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Como premiê da Suécia acabou envolvido em investigação contra Dilma e Lula

Stefan Löfven depôs nesta sexta-feira em Estocolmo a pedido da defesa de Lula, acusado na Operação Zelotes por ter supostamente intercedido irregularmente pela escolha dos caças suecos Gripen pela Força Aérea Brasileira.

8 jun 2018 - 15h29
(atualizado às 16h20)
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Stefan Löfven depôs a pedido da defesa de Lula, investigado no âmbito da Operação Zelotes pela compra dos caças suecos Gripen
Stefan Löfven depôs a pedido da defesa de Lula, investigado no âmbito da Operação Zelotes pela compra dos caças suecos Gripen
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Cinco anos após o anúncio da compra dos caças suecos Gripen NG pelo Brasil, o primeiro-ministro da Suécia e os principais executivos da empresa sueca Saab, fabricante dos aviões, compareceram nesta sexta-feira ao Tribunal Distrital de Estocolmo para depor no âmbito da operação brasileira Zelotes - em processo que acusa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de tráfico de influência nas negociações que levaram à aquisição de 36 aeronaves suecas por US$ 5,4 bilhões em 2014.

Não há acusações de irregularidades contra o governo sueco ou a Saab. O premiê Stefan Löfven e os executivos da empresa foram chamados a depor pelo Ministério da Justiça do Brasil a pedido da defesa de Lula, que nega as acusações e está preso em Curitiba desde 7 de abril em decorrência de outro processo, relacionado ao tríplex do Guarujá.

"Não tenho conhecimento sobre qualquer tipo de irregularidade que possa supostamente ter ocorrido no processo de venda dos caças Gripen", disse à BBC News Brasil o primeiro-ministro sueco nesta sexta-feira, antes de entrar na sala de audiências da corte.

A presença de Löfven no tribunal foi destaque na imprensa sueca: o premiê foi chamado a depor em plena campanha política para as eleições gerais de setembro no país.

"Em uma sociedade, todos devem cumprir o seu dever. Quando se é chamado a prestar depoimento em um tribunal, portanto, deve-se depor. Espero que meu testemunho possa ajudar a esclarecer os fatos da melhor maneira possível", disse o premiê à reportagem.

Na ação penal que tramita em Brasília a partir das investigações da Zelotes, Lula é acusado de ter praticado tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa nas negociações para a aquisição dos caças, e também para a prorrogação de incentivos fiscais destinados a montadoras de veículos por meio da Medida Provisória 627.

Brasil adquiriu 36 caças suecos Gripen por US$ 5,4 bi
Brasil adquiriu 36 caças suecos Gripen por US$ 5,4 bi
Foto: SAABGROUP / BBC News Brasil

A defesa de Lula afirma que as acusações se baseiam em uma "mirabolante e inconsequente teoria sem provas", e que o ex-presidente está sendo alvo de perseguição política.

A denúncia do Ministério Público Federal (MPF) atinge Lula, seu filho Luís Cláudio e o escritório do casal de lobistas brasileiros Mauro Marcondes e Cristina Mautoni, o M&M (Marcondes e Mautoni Empreendimentos) - que foi contratado pela Saab para representá-la no Brasil.

O depoimento do primeiro-ministro sueco no tribunal durou 12 minutos. Sob juramento, Löfven respondeu de forma lacônica - apenas "sim" ou "não" - às oito perguntas encaminhadas à Corte sueca pela defesa de Lula.

Disse que não se encontrou com Lula ou Dilma para tratar da escolha do caça e que desconhecia qualquer "influência ilegal, imoral ou indevida" dos ex-presidentes brasileiros nas negociações, ainda que tenha confirmado ter "participado, de alguma forma, da campanha da Saab para que o Gripen fosse o escolhido pelo governo brasileiro".

A escolha dos caças

As negociações para a renovação da frota da Força Aérea Brasileira começaram no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), quando Löfven ainda trabalhava na poderosa organização sindical sueca IF Metall - que ele viria a comandar a partir de 2006. Ali, o atual premiê participou dos esforços da campanha pela venda dos caças Gripen ao Brasil.

"Em seu papel de chefe de uma entidade sindical, era natural Stefan Löfven apoiar as exportações suecas", argumentou a porta-voz Ingela Nilsson, em declarações à agência Reuters. "Isso inclui o caso do Gripen."

Na presidência do Partido Social Democrata sueco, cargo que passou a ocupar em 2012, Löfven teria escrito uma carta a Lula, segundo o MPF, pedindo que ele intercedesse junto a Dilma em favor da escolha dos caças suecos.

Stefan Löfven ao chegar à Corte em Estocolmo; premiê negou saber de qualquer irregularidade na escolha dos caças
Stefan Löfven ao chegar à Corte em Estocolmo; premiê negou saber de qualquer irregularidade na escolha dos caças
Foto: BBC News Brasil

"Como líder do Partido Social Democrata na época, é claro que meu dever era apoiar aquele que era um importante negócio de exportação para a Suécia", disse Löfven à BBC News Brasil no tribunal, sem mencionar a existência da carta. "Qualquer negociação que envolva exportações suecas deve ser conduzida de maneira correta, e naturalmente é minha função contribuir para fomentar a indústria sueca e a criação de empregos no país. Se esclarecimentos são necessários, é claro que devo contribuir como testemunha."

Ainda segundo os procuradores do MPF, o então líder partidário Löfven teria se reunido com Lula e Dilma para tratar do assunto durante o funeral do ex-líder sul-africano Nelson Mandela, na África do Sul, em 2013. A alegação, negada por Löfven durante seu depoimento na Corte sueca, também é rejeitada pelos ex-líderes brasileiros.

Em depoimento em setembro passado, o ex-presidente FHC afirmou não ter presenciado eventuais encontros entre Lula, Dilma e Löfven na ocasião do funeral de Mandela.

Decisão

O anúncio da escolha dos caças Gripen pelo Brasil ocorreu nove dias após o funeral de Mandela, em dezembro de 2013. Na concorrência para fornecer caças supersônicos ao governo brasileiro, os suecos venceram o caça F-18 Super Hornet, da norte-americana Boeing, e o Rafale, da francesa Dassault.

Um ano depois, em 2014, com a vitória da oposição social-democrata sobre a aliança governista de centro-direita, Löfven tornou-se primeiro-ministro da Suécia.

Sobre as acusações contra Lula, o primeiro-ministro sueco não quis se pronunciar.

"Essa é uma questão que diz respeito naturalmente ao Brasil, e não farei comentários", disse Löfven à BBC News Brasil diante da sala de audiências do tribunal da capital sueca.

A fim de reunir esclarecimentos sobre o longo processo de negociações internacionais para a renovação da frota de caças da Força Aérea Brasileira, os advogados de Lula também convocaram como testemunhas da defesa os ex-presidentes da França François Hollande e Nicolas Sarkozy, além de Fernando Henrique Cardoso e Dilma Rousseff.

Dilma e Lula são investigados na Zelotes, que também trata da suposta compra de Medidas Provisórias
Dilma e Lula são investigados na Zelotes, que também trata da suposta compra de Medidas Provisórias
Foto: Ricardo Stuckert / Instituto Lula / BBC News Brasil

Nova fábrica do Gripen no Brasil

Também compareceu ao tribunal o próprio presidente do conselho administrativo da Saab, Marcus Wallenberg - um dos líderes da poderosa família sueca que controla um império industrial bilionário no país.

A direção da Saab na Suécia não quis conceder entrevistas. Mas, em nota enviada à reportagem da BBC News Brasil, diz que "a posição da empresa é a de sempre cooperar com as autoridades. A Saab acolhe favoravelmente as investigações que vêm sendo conduzidas no Brasil pelas autoridades judiciais. O Brasil é um cliente altamente valorizado por nós e com o qual mantemos uma relação duradoura, especialmente no programa em curso do desenvolvimento do Gripen. (...) Nem a Saab e nem qualquer um de seus funcionários foi ou está sendo acusado de qualquer tipo de irregularidade neste caso".

A Saab destacou ainda a apresentação, no mês passado, das instalações da nova fábrica de aeroestruturas do caça Gripen no Brasil, como parte do projeto de desenvolvimento e construção do avião supersônico no Brasil.

Situada em uma área de aproximadamente 5 mil m² em São Bernardo do Campo, na grande São Paulo, a Saab Aeronáutica Montagens (SAM) vai produzir seis segmentos para os caças brasileiros Gripen adquiridos pela Força Aérea Brasileira - o cone de cauda, os freios aerodinâmicos, o caixão das asas, a fuselagem traseira e a fuselagem dianteira para a versão monoposto (um assento) e a versão biposto (dois assentos).

"Estamos transferindo conhecimento e capacidade de produção de aeroestruturas complexas para o Brasil, cumprindo nosso acordo", afirma Mikael Franzén, chefe da unidade de negócios Gripen Brasil.

A SAM vai começar as operações em 2020, com cerca de 200 funcionários, e fará parte da cadeia de fornecimento global da Saab.

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O contrato da Saab com o governo brasileiro para o desenvolvimento e a produção de 36 caças Gripen entrou em vigor em setembro de 2015. Em 2016, a Saab inaugurou em Gavião Peixoto, no Estado de São Paulo, o Centro de Projetos e Desenvolvimento do Gripen (GDDN), que é o hub de desenvolvimento tecnológico do Gripen no Brasil.

Até 2024, mais de 350 profissionais brasileiros, entre engenheiros, operadores, técnicos e pilotos das empresas parceiras da Saab e da Força Aérea Brasileira, participarão de cursos e treinamento on-the-job na Suécia - 140 brasileiros já concluíram o treinamento na sede da Saab, na cidade de Linköping, e trabalham atualmente no GDDN. O programa de transferência de tecnologia é composto por mais de 50 projetos-chave, com duração de até 24 meses.

A previsão é de que a entrega dos caças Gripen para a Força Aérea Brasileira será realizada entre 2019 e 2024.

A denúncia

Lula, seu filho Luís Cláudio e o casal de lobistas Mauro Marcondes e Cristina Mautoni foram denunciados pelo MPF em dezembro do ano passado. Todos são acusados de supostas práticas irregulares que teriam influenciado o contrato de compra dos caças Gripen, e também a edição da medida provisória 627, que prorrogou incentivos fiscais a montadoras de veículos, supostamente em troca de repasses a Luis Cláudio.

Segundo o MPF, a empresa de Marcondes representava, no caso das isenções fiscais, duas grandes montadoras, e teria oferecido R$ 6 milhões a Lula, quantia que seria destinada ao financiamento de campanhas do PT. As duas medidas foram tomadas em 2013, quando Lula já era ex-presidente.

Os procuradores afirmam que a denúncia está baseada em uma série de mensagens e documentos que apontam que teria havido encontros entre os acusados para tratar dos dois assuntos, e que uma empresa de Luís Cláudio recebeu R$ 2,5 milhões do lobista Mauro Marcondes, representante das empresas interessadas nas decisões, como remuneração pelo apoio de Lula. A defesa do ex-presidente nega.

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