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Insetos em genitália e éter eram formas de tortura

Animais em genitália, geladeira e éter eram métodos de tortura

10 dez 2014 - 16h25
(atualizado em 11/1/2018 às 15h05)
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Presidente se emocionou ao falar sobre os trabalhos da CNV
Presidente se emocionou ao falar sobre os trabalhos da CNV
Foto: Lúcio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados

Apesar da tortura nunca ter sido reconhecida oficialmente durante a ditadura, os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade (CNV), cujo relatório foi divulgado nesta quarta-feira, identificaram vários indícios de que era uma prática não apenas diseminada como ensinada e estruturada dentro do regime militar. Pelo menos 19 métodos aplicados pelos torturadores foram identificados, inclusive a colocação de insetos nas genitais, além de outras formas de agressão como a colocação de buchas de aço no ânus para choques elétricos, extração de dentes com alicates e outras inúmeras formas de tortura.

Comissão da Verdade: relatório é divulgado na íntegra; leia

Desde o final da década de 50 os militares passaram a ensinar a prática da tortura na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército com base no estudo da guerra revolucionária . Existia até a Medalha Pacificador que recompensava os torturadores “para quem se destacasse no combate contra os terroristas” afirmou em depoimento a CNV o general Rubens Bayma Denys. Segundo relatos de testemunhas, os presos políticos eram utilizados como cobaias em aulas de tortura.

“Servi de cobaia para uma aula de tortura. O professor, diante dos seus alunos, fazia

Presidente Dilma Rousseff ao receber o relatório da Comissão Nacional da Verdade
Presidente Dilma Rousseff ao receber o relatório da Comissão Nacional da Verdade
Foto: Roberto Stuckert Filho / Presidência da República

demonstrações com o meu corpo. Era uma espécie de aula prática, com algumas dicas teóricas. Enquanto eu levava choques elétricos, pendurada no tal do pau de arara, ouvi o professor dizer: ‘essa é a técnica mais eficaz’. Acho que o professor tinha razão. Como comecei a passar mal, a aula foi interrompida e fui levada para a cela. Alguns minutos depois, vários oficiais entraram na cela e pediram para o médico medir minha pressão. As meninas gritavam, imploravam, tentando, em vão, impedir que a aula continuasse. A resposta do médico Amílcar Lobo, diante dos torturadores e de todas nós, foi: “ela ainda aguenta”. E, de fato, a aula continuou”, afirmou Dulce Chaves Pandolfi, em seu depoimento à CEV-RJ, em 28 de maio de 2013.

Saiba quais eram as técnicas de tortura mais usadas pelo militares:

Choque elétrico

Descargas elétricas em várias partes do corpo do torturado, principalmente nas mais sensíveis como o pênis e ânus, nos testículos e no ouvido e também nos dedos dos pés e mãos, na língua etc. As presas políticas costumavam ter os fios introduzidos na vagina e no ânus.

Eram utilizados aparelhos como o magneto (conhecido como maquininha ou Maricota), telefone de campanha, aparelhos de televisão (chamado de Brigitte Bardot), microfone, pianola (que possuía teclas para regular a voltagem) e choques diretos da tomada. Rádios doados pelo governo dos Estados Unidos eram usados, tanto que um dos torturados viu a inscrição “Donated by the People of United of States” (doado pelo povo dos Estados Unidos) na máquina que lhe aplicava as descargas.

Os choques provocavam queimaduras em partes sensíveis e convulsões,  além de micro-hemorragias no cérebro que causam problemas de memória. Muitos morreram durante as sessões.

Cadeira do dragão

Semelhante a uma “cadeira elétrica” é uma poltrona de madeira revestida com folha de zinco, onde o torturado sentava nu, com os pulsos amarrados e com as pernas forçadas para baixo. A corrente atingia todo o corpo, principalmente as nádegas e os testículos. Usavam ainda um balde de metal na cabeça para potencializar o efeito, jogavam água no corpo da vítima e obrigavam a comer sal (para agravar mais o choque).

Palmatória

É uma haste de madeira perfurada e arredondada com perfurações na extremidade. Era usada no omoplata, na planta dos pés e palma das mãos e nádegas. Causava derrames e inchaços impedindo a vítima de caminhar. “Uma palmada ou duas provocavam uma dor penetrante, como picadas de agulhas de crochê, mas, até chegar à Ilha das Flores, Jean Marc jamais tivera medo da palmatória. Agora os torturadores usavam-na durante horas, atingindo-lhe repetidamente a cabeça, os rins e o sexo”, relatou  Jean Marc Van der Weid, militante da Ação Popular. Grávida de sete meses, Alice Schmidt relata como sofreu com esse tipo de tortura.

“Espancamentos, principalmente no rosto e na cabeça, choques elétricos nos pés e nas mãos, murros na cabeça quando eu descia as escadas encapuzada, que provocavam dores horríveis na coluna e nos calcanhares, palmatória de madeira nos pés e nas mãos. Por recomendação de um torturador que se dizia médico, não deviam ser feitos espancamentos no abdômen e choque elétricos somente nas extremidades dos pés e das mãos”, relatou.

Afogamento

Era a tortura praticada com o derramamento de água, ou de uma mistura com querosene ou amoníaco ou outro líquido pelo nariz da vítima pendurada de cabeça para baixo. Outra forma era a vedação das narinas e introdução de mangueira na boca por onde era despejado o líquido.

Os torturadores também mergulhavam a cabeça da vítima dentro de um tanque. Já a “pescaria” era quando um preso tinha uma corta amarrada sob os braços e depois ele era lançado em um poço ou rio para depois ser puxado.

Telefone

Era a técnica de pancada com as mãos em concha nos dois ouvidos ao mesmo tempo, sendo que a vítima chegava a perder os sentidos, além do rompimento de tímpanos ou surdez permanente.

Sessão de caratê ou corredor polonês

Era a agressão realizada em meio a uma roda de torturadores com socos, pontapés, golpes, com pedaços de pau, cassetetes, mangueiras de borracha e etc.

Produtos químicos

Diversos tipos de produtos químicos ou medicamentos eram utilizados, como jogar ácido no corpo da pessoa ou passar álcool em um corpo ferido, para em seguida ligar o ventilador.

Soro da verdade  

Era um medicamento aplicado para fazer com que o preso falasse.

Temperar com éter

Aplicação de compressa embebida em éter, principalmente na boca, nariz, ouvidos e pênis ou a introdução de buchas de algodão ou pano, embebidos em éter, no ânus do torturado, geralmente quando no pau de arara. A aplicação prolongada provocava queimaduras e dor.

Injeção de éter

Injeções de éter que provocam dores lancinantes e provocava a necrose da região atingida.

Sufocamento

Obstrução das vias respiratórias com panos ou algodão para provocar a sensação de asfixia, além de impedir o torturado de gritar.

Enforcamento

O preso tinha o pescoço apertado com corda, tira ou pano.

Crucificação

A vítima era pendurada pelas mãos ou pés amarrados em ganchos presos no teto ou na escada. Junto a isso lhe eram aplicados choques elétricos, palmatória e as outras torturas usuais.

Furar poço de petróleo

O torturado era obrigado a colocar a ponta de um dedo da mão no chão e correr em círculos, sem mexer o dedo, enquanto era espancado, até cair de exaustão.

Em pé sobre latas

Consistia em obrigar o torturado a equilibrar-se com os pés descalços sobre as bordas cortantes de duas latas abertas. “Fiquei totalmente nu, colocaram fios no meu dedo do pé, dedo maior do pé, e em volta dos meus testículos. Me colocaram sobre duas latas, que acredito tipo de óleo comestível, dessas que se encontra ainda hoje, que se tem por aí, e assim teve início o interrogatório deles lá. Deviam ser duas, três pessoas que se revezavam [...]. Cada pergunta era acompanhada de descarga. Esse processo se dá durante todo o dia. Eles se revezam, mas não param. Eu ouvia, ao mesmo tempo, tinha conhecimento, de que na outra sala estava acontecendo também um interrogatório feito da mesma forma, porque eu ouvia gritos, eu ouvia as perguntas, as  respostas de quem estava sendo torturado”, relatou Benedito de Paula Bezerril, membro do PCdoB (Partido Comunista do Brasil), em seu depoimento à CNV do dia 22 de maio de 2013.

Geladeira

Tecnologia de tortura de origem britânica na qual o preso era confinado em uma cela de aproximadamente um metro e meio, de forma a impedir que se fique de pé. A porta interna é de metal e as paredes são forradas com placas isolantes. O sistema re refrigeração alterna entre calor e frio. Do teto acendem luzes em ritmo intermitente e rápido e um alto-falante emite sons de gritos, buzinas e etc. A pessoa era mantida nesse local por até dias, sem alimentação ou água.

Pau de Arara

Foi um dos métodos mais utilizados e conhecidos. O preso ficava suspenso por um travessão, de madeira ou metal, com os braços e pés atados. Nesta posição, outros métodos de tortura eram aplicados, como afogamento, palmatória, violências sexuais, choques elétricos, entre outros.

“Muitas vezes quando eu estava pendurado no pau de arara, porque a gente fica com a cabeça para baixo, pois durante um tempo você resiste, fica com a cabeça ainda levantada, depois de algum tempo você não exerce mais nenhum domínio sobre o corpo. É tudo assim, amortecido. O resto está amarrado, mas o pescoço ele cai. E ele foi inúmeras vezes chegar em cima de mim, lá no local onde o meu pescoço caído, ele abria a calça, tirava o pênis e urinava na minha cara. Ele fez isso várias vezes (...) Pegavam-me pela perna, um torturador pegava uma perna, outro pegava na outra perna, arrastavam a cabeça na laje, o corpo na laje. [...] chegando lá a pessoa era amarrada no pau de arara. Embaixo, às vezes eles colocavam, em baixo do corpo da pessoa amarrada, colocavam jornais para forrar o chão. Às vezes não, mas quase sempre eles colocavam aquele jornal embaixo. Porque a pessoa vomitava muito e defecava muito", relata Antônio Pinheiro Salles, em seu depoimento à CNV.

A utilização de animais

Presos políticos eram torturados com diversos tipos de animais como cachorros, ratos, jacarés, cobras, baratas, que eram lançados contra o torturado ou introduzidos em alguma parte do seu corpo. Especificamente em relação aos camundongos, o torturador Lourival Gaeta, que atuou no DOI do I Exército durante a década de 1970, em São Paulo, disse que era particularmente danoso porque quando eram introduzidos nos corpos das suas vítimas não conseguiam andar para trás.

“Me puseram de novo no pau de arara. Mais espancamento, mais choque, mais água e dessa vez entraram as baratas. Puseram baratas passeando pelo meu corpo, colocaram uma barata na minha vagina. Hoje parece loucura, mas um dos torturadores, de nome de guerra Gugu, tinha uma caixa onde ele guardava as baratas amarradas por barbantes e através do barbante ele conseguia manipular as baratas pelo meu corpo”, contou Lucia Murat.

“Eles colocavam o jacaré em cima e para cada um tinha um nome! O meu era Marighella. Era um jacarezinho que colocavam no teu corpo, aí vou dizer: não é porrada o tempo todo, mas é tortura! É humilhação, é sacanagem, é humilhar o outro na tua frente, é não te deixar dormir, é tortura! É terroro”, disse Ana Bursztyn à Comissão de Anistia e à UFRJ.

Coroa de cristo

Era a colocação de uma fita de aço em torno do crânio, com uma tarraxa que permitia que fosse apertada.

Churrasquinho

Partes do corpo do torturado eram embebidas em álcool para depois atearem fogo.

Fonte: Terra
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