Lula à CNV: "os militares cometeram a burrice de me prender"
Ex-presidente relatou a integrantes da Comissão Nacional da Verdade detalhes do período em que foi monitorado e preso
A Comissão Nacional da Verdade, criada para apurar violações de Direitos Humanos ocorridas entre 1946 e 1988 no Brasil, conseguiu um material importante nesta semana: um depoimento de cerca de uma hora e meia do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversa com Maria Rita Kehl e Paulo Sérgio Pinheiro na sede do Instituto Lula, ele contou detalhes sobre o minitoramente que sofreu nas décadas de 1970 e 1980 e também sobre sua prisão.
Documentos colhidos pela CNV mostram que, naquele período, diversos trabalhadores foram espionados por empresas brasileiras e também estrangeiras. O petista, líder sindical responsável por várias greves por melhores direitos trabalhistas, era um deles.
"Eles me vigiavam em cinema. Na assembleia, a gente notava que eles estavam lá. Às vezes, disfarçados no bar do sindicato. Na minha casa, por exemplo, eles paravam a perua na porta e passavam a noite. Às vezes, para encher o saco, a Marisa (sua esposa) mandava fazer café e mandava levar para eles. Foram uns três ou quatros anos que eles monitoraram e me acompanharam antes da prisão", disse ele, que foi minotorado prioritariamente pela Volkswagen.
Em 1980, Lula foi preso. De acordo com ele, a ação dos militares foi "burra", pois ele já estava negociando com os empresários e a greve deveria ser encerrada em breve .
"Os militares cometeram a burrice de me prender, porque não tinha mais como continuar a greve. O que aconteceu quando eles me prenderam? Foi uma motivação a mais para a greve continuar, as mulheres fizeram uma passeata muito bonita em São Bernardo do Campo, depois foi aquele 1° de maio histórico, em que foi o Vinícius de Moraes, e a greve durou mais quase 30 dias", contou.
De acordo com o relato do ex-presidente, ele não sofreu tortura e agressões brutais como outros presidiários da época. Ele contou que foi recebido por Romeu Tuma, na época diretor-geral do Dops, com dignidade, conseguiu uma TV para assistir a um jogo entre Corinthians e Botafogo e foi até liberado para ver a mãe, que estava com câncer.
"A gente foi tratado lá com um certo respeito porque tinha muita gente do lado de fora, não era um preso comum, e lá fora tinha trabalhador, estudante, intelectuais, igreja, todo mundo", finalizou.