o garçom Fernando Melo, que trabalha há cinco anos em um restaurante em Copacabana.
A terceira fase da retomada das atividades econômicas na cidade ampliou os tipos de estabelecimentos autorizados a funcionar. Lojas, salões de beleza, barbearias e outros empreendimentos já estavam operando desde o início de junho. As praias ainda permanecem fechadas para o lazer, mas as pessoas podem realizar atividades esportivas individuais na areia.
A prefeitura estabeleceu diversos critérios de segurança e higiene para o funcionamento dos locais autorizados, como limite de capacidade e agendamento de horário, mas especialistas alertam que a pandemia ainda não foi contida na cidade para permitir uma reabertura desse nível.
"A abertura foi precipitada. Estamos vendo queda nas mortes, mas não significa que ao primeiro sinal de queda é seguro abrir", disse Américo Cunha, professor do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que compõe o grupo de pesquisa COVID-19: Observatório Fluminense, que monitoria a pandemia com foco no Estado do RJ.
"Categoricamente posso dizer que o contágio já está subindo por causa dessa abertura. Nas próximas semanas a curva começará a mostrar sinais de subida por causa dessa reabertura", afirmou. "A gente está cinco vezes acima do que deveria estar para abrir."
De acordo com dados do COVID-19: Observatório Fluminense, o Rio de Janeiro registrou mais de 800 mortes por semana entre 20 de maio e 3 de junho, e houve uma queda desde então para abaixo desse patamar, ficando pouco acima de 600 mortes na semana do dia 17 de junho. No entanto, a cidade deveria voltar aos níveis do começo de abril, com cerca de 60 mortes por semana, para ter uma reabertura segura, segundo Cunha.
"O Rio ainda tem muitas mortes diárias, isso é um indicador de que a doença ainda está muito ativa na população, e se você tem a doença ainda muito ativa e as pessoas circulando na rua, indo para a academia, a gente sabe que o contágio vai acontecer", afirmou.
Apenas de domingo até quarta-feira desta semana, foram registradas 252 mortes na capital em decorrência da Covid-19, de acordo com dados do Ministério da Saúde.
O elevado número de mortos coloca o Rio entre as capitais com maior taxa de mortalidade no Brasil, ao lado de Belém (1.280 mortos por 1 milhão de habitantes) e Fortaleza (1.230 por milhão.
Fosse um país, com seus cerca de 6,32 milhões de habitantes, o Rio de Janeiro seria a nação do mundo com maior letalidade por 1 milhão de habitantes, entre aquelas com população superior a 1 milhão de pessoas.
A Bélgica é o país do mundo com maior mortalidade por milhão atualmente, com taxa de 842, seguida por Reino Unido (644), Espanha (606) e Itália (575).
Em termos de letalidade da doença, ou seja, o percentual de pessoas que não sobrevivem à Covid-19, o Rio de Janeiro também apareceria entre os 10 países do mundo com maiores números, com taxa de 8,75%. Países europeus, com população mais idosa que a brasileira, são os mais afetados nesse aspecto: Bélgica (15,5%), Franca (14,78%), Itália (14,45%) e Reino Unido (14,01%) têm as maiores letalidades do mundo.
O Brasil como um todo tem taxa de letalidade de 4,2%, que o coloca bem distante dos países com os registros mais altos, apesar de ser o segundo do mundo em números absolutos tanto de casos como de mortes pelo novo coronavírus, atrás apenas dos Estados Unidos.