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Como a proliferação de plantas aquáticas está ameaçando a vida no rio São Francisco

Aumento da presença de plantas no rio que é fundamental para o Nordeste está surpreendendo e preocupando ambientalistas e pesquisadores da região. Isso porque elas têm dificultado a navegação, a pesca e o abastecimento de água em Alagoas.

14 jan 2020 - 18h15
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A proliferação de plantas aquáticas tem prejudicado o rio São Francisco, no Nordeste
A proliferação de plantas aquáticas tem prejudicado o rio São Francisco, no Nordeste
Foto: Companhia de Saneamento de Alagoas / BBC News Brasil

A proliferação acelerada de plantas aquáticas no rio São Francisco está surpreendendo e preocupando ambientalistas e pesquisadores no Nordeste.

A grande quantidade de espécies, em especial elódeas e aguapés (respectivamente dos gêneros elodea e eichhornia), ocorre basicamente por conta do despejo de esgoto e produtos químicos no rio.

Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil afirmaram que não é possível saber exatamente quando essas plantas surgiram no rio, mas que elas se alastraram de forma surpreendente por conta da contaminação e da diminuição da vazão.

"Essas plantas já estão há bastante tempo no São Francisco, mas agora estão descontroladas", alerta o coordenador da Expedição do São Francisco e vice-coordenador do Comitê Científico de Bacias Hidrográficas do Nordeste, Emerson Soares.

Segundo ele, esse aumento é resultado do acúmulo de poluentes, fertilizantes, agrotóxicos e esgoto doméstico.

"Quando o ambiente está equilibrado, elas (as plantas) ocorrem em menor proporção e não causam problemas ao ecossistema. Inclusive elas são importantes na filtragem de nutrientes, servindo de alimento para várias espécies, atuando na fotossíntese e servindo também de abrigo para desova de espécies de peixes e crustáceos", explica.

"Mas em excesso elas trazem problemas para a água que será utilizada para abastecimento e matar a sede de animais, tornando-a imprópria para consumo", acrescenta.

O excesso das plantas já causa problemas a quem navega nas águas, a pescadores e afeta o abastecimento de água em Alagoas.

O rio São Francisco é considerado fundamental para o Nordeste. Sem ele, milhões de pessoas ficariam sem fonte de abastecimento hídrico.

O Velho Chico, como é chamado, corta 507 municípios, de Minas Gerais a Alagoas. A área afetada pela proliferação das plantas é a região conhecida como baixo São Francisco, que vai de Paulo Afonso (BA) até a foz, em Alagoas, com um total 214 km de extensão.

Comunidades sem água

Pescadores da região foram chamados para retirar plantas do rio
Pescadores da região foram chamados para retirar plantas do rio
Foto: Companhia de Saneamento de Alagoas / BBC News Brasil

Na semana passada, a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) perdeu uma das duas bombas que fazem abastecimento da Bacia Leiteira, em Pão de Açúcar. Ela queimou devido ao grande número de elódeas. O abastecimento humano em 19 municípios foi comprometido.

O coordenador de Produção e Distribuição da Unidade de Negócio Bacia Leiteira da Casal, Erickson Dantas, diz que a empresa está preocupada com as plantas, já que a quebra do motor comprometeu 50% do fornecimento. Ao todo, segundo ele, o suprimento total chega a 200 mil pessoas no sertão alagoano.

"Nós temos o maior sistema coletivo do Estado, mas há apenas um ponto de captação para abastecer todos estes municípios. Se a captação para, o abastecimento também é paralisado", diz.

O coordenador conta que um motor reserva foi colocado para resolver o problema, mas admite que, se o problema se repetir, os municípios podem ficar sem água.

"De uns dias pra cá estamos tendo obstruções. Percebemos que a Chesf (companhia de eletricidade) está liberando mais água (das represas), e isso faz com que as plantas aquáticas, que ficam acima da captação, desçam. Ontem (quinta-feira, 9) precisamos parar três vezes para fazer a intervenção e fazer a limpeza", comenta.

A vazão citada por Dantas é controlada pela Chesf, que reduz ou aumenta de acordo com a quantidade de água armazenada nos reservatórios de Três Marias (MG), Sobradinho (BA) e Itaparica (BA/PE).

Desde 2012, com as reiteradas estiagens, a vazão passou por uma série de reduções a fim de garantir que nenhum deles chegasse ao volume morto — o que causaria problemas na geração de energia elétrica.

Para amenizar o problema, pescadores da região foram contratados para retirar as plantas do local. Entretanto, um dia após a limpeza, as plantas ressurgiram.

"Já aconteceu de cancelarmos a cobrança aos usuários porque não conseguimos abastecer uma cidade por esse problema. Ou seja, são muitos prejuízos causados ", afirma Dantas.

A Casal agora está elaborando um plano para fazer a contenção das plantas, para que não se aproximem das bombas. "Mas ainda é preciso que exista um estudo", afirma.

Mudança de padrões

A bióloga marinha e professora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Élica Guedes, explica que um dos fatores que está causando a proliferação é a mudança dos padrões físico-químicos da água. A preocupação da especialista é com a qualidade da água.

Pesca e navegação foram afetados com a quantidade de plantas no rio São Francisco
Pesca e navegação foram afetados com a quantidade de plantas no rio São Francisco
Foto: Companhia de Saneamento de Alagoas / BBC News Brasil

"O desenvolvimento em excesso (das plantas) influencia também na qualidade da água. Elas tendem a retirar oxigênio no seu processo de desenvolvimento, e isso afeta o desenvolvimento de outros organismos presentes na água: microalgas, zooplancton, peixes, entre outros", explica.

Para minimizar o problema, Guedes diz que é preciso evitar derramamento de produtos químicos na água, que podem ter origem em vários pontos. "Um deles são as plantações nas margens dos rios que utilizam agrotóxicos e são lançados na água. Até mesmo máquinas das usinas que utilizam óleos para o funcionamento também geram resíduos", explicou.

É preciso saneamento

O presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Anivaldo Miranda, disse à BBC News Brasil que o órgão está tomando medidas para atenuar o problema. Um deles é a retirada das plantas do ponto de captação da água para o abastecimento.

"A partir daí a corrente vai levá-las, diminuindo a concentração no ponto mais crítico. Se houver necessidade, outras medidas serão adotadas seja pelos municípios ou pelos órgãos ambientais de Sergipe e Alagoas", justificou Anivaldo.

Ele também afirma que uma solução definitiva só será alcançada com a construção de redes de coleta e tratamento de esgoto das cidades ribeirinhas, além da recomposição das matas ciliares. Hoje, a maioria das cidades na beira do rio joga seus esgotos no rio sem tratamento.

Uma das medidas é a retirada das plantas do ponto de captação da água para o abastecimento
Uma das medidas é a retirada das plantas do ponto de captação da água para o abastecimento
Foto: BBC News Brasil

"O Comitê já faz a sua parte: entregou a todas as prefeituras ribeirinhas do baixo São Francisco os seus respectivos planos municipais de saneamento, que configuram o primeiro passo para que possam se candidatar a receber recursos federais para obras. Só o governo federal é quem tem escala de recursos para fazer os projetos e as obras de saneamento, principalmente a coleta e tratamento dos esgotos", finalizou Miranda.

Pesca e navegação afetados

O ambientalista Antônio Jackson Borges navega no São Francisco há décadas e disse que é evidente o aumento no número de plantas nos últimos meses. "Elas enrolam nas hélices e nos obrigam a ter que fazer uma limpeza, travando até o motor", conta.

A pesca, diz, está prejudicada, já que as redes ficam mais pesadas. "As baronesas estão com um processo de proliferação muito rápido e até assustador. Em Paulo Afonso, na prainha, simplesmente ninguém via a água, totalmente coberta por essa espécie, que reduziu a produção pesqueira de 400 toneladas para 200", completa.

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