De criação na ditadura até rompimento com governo: o PMDB em 10 capítulos
"Estamos vivendo um momento histórico", disse o senador Romero Jucá (PMDB-RR) durante o anúncio da saída do maior partido do País da base aliada do governo, nesta terça-feira.
A decisão se junta a outros nove episódios que se destacam na trajetória do partido que pode, pela segunda vez, vir a governar o Brasil por meio da ascensão de um vice.
Caso o Congresso aprove nas próximas semanas a abertura de um processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, ela será afastada do cargo, e o comando do país passará às mãos de Michel Temer, vice-presidente. E se for condenada após eventual julgamento do Senado, o peemedebista assume definitivamente.
O partido, que chegou pela primeira vez ao palácio do Planalto em 1985, com a posse do vice de Tancredo Neves, José Sarney, nunca elegeu diretamente um presidente da República. No entanto, sua forte presença regional sempre lhe garantiu grandes bancadas no Congresso, o que o torna um aliado fundamental para qualquer outro partido conseguir governar.
Veja os principais momentos da história do PMDB:
1. Ditadura
O PMDB nasce como MDB (Movimento Democrático Brasileiro) formalmente em março de 1966, quando o regime militar instaura o bipartidarismo no Brasil – a Arena era o partido governista e o MDB, a oposição consentida. Dessa forma, predominavam no partido bandeiras democráticas e liberais, como voto direto e liberdades civis.
2. À esquerda
Em 1979, com o fim o bipartidarismo, a sigla ganhou seu nome atual – Partido do Movimento Democrático Brasileiro. "O PMDB surge em 1979 com uma composição muito de centro-esquerda. Só que vai se transformando ao longo dos anos", observa o cientista político Rafael Moreira, pesquisador da USP.
Ao longo da década de 80, quadros com perfis mais ideológicos vão saindo do partido para ingressar em siglas de esquerda que voltavam à legalidade, como PCB, PCdoB e PSB. Depois, em 1988, outro grupo de progressistas sairia do PMDB e fundaria o PSDB – entre eles estão Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Geraldo Alckmin.
3. Metamorfose
Por outro lado, o PMDB vai atraindo cada vez mais políticos "pragmáticos", sem linha ideológica clara, muitos deles egressos da Arena (transformado em PDS) que buscavam distanciar-se da ditadura conforme o regime ruía.
Um evento importante desse processo, destaca Moreira, é a incorporação do Partido Popular (PP) pelo PMDB em 1982. O PP foi criado com o fim do bipartidarismo, incentivado pelo próprio regime militar, para ser um partido mais ao centro, reunindo tanto políticos vindos da Arena como atores mais conservadores vindo do PMDB, caso de Tancredo Neves. O Partido Popular acabou não funcionando e, ao ser incorporado ao PMDB, trouxe antigos apoiadores do regime militar para dentro da sigla.
4. José Sarney
Partido chega ao poder pela primeira vez indiretamente com a posse de José Sarney, vice do falecido Tancredo Neves, em 1985.
Sarney fora umas das principais lideranças do Arena. Ele entrou no PMDB para ser vice-presidente da chapa de Tancredo Neves, após ter perdido a indicação de seu partido para Paulo Maluf. A chapa peemedebista saiu vitoriosa em eleição indireta pelo Congresso Nacional – com a morte do presidente eleito pouco antes da posse, o líder maranhense foi empossado no cargo.
5. Congelamento de preços
O fracasso do governo Sarney (1985-1990), principalmente no plano econômico, criaria um legado de derrotas em eleições presidenciais seguintes. Em 1986, embalado pelo sucesso momentâneo do Plano Cruzado, que congelou os preços para estancar a inflação, o partido elegeu 22 dos 23 governadores.
Logo após as eleições estaduais, o congelamento acabou, levando a uma disparada dos preços e da insatisfação popular. A vitória nas urnas do partido foi vista por muitos eleitores como "estelionato eleitoral".
6. Derrotas nas urnas
Apesar de ser o maior partido do país, o PMDB não lança candidato a presidente desde 1994, quando Orestes Quércia recebeu apenas 1,24% dos votos, ficando em sexto lugar. Em 1989, Ulysses Guimarães – o "pai da Constituinte" – levou 4,7% dos votos, amargando o sétimo lugar na disputa.
Para analistas políticos, essas derrotas levaram o partido a assumir uma outra estratégia de poder: buscar eleger grandes bancadas no Congresso, o que torna seu apoio ao Palácio do Planalto essencial para a governabilidade, seja qual for o partido no comando do país.
A falta de uma unidade ideológica dentro do PMDB, após sua metamorfose, também explica a dificuldade de formar união em torno de uma proposta de governo e e de uma candidatura nacional.
7. Itamar Franco
O PMDB não participou do início do governo Itamar Franco (este fora filiado ao MDB nos anos 1960 e 70, mas se desligou da sigla em 1980). Itamar assumiu definitivamente a Presidência em dezembro de 1992, após o impeachment de Fernando Collor. O partido era, inclusive, crítico ao novo governo. Itamar, no entanto, voltou à sigla posteriormente.
8. Mensalão
O PMDB amplia sua participação no governo Lula (2003-2010) após o escândalo conhecido como mensalão, relacionado à compra de votos de parlamentares e que fragilizou a base governista no Congresso.
Inicialmente, o apoio do partido ao governo petista era parcial, sendo liderada pelos senadores José Sarney e Renan Calheiros. Com isso, o PMDB ganhou dois ministérios ainda em 2004. Após o escândalo do mensalão em 2005, porém, o PT buscou com mais ênfase o apoio peemedebista para conseguir montar uma base de apoio mais sólida, afirmam cientistas políticos como Antônio Lavareda (UFPE) e Geraldo Tadeu Monteiro (Uerj).
Após a reeleição de Lula, em 2006, o PMDB entra com mais peso no governo, ganhando seis ministérios. No governo Dilma, passa a ocupar também a vice-presidência, com Michel Temer.
9. Lava Jato
Enfraquecido por outro escândalo, desta vez relacionado às investigações da Lava Jato sobre o desvio de recursos da Petrobras, o governo do PT perde apoio de seu principal parceiro da base aliada.
Isso ocorre apesar de três das principais figuras do partidos terem sido citadas de alguma forma nas investigações: o vice, Michel Temer, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o presidente do Senado, Renan Calheiros.
10. Investigados e condenados
Como a maioria dos grandes partidos brasileiros, o PMDB abriga políticos investigados, e até mesmo já condenados, por crimes. Segundo levantamento do site Congresso em Foco, havia em dezembro quase 60 parlamentares respondendo a processos penais no Supremo Tribunal Federal, sendo 16 peemedebistas.
Eles respondem a acusações de crime eleitoral, fraude em licitação, peculato, entre outros. Cunha, o mais recente a entrar nessa lista, é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em uma operação de venda de sondas para a Petrobras.
Caso mais rumoroso de peemedebista já condenado é o do ex-deputado federal Natan Donadon, que recebeu em 2010 uma sentença de mais de 13 anos por ter liderado um esquema que desviou R$ 8,4 milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia. Após o STF rejeitar seus recursos, ele foi preso em 2014. Apenas em 2013 o PMDB o expulsou.