Hacker diz que Bolsonaro garantiu indulto caso fosse preso por tentar invadir urnas
Em depoimento para CPMI, nesta quinta, Walter Delgatti Neto afirmou que ex-presidente perguntou se ele conseguiria acessar sistema das urnas
O hacker Walter Delgatti Neto afirmou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) garantiu que lhe concederia um indulto, caso fosse detido ou condenado por sua participação na tentativa de invadir o sistema das urnas eletrônicas. As declarações foram dadas nesta quinta-feira, 17, durante depoimento à CPMI do 8 de janeiro.
De acordo com o hacker, essa promessa foi feita em uma reunião realizada no Palácio da Alvorada, próximo às eleições do ano passado. Ele foi questionado pela relatora da comissão, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), se recebeu alguma garantia de proteção por parte do ex-presidente.
Delgatti, então, detalhou o que lhe foi prometido.
"Sim, recebi. Inclusive, a ideia ali era que eu receberia um indulto do presidente. Ele havia concedido um indulto a um deputado federal. E como eu estava com o processo da Spoofing à época, e com as cautelares que me proibiam de acessar a internet e trabalhar, eu visava a esse indulto. E foi oferecido no dia", declarou.
Durante essa reunião, que supostamente foi intermediada pela deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), o hacker afirma que o ex-presidente questionou se ele seria capaz de invadir as urnas eletrônicas para testar a integridade dos equipamentos.
"Apareceu a oportunidade da deputada Carla Zambelli, de um encontro com o Bolsonaro, que foi no ano de 2022, antes da campanha. Ele queria que eu autenticasse... autenticasse a lisura das eleições, das urnas. E por ser o presidente da República, eu acabei indo ao encontro. [...] Lembrando que eu estava desemparado, sem emprego, e ofereceram um emprego a mim. Por isso que eu fui até eles", disse.
De acordo com Delgatti, Bolsonaro solicitou que seus assessores o conduzissem a técnicos do Ministério da Defesa, com o propósito de obter auxílio em sua atuação.
O hacker relatou que foi ao Ministério da Defesa acompanhado pelo general Marcelo Câmara, assessor de Bolsonaro. Delgatti afirmou que o militar inicialmente questionou a ideia, porém Bolsonaro teria respondido com a frase "ordem minha, cumpra".
"A ideia era falar sobre as urnas e sobre a eleição, e sobre a lisura das urnas. E a conversa, ela foi bem técnica, até que o presidente me disse, falou assim: 'Olha, a parte técnica eu não entendo, eu irei enviá-lo ao Ministério da Defesa e lá, com os técnicos, você explica tudo isso'", declarou.
O hacker também afirmou que o objetivo era que ele examinasse o código-fonte das urnas eletrônicas. Contudo, os servidores do Ministério da Defesa explicaram que o código estava exclusivamente nas mãos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e somente servidores autorizados teriam acesso a ele.
Dessa forma, conforme relatado por Delgatti, os servidores iam até o TSE e compartilhavam com ele as informações que visualizavam, porém, não tinham permissão para levar consigo a totalidade do código-fonte.
'Ordem do presidente da República'
Delgatti declarou que estava consciente de que estava violando a lei ao interferir no processo eleitoral, mas que tomou essa ação devido a uma suposta "ordem de um presidente da República".
"Sim, eu sabia [que estava fazendo coisas erradas]. Lembrando que era ordem de um presidente da República. [...] Então, eu estava... tanto que eu entrei em contato com a 'Veja' e relatei isso por medo", explicou.
Ele afirmou que o receio surgiu porque ele estava ciente de que estava envolvido em atividades criminosas. Além disso, reiterou que Bolsonaro teria assegurado "indulto em caso de investigação, denúncia, processo ou condenação".
'Se um juiz te prender, mando prender o juiz'
Além da oferta de indulto presidencial, Walter Delgatti alegou que Bolsonaro teria feito a promessa de "prender um juiz" caso ele fosse descoberto em um plano para minar a credibilidade das urnas eletrônicas.
"Ele disse: 'Fique tranquilo, se algum juiz te prender, eu mando prender o juiz' e deu risada", afirmou o hacker.
Tentativa de grampo contra Moraes
Ele relatou que, durante conversas, tomou conhecimento de que pessoas próximas a Bolsonaro já tinham conseguido grampear o ministro Alexandre de Moraes, membro do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
De acordo com Delgatti, nesse encontro, Bolsonaro teria proposto a ideia de que ele, Delgatti Neto, "assumisse a autoria" do grampo.
"Segundo ele [Bolsonaro], eles haviam conseguido um grampo, que era tão esperado à época, do ministro Alexandre de Moraes. Que teria conversas comprometedoras do ministro, e ele precisava que eu assumisse a autoria desse grampo", disse.
'Código-fonte falso'
De acordo com o depoimento do hacker, durante uma reunião com os assessores de campanha de Jair Bolsonaro, ele recebeu a orientação de criar um "código-fonte" falso para dar a impressão de que a urna eletrônica poderia ser vulnerável e suscetível a fraudes.
A sugestão teria sido apresentada pelo marqueteiro Duda Lima durante uma reunião que contou com a presença do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, a deputada Carla Zambelli (PL-SP) e outras pessoas ligadas à parlamentar.
"A segunda ideia era no dia 7 de setembro, eles pegarem uma urna emprestada da OAB, acredito. E que eu colocasse um aplicativo meu lá e mostrasse à população que é possível apertar um voto e sair outro", disse Delgatti.
"Eles queriam que eu fizesse um código-fonte meu, não o oficial do TSE. E nesse código-fonte, eu inserisse essas linhas, que eles chamam de 'código malicioso', porque tem como finalidade enganar, colocar dúvidas na eleição", completou Delgatti.