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Kids pretos: quem são militares presos por planejar matar Lula e golpe de Estado

A operação, batizada de 'Contragolpe', é parte de um inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado e ações antidemocráticas que marcaram o período eleitoral de 2022, culminando nos atos terroristas de 8 de janeiro de 2023

19 nov 2024 - 08h10
(atualizado às 14h33)
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Presidente Lula durante o G20
Presidente Lula durante o G20
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A Polícia Federal realizou, na manhã desta terça-feira (19/11), uma operação para cumprir mandados de prisão e busca e apreensão contra suspeitos de integrar uma organização criminosa que, em 2022, teria planejado um golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Conforme informações da PF, o grupo elaborou o plano intitulado "Punhal Verde e Amarelo", que previa o assassinato de Lula e de seu vice, Geraldo Alckmin (PSB).

Também constava no esquema a prisão e execução de um ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, que vinha sendo monitorado.

'Kids pretos': quem são os presos

Segundo a apuração do site G1, cinco pessoas foram presas com autorização do STF, incluindo quatro militares do Exército, vinculados às forças especiais e conhecidos como "kids pretos": o general de brigada da reserva Mario Fernandes, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo e o major Rafael Martins de Oliveira. Além deles, foi preso o policial federal Wladimir Matos Soares.

Mario Fernandes atuou como secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência no governo de Jair Bolsonaro. Ele também exerceu a função de assessor do deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), mas foi afastado do posto por determinação do STF.

Além de solicitar a prisão preventiva, uma petição enviada ao Supremo Tribunal Federal, que tem como relator o ministro Alexandre de Moraes, determina a realização de buscas e apreensões relacionadas a outros investigados.

Entre as medidas cautelares pedidas estão a proibição de contato entre os investigados, inclusive por advogados; a proibição de saída do país, com entrega de passaportes em 24 horas; e a suspensão do exercício de função pública. Também foi requisitado o envio de ofícios ao Exército e à Secretaria de Administração Penitenciária do Rio de Janeiro, além do levantamento de sigilo e monitoramento.

A operação, batizada de "Contragolpe", é parte de um inquérito que investiga a tentativa de golpe de Estado e ações antidemocráticas que marcaram o período eleitoral de 2022, culminando nos na invasão do Planato, Congresso e Supremo no dia 8 de janeiro de 2023.

De acordo com a Polícia Federal, o plano "Punhal Verde e Amarelo" previa um ataque no dia 15 de dezembro de 2022.

Segundo a petição enviada ao STF, a Polícia Federal indicou que a investigação envolve a atuação de uma organização criminosa com diversas frentes, incluindo ataques a opositores, instituições e ao sistema eleitoral, além de uma tentativa de golpe de Estado e a violação do Estado Democrático de Direito.

O documento descreve, em trecho atribuído à Polícia Federal:

"As ações operacionais identificadas tinham como finalidade assegurar a prisão da referida autoridade, caso o Golpe de Estado se consumasse, ou, de maneira alternativa, a sua execução."

"Com planejamento, coordenação e execução típicos de uma operação militar especial, as ações demonstram um detalhado plano de atuação que envolve técnicas de anonimização, monitoramento clandestino e emprego ilícito de recursos públicos."

Também foram investigadas ações contra as vacinas da Covid-19 e medidas sanitárias, e o uso indevido da estrutura estatal para ganhos pessoais, como o uso de cartões corporativos para despesas pessoais, falsificação de dados de vacinação e o desvio de bens de alto valor.

A petição se concentra na tentativa de golpe de Estado. A Procuradoria-Geral da República se posicionou favoravelmente à adoção das medidas cautelares solicitadas.

Os militares foram detidos no Rio de Janeiro, onde participavam da segurança do encontro de líderes do G20. As prisões foram autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes e realizadas antes das 6h50 desta terça.

A investigação avançou após a análise de arquivos eletrônicos obtidos com militares investigados, incluindo materiais apagados dos dispositivos do coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, que foram recuperados pela PF.

Há previsão de que o inquérito seja concluído ainda este ano. Mauro Cid deve prestar novo depoimento nesta terça-feira (19/11).

De acordo com a investigação, foi encontrado um documento nos arquivos de Mário Fernandes planejava instituir um "gabinete institucional de gestão da crise". Ele entraria em operação no dia 16 de dezembro de 2022, dia seguinte à operação "Copa 2022".

A Polícia Federal informou que esse gabinete seria chefiado pelo general Augusto Heleno. O general Braga Neto exerceria a função de coordenador-geral.

Qual era o plano

Segundo o documento do STF e a apuração da PF, os investigados tinham a "a finalidade de impedir a posse do governo legitimamente eleito e restringir o livre exercício da Democracia e do Poder Judiciário brasileiro".

Para isso, eles colocaram em marcha uma operação que teve "auge a partir de novembro de 2022" e avançou até o mês de dezembro, "como parte de plano para a consumação de um golpe de Estado, em uma operação denominada pelos investigados de 'Copa 2022'".

Ainda de acordo com a investigação, tal operação tinha "elementos típicos de uma ação militar planejada detalhadamente, porém, no presente caso, de natureza clandestina e contaminada por finalidade absolutamente antidemocrática".

No dia 15 de novembro de 2022, o major Rafael Martins de Oliveira (um dos presos pela PF nesta terça-feira) encaminhou via WhatsApp para o general Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, um documento protegido por senha intitulado "Copa 2022".

"Pelo teor do diálogo, seria uma estimativa de gastos para subsidiar, possivelmente, as ações clandestinas, que seriam executadas durante os meses de novembro e dezembro de 2022", aponta a petição do STF.

Esse mesmo nome — "Copa 2022" — foi usado posteriormente como título de um grupo criado no Signal, um aplicativo de troca de mensagens.

Esse grupo era composto de seis usuários — e cada um deles recebeu um país como codinome "para não revelarem sua identidade", segundo a PF.

Os codinomes escolhidos foram: Alemanha, Áustria, Brasil, Argentina, Japão e Gana.

Vale destacar que os chips dos números de celulares que aparecem no grupo de mensagens estavam cadastrados em nomes de terceiros, que se encontravam em outras regiões do país.

A petição do STF aponta que "as mensagens trocadas entre os integrantes do grupo 'Copa 2022' demonstram que os investigados estavam em campo, divididos em locais específicos para, possivelmente, executar ações com o objetivo de prender o ministro Alexandre de Moraes".

Um exemplo: no dia 15 de dezembro de 2022 às 20h33, a pessoa associada ao codinome Brasil, informa um dos locais em que estava atuando. Ele diz: "Estacionamento em frente ao gibão carne de sol [um restaurante]. Estacionamento da troca da primeira vez".

Em seguida, a pessoa associada ao codinome Gana informa que já estava no local combinado: "Tô na posição".

A troca de mensagens continua até que, às 20h57min, a pessoa de codinome Áustria diz: "Tô perto da posição. Vai cancelar o jogo?".

Segundo a PF, ele possivelmente queria saber se a ação contra Moraes seria cancelada.

Cerca de dois minutos Japão, o suposto líder do grupo, respondeu: "Abortar... Áustria... volta para local de desembarque... estamos aqui ainda..."

A investigação da PF cruzou as informações fornecidas pelos envolvidos e também dados de chips de celular, aluguel de carros e outras fontes para concluir que o grupo monitorava Moraes.

"A análise [...] permite concluir que 'é plenamente plausível que a pessoa de codinome Gana estivesse próxima a residência funcional do ministro Alexandre de Moraes."

O uso de termos específicos do ambiente militar e o detalhamento das ações sugere, de acordo com a investigação, que os envolvidos tinham treinamento e especialização em operações especiais.

O trabalho da PF apontou que o major Rafael Martins de Oliveira, um dos presos nesta terça-feira (19/11), seria o líder da operação "Copa 2022".

As evidências colhidas por STF e PF apontam que segundo documento-chave da investigação, denominado "Punhal Verde Amarelo", foi elaborado pelo general Mario Fernandes.

Esse arquivo detalhada um "planejamento operacional" que "tinha como objetivo executar o ministro Alexandre de Moraes e os candidatos eleitos Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, ambos componentes da chapa vencedora das eleições".

A PF aponta que o documento foi impresso por Fernandes no Palácio do Planalto no dia 09 de novembro de 2022.

Nessa mesma ocasião, os aparelhos telefônicos de outros investigados — Rafael Martins de Oliveira e Mauro Cid — também estavam conectados à rede que cobre o Palácio do Planalto.

Depois, esses papeis foram levados ao Palácio da Alvorada, residência do então presidente Bolsonaro.

Assassinato de Lula, Alckmin e Moraes

Plano identificado pela Polícia Federal mirava Lula e o vice-presidente, Geraldo Alckmin
Plano identificado pela Polícia Federal mirava Lula e o vice-presidente, Geraldo Alckmin
Foto: Reuters / BBC News Brasil

"O planejamento 'Punhal Verde e Amarelo' evidencia que, no tabuleiro das intenções antidemocráticas, vidas humanas eram descartáveis, inclusive de eventuais militares envolvidos na ação", diz a petição do STF.

No relatório a PF diz que o documento tinha "características terroristas", no qual constam descritos "todos os dados necessários para a execução de uma operação de alto risco".

"O plano dispõe de riqueza de detalhes, com indicações acerca do que seria necessário para a sua execução, e, até mesmo, descrevendo a possibilidade da ocorrência de diversas mortes", diz a PF.

Há, por exemplo, menções ao arsenal que seria utilizado na operação — que inclui pistolas e civis comumente usados por policiais e militares, mas também armamentos de guerra mais pesados, como metralhadoras e lança-granadas.

A investigação aponta que, no documento, o codinome "Jeca" refere-se a Lula.

"Para execução do presidente Lula, o documento descreve, considerando sua vulnerabilidade de saúde e ida frequente a hospitais, a possibilidade de utilização de envenenamento ou uso de químicos para causar um colapso orgânico", revela a PF.

Já "Joca" seria Alckmin. "Isso porque o texto aponta que na inviabilidade do '01 eleito', ou seja, Lula, 'sua neutralização extinguiria a chapa vencedora'. Como, além do presidente, a chapa vencedora é composta, obviamente, pelo vice-presidente, é somente na hipótese de eliminação de Geraldo Alckmin que a chapa vencedora estaria extinta".

Há ainda a menção a um terceiro nome, "Juca", descrito como "iminência parda do 01 [possivelmente Lula] e das lideranças do futuro gov [governo]", mas a PF não conseguiu identificar quem seria essa pessoa.

Já para Moraes, "foram consideradas diversas condições de execução", "inclusive com o uso de artefato explosivo e por envenenamento em evento oficial público", dizem PF e STF.

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