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Covid: o risco de viagens aos EUA em meio a novo pico de mortes

Com aumento nas médias de casos e mortes relacionadas ao coronavírus, EUA abrem fronteiras para viajantes de várias partes do mundo. Entenda como isso pode influenciar na crise sanitária e quais medidas preventivas deveriam ser reforçadas, segundo epidemiologistas.

21 set 2021 - 06h53
(atualizado às 11h39)
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A partir de novembro, cidadãos brasileiros e de outras 32 nacionalidades não precisarão fazer quarentena para entrar nos EUA
A partir de novembro, cidadãos brasileiros e de outras 32 nacionalidades não precisarão fazer quarentena para entrar nos EUA
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Após um ano e meio de restrições, o governo dos Estados Unidos anunciou que permitirá novamente a entrada de viajantes que estejam completamente vacinados contra a covid-19.

A medida, que vale a partir de novembro, vai reabrir as fronteiras americanas para cidadãos de 33 países, incluindo o Brasil.

Até o momento, esses indivíduos precisavam fazer uma quarentena obrigatória de 14 dias em uma terceira nação antes de serem admitidos nos EUA.

Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil entendem que essa liberação é um passo natural e as restrições em voga não faziam mais tanto sentido assim. Mas eles também apontam uma série de precauções que devem ser tomadas pelas autoridades sanitárias e pelos próprios viajantes para diminuir o risco de ter covid-19 por lá e de criar novas cadeias de transmissão no Brasil após a volta da viagem.

Essa preocupação se dá principalmente pelo atual estágio da pandemia nos EUA, com médias móveis de novos casos e mortes em ascensão nas últimas semanas (detalhes abaixo).

Os números, inclusive, estão bem acima do que é registrado atualmente no Brasil, que apresenta quedas constantes nas infecções e nos óbitos relacionados ao coronavírus desde agosto.

"É preciso analisar esse cenário externo com cuidado, pois muitos brasileiros podem ir e voltar dos Estados Unidos num curto espaço de tempo, o que aumenta o risco de retornar infectado", diz o epidemiologista Paulo Petry, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Decisão americana

O anúncio de alívio nas restrições de viagem foi feito nesta segunda-feira (20/9) por Jeff Zients, coordenador de resposta ao coronavírus da Casa Branca.

"Cidadãos estrangeiros vindo aos Estados Unidos deverão estar totalmente vacinados e apresentar prova disso antes de embarcar em um avião com destino aos EUA. As vacinas são a melhor linha de defesa, a melhor ferramenta que temos em nosso arsenal para manter as pessoas seguras", afirmou Zients.

As medidas passam a valer a partir de novembro, mas ainda não foi definido se todas as vacinas serão consideradas na hora do embarque — por ora, as autoridades regulatórias americanas só aprovaram os imunizantes de Pfizer/BioNTech, Moderna e Janssen.

Essa questão será definida pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, mas existe a possibilidade de que outros produtos que já receberam a chancela da Organização Mundial da Saúde (OMS) também sejam aceitos, como é o caso da CoronaVac e da vacina de AstraZeneca e Universidade de Oxford.

Ambas são amplamente utilizadas na campanha de imunização contra a covid-19 em curso no Brasil.

A epidemiologista Ethel Maciel, professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), avalia que a política americana atual, de exigir que viajantes façam uma quarentena de 14 dias num terceiro país, não faz mais sentido.

"Muitas vezes, esse período de isolamento acontecia num lugar que estava com uma situação de momento bem pior que a nossa", conta. "De certa maneira, a retirada das restrições reconhece o esforço de nossa campanha de vacinação e a melhora recente nos indicadores da pandemia por aqui."

Vacinação nos Estados Unidos estacionou e encontra resistência em alguns grupos, influenciados por movimentos antivacina
Vacinação nos Estados Unidos estacionou e encontra resistência em alguns grupos, influenciados por movimentos antivacina
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Os riscos

Do ponto de vista epidemiológico, o momento dos Estados Unidos não é dos melhores. Após uma queda importante na média móvel semanal de casos e mortes por covid-19 entre abril e julho, esses indicadores voltaram a crescer em agosto e setembro.

Atualmente, o país registra uma média móvel de 148 mil novas infecções e 2 mil óbitos relacionados ao coronavírus.

Em comparação, as curvas brasileiras seguem uma tendência contrária: após uma segunda onda muito intensa entre março e junho, é possível notar uma queda constante nas estatísticas da covid-19 por aqui.

Os números mais recentes indicam uma média móvel de 34 mil diagnósticos e 557 mortes pela doença.

Ou seja: as estatísticas de momento dos Estados Unidos estão quatro vezes mais elevadas em relação às brasileiras.

Esses e outros dados vêm do monitoramento conduzido pela Universidade Johns Hopkins.

"Um dos aspectos que ajuda a entender essa diferença está no ritmo de vacinação. Após um avanço muito rápido, os EUA praticamente estacionaram na campanha. Isso tem a ver com a rejeição às doses e à atuação dos movimentos antivacina por lá", interpreta Petry.

Cerca de 55% dos americanos estão com a proteção completa e praticamente 65% tomaram pelo menos a primeira dose.

No Brasil, 38% concluíram o esquema vacinal preconizado e 69% dos indivíduos já receberam a primeira dose.

E as variantes?

Um segundo aspecto que pode levantar alguma preocupação é o risco de algum viajante se infectar durante a viagem para os Estados Unidos e trazer de volta alguma variante inédita do coronavírus.

Essa nova versão poderia se espalhar pelo país e levar a um aumento de casos e óbitos.

"É preciso ter em mente, porém, que a principal variante em circulação por lá é a Delta, que já tem transmissão comunitária no nosso país", diz Maciel.

Em todo caso, essa reabertura das fronteiras poderia servir como justificativa para que o Brasil reforçasse seus programas de vigilância genômica.

Assim, seria possível detectar novas mutações virais antes que elas se espalhassem por alguma cidade ou Estado.

"Atualmente, a pandemia nos Estados Unidos afeta principalmente os indivíduos que não foram vacinados. E sempre existe a chance de surgir uma nova variante desconhecida", chama atenção a epidemiologista.

Como se proteger?

Embora ainda não existam diretrizes claras sobre o assunto, o primeiro passo para viajar aos Estados Unidos a partir de novembro será tomar as duas doses com 14 dias de antecedência do voo e possuir o comprovante da vacinação na hora do check in.

Outra exigência que continuará a valer é o resultado negativo de um teste PCR (que detecta a presença do coronavírus no organismo). O exame deverá ser feito nos três dias anteriores e será repetido em terras americanas.

Ainda não está claro se todas as vacinas serão aceitas para entrar nos Estados Unidos. Essa questão deve ser definida nas próximas semanas
Ainda não está claro se todas as vacinas serão aceitas para entrar nos Estados Unidos. Essa questão deve ser definida nas próximas semanas
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

E, mesmo com essa primeira liberação feita no aeroporto, os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil reforçam a necessidade de se cuidar durante todo o período de viagem.

"É preciso ter em mente que, embora vacinada, a pessoa ainda pode se infectar com o coronavírus e transmiti-lo para seus contatos próximos", lembra Petry.

"Os viajantes devem usar máscaras de boa qualidade, especialmente em locais fechados, e evitar aglomerações", recomenda Maciel.

"Outro ponto importante é se atualizar sobre a situação da covid-19 específica do local para onde você vai. Há Estados que atravessam um momento bem pior do que os outros, como é o caso de Alabama e Flórida", completa.

Proteção coletiva

Os epidemiologistas também entendem que o futuro aumento do fluxo de passageiros voltando dos Estados Unidos para o Brasil exigirá um controle ainda melhor das fronteiras e dos aeroportos internacionais.

Atualmente, todos os brasileiros ou estrangeiros que chegam ao país precisam preencher uma Declaração de Saúde do Viajante, disponível no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e apresentar um teste PCR com resultado negativo que tenha sido feito nas 72 horas antes do embarque.

Para indivíduos que vêm de alguns países, como o Reino Unido, também é preconizada uma quarentena após o desembarque.

Mas alguns episódios recentes, como a entrada sem restrições de jogadores de futebol brasileiros e argentinos vindos da Inglaterra, mostrou como esse sistema pode apresentar falhas importantes.

"Precisamos melhorar o nosso controle de entrada nos aeroportos. Isso é algo que o Brasil pecou nos últimos meses e continua pecando", critica Maciel.

"A fiscalização precisa ser aprimorada, até para impedir a entrada de pessoas infectadas e a possível introdução de novas variantes no país, coisa que não conseguimos fazer até agora", finaliza.

Em nota, o Itamaraty afirma que "com a significativa melhora do quadro epidemiológico no país e o avanço acelerado do processo de vacinação, tem-se verificado que um número crescente de países passou a flexibilizar seus requisitos de entrada de brasileiros".

"O Itamaraty e seus postos no exterior seguem trabalhando em múltiplas frentes, conjuntamente com outros órgãos públicos, em esforço para permitir retomada segura do fluxo de pessoas", diz o órgão.

A BBC News Brasil entrou em contato com a Anvisa e o Ministério da Saúde, para comentar sobre a recente decisão dos Estados Unidos e como ela afeta o país, mas não houve respostas até o fechamento desta reportagem.

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