Como os 57 deputados investigados na Lava Jato pretendem votar sobre julgamento de Temer
Voto para acatar ou não denúncia contra presidente parece dividir investigados; analista diz que 'cálculo' de parlamentares pode estar mudando, porque governo não conseguiu 'estancar a sangria' e 'custo político de apoiar Temer está mais oneroso'.
Quando Dilma Rousseff teve seu processo de impeachment analisado pelo Congresso, 80% dos deputados federais que estavam sendo investigados pela Operação Lava Jato votaram contra a petista.
Pouco mais de um ano depois, a Lava Jato parece ter perdido peso no cálculo dos deputados sobre o possível afastamento de outro presidente da República.
A partir de um levantamento do jornal O Globo sobre como cada deputado diz que votará no pedido da Procuradoria Geral da República para que Temer seja julgado por corrupção, a BBC Brasil identificou quais deles são investigados na Lava Jato.
Entre os 165 deputados que disseram ao jornal que votarão pela aceitação da denúncia contra Temer, 16 são alvos de inquéritos na operação.
O número supera o total de deputados investigados que anunciaram voto contrário à denúncia: 11. Ao todo, 67 deputados disseram ao Globo que votarão contra a denúncia.
A maioria dos 57 deputados investigados (53%) não respondeu como pretende votar - entre eles, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que assumiria em caso de afastamento de Temer.
Para que a denúncia contra o presidente prossiga, são necessários os votos de 342 deputados (dois terços do total). Temer barra a iniciativa se a soma de abstenções e votos a seu favor alcançar 172.
Se a Câmara votar pela aceitação da denúncia e o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir julgar Temer, ele será afastado por até seis meses, prazo para a conclusão do julgamento.
Maia assumiria nesse período e teria de convocar eleições indiretas caso o STF condene o presidente.
'Estancar a sangria'
A aparente dissociação entre os votos dos deputados e seu envolvimento na Lava Jato pode indicar que os parlamentares vêm perdendo a esperança de conseguir barrar a operação, diz Bruno Brandão, diretor no Brasil da ONG Transparência Internacional.
Ele lembra que, na véspera do impeachment de Dilma, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) foi gravado em conversa com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado defendendo "mudar o governo para poder estancar essa sangria" atribuída à Lava Jato.
Para Brandão, muitos congressistas apoiaram o impeachment apostando nessa mesma tese.
"Mas agora talvez o cálculo esteja mudando, porque o governo não conseguiu estancar a sangria e o custo político de apoiar Temer está mais oneroso", afirma.
Segundo uma pesquisa do Datafolha feita no fim de junho, só 7% dos brasileiros avaliam o governo Temer como bom ou ótimo. Já os que consideram a gestão ruim ou péssima somam 69%.
Lava Jato avança no Congresso
De fato, desde a posse de Temer, a Lava Jato avançou ainda mais sobre o Congresso - o que, para Brandão, revela que a Polícia Federal e o Ministério Público "se mostraram independentes o suficiente para resistir às tentativas de sabotagem".
Quando o impeachment de Dilma foi votado, 23 deputados federais eram investigados pela operação. Hoje são 57.
Antes o PP respondia pela ampla maioria dos deputados investigados: 17.
O partido segue na liderança do ranking, com 22 deputados investigados, mas outras siglas ganharam espaço na lista, como PT (12), PSDB (4), DEM (4) e PMDB (4).
O avanço da Lava Jato entre congressistas do PT, maior partido de oposição ao governo, ajuda a explicar o alto número de votos anti-Temer entre os deputados na mira da operação.
Todos os deputados petistas investigados na Lava Jato disseram que votarão contra o presidente, enquanto grande parte dos investigados de outras siglas ainda não manifestaram sua posição.
Medo de 2018
Para Brandão, da Transparência Internacional, muitos congressistas da base governista relutam em apoiar Temer com medo de serem contaminados por sua impopularidade e punidos nas urnas em 2018.
Para esses congressistas, diz Brandão, a substituição de Temer por Rodrigo Maia pode parecer vantajosa, pois traria alguma renovação sem alterar a essência do governo.
Ele diz que muitos parlamentares da base temem que, diante da fragilização de Temer, cresçam as cobranças por eleições diretas para substituí-lo, o que poderia abrir o caminho para um candidato da oposição.
A troca de Temer por Maia, segundo Brandão, "reduziria esse risco".
"Maia é uma opção que não tem o mesmo custo político que a defesa de Temer e mitigaria o risco da volta de um governo petista."
Mas a estratégia pode não funcionar a depender da reação popular, diz Brandão.
"A constatação de que seria mais do mesmo com Maia reforçaria o anseio da sociedade pela convocação de eleições."
No fim das contas, ele diz que muitos deputados decidirão sobre o destino de Temer "em modo de sobrevivência e autodefesa", calculando qual cenário lhes será mais vantajoso.
Para Brandão, o pêndulo tem se movido na direção de Maia à medida que líderes de partidos governistas sinalizam que poderiam apoiá-lo.
Na quinta, o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), disse que Maia tem condições de "juntar os partidos ao redor com um mínimo de estabilidade para o país".
"O que atrai apoio não é o poder, é a perspectiva do poder", diz Brandão.
"Já se percebe uma movimentação clara entre os políticos para se cacifar com quem poderá ser o próximo presidente."