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"Não há base para parceria estratégica se Bolsonaro vencer"

13 out 2018 - 14h41
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Em entrevista, presidente do Grupo Parlamentar Teuto-Brasileiro fala sobre as perspectivas para a cooperação entre Brasil e Alemanha após o segundo turno da eleição e avalia situação da democracia brasileira.Apesar de os dois países cultivarem laços há décadas, a relação entre Brasil e Alemanha esfriou nos últimos dois anos. As eleições geraram uma expectativa de mudança nesse cenário, mas, para a presidente do Grupo Parlamentar Teuto-Brasileiro no Bundestag (Parlamento alemão), a deputada Yasmin Fahimi, uma possível eleição do candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) pode impedir uma retomada da parceria estratégica.

"Desejo obviamente uma retomada da parceria estratégica com o Brasil", afirmou a deputada do Partido Social-Democrata (SPD), em entrevista à DW. Mas, "do lado alemão, não vejo nenhuma base para uma parceria estratégica com um presidente Bolsonaro", acrescentou.

A presidente do grupo parlamentar que é responsável por cultivar as relações com o Congresso disse ver o Brasil "à beira de uma grande ruptura" e avaliou que o país pode ficar isolado internacionalmente com Bolsonaro. "Ele deixa claro que é contra qualquer forma de multilateralismo", comentou.

DW: Como a senhora avalia o resultado do primeiro turno e a situação política do Brasil?

Yasmin Fahimi: O Brasil está à beira de uma grande ruptura. Ficamos chocados como o fato de que, com Jair Bolsonaro, uma pessoa que tornou socialmente aceitável um discurso de ódio tenha chegado à liderança. Isso nos enche de preocupação sobre o futuro do Brasil.

Há dois candidatos no segundo turno. Como seria o futuro das relações bilaterais entre a Alemanha e o Brasil nesses dois cenários?

Em princípio, desejo obviamente uma retomada da parceria estratégica com o Brasil. O Brasil é para a Alemanha e para toda a Europa um parceiro muito importante, econômica e politicamente. O Brasil é a economia mais forte da América Latina. O futuro de toda a América Latina é importante, também para termos um parceiro político no mundo que defenda uma economia de mercado socialmente equilibrada e democraticamente controlada. Na atual situação, não vejo isso. Um presidente Bolsonaro representaria uma privatização radical, um sangramento sociopolítico do país e o rompimento com acordos internacionais.

A relação bilateral também não funcionaria bem com Fernando Haddad?

Haddad seria um presidente completamente diferente, a quem atribuo um rumo muito mais moderado. Ele já deixou claro que quer impulsionar não somente o desenvolvimento social, como também econômico do país, e defendeu ainda o diálogo com todos os grupos. Um rumo político assim é naturalmente apoiado pelo lado alemão.

E com Jair Bolsonaro?

Não vejo nenhuma base para uma cooperação internacional diante do que ele declarou. Ele deixa claro que é contra qualquer forma de multilateralismo: deixar a ONU, a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o Acordo de Paris. Isso isolaria o Brasil totalmente no contexto internacional. Assim, do lado alemão, não vejo nenhuma base para uma parceria estratégica com um presidente Bolsonaro.

O Brasil e a Alemanha têm há décadas uma relação muito próxima, mas nos últimos anos a cooperação esfriou. Por quê?

Porque a situação no Brasil há muito tempo está muito incerta e inconstante. Não conseguimos prever o rumo que o país irá tomar. As decisões orçamentárias e político-econômicas dos últimos dois anos também contribuíram para desestabilizar o país. Assim, não foi um encerramento da nossa parte, mas, na verdade, uma interrupção, na esperança de que se possa retomar o rumo das conversações.

Como essa relação pode ser novamente aquecida?

Independentemente do resultado da eleição, seria desejável ter um diálogo sobre os temas democracia e Estado de Direito. Seria importante conversar sobre o desenvolvimento sustentável de nossas economias e também poderíamos aprofundar nossos planos nacionais para a aplicação da convenção de direitos humanos. Também na Alemanha há uma discussão de como podemos implementar nosso plano de ação Economia e Direitos Humanos nas cadeias produtivas. A responsabilidade de nossas empresas que atuam globalmente não acaba na fronteira da Alemanha, mas precisa incluir, por exemplo, o Brasil. Isso é importante para nós porque fortalece as empresas alemãs na competição global sem custar empregos alemães.

Como você avalia o desenvolvimento do Brasil no cenário internacional? O país perdeu importância?

Infelizmente, sim. O Brasil já esteve muito mais no centro do interesse internacional, também por causa da intensificação das conversações entre os Brics. O país estava num bom caminho econômico, social e internacional. Não se poderia imaginar, então, que houvesse outra alternativa para o Brasil além da continuação do desenvolvimento, do fortalecimento da democracia e da estabilidade econômica. Mas ocorreu justamente o contrário. As reformas sociais regrediram, o país está dividido, a conjuntura está enfraquecida e os investimentos necessários não foram feitos.

O Brasil pode recuperar essa importância?

Sim. O Brasil tem grandes problemas, mas também um potencial enorme devido aos seus recursos e devido ainda a uma cultura que se libertou da ditadura militar e que era marcada por fomentar o desenvolvimento e educação, se posicionar contra a pobreza social e oferecer mais oportunidades. Quem quer investir na América Latina não tem como desconsiderar o Brasil. Mas o Brasil não pode subestimar as alternativas, como o México.

Somente o México seria uma alternativa?

Não, há também outros países menores, como Chile, Uruguai, Argentina e também Colômbia.

Martin Schulz disse que, se Bolsonaro ganhar, um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia ficaria mais distante. A senhora concorda?

Ficará difícil e talvez até impossível, começando por um motivo: todo acordo comercial internacional tem como base a confiança de que os compromissos alcançados serão respeitados. Um país não pode entrar ou sair de acordos internacionais ao bel-prazer do chefe de Estado. Além disso, um acordo pressupõe um Estado de Direito. Se há a impressão de que num país decisões políticas são arbitrárias, que há uma ameaça de politização do sistema judiciário, que a divisão de poderes não é mais seguida, que possa até mesmo ocorrer uma militarização da esfera pública, então, isso é por si só um golpe fatal para qualquer acordo comercial internacional. Sob essas condições, não há como a Europa negociar um acordo comercial. E eu não sei de nenhum outra região do mundo que teria interesse.

Como a senhora avalia a situação da democracia brasileira?

Há uma pesquisa preocupante que mostra que apenas 46% dos brasileiros se pronunciaram positivamente sobre a democracia como forma de governo. E o clima antipolítico no país é fortalecido com acusações de corrupção contra juízes e políticos. Todas as instituições do Estado estão perdendo confiança. Isso é extremamente perigoso para o desenvolvimento social e econômico do país.

Como opção a isso, Bolsonaro adota um rumo fascista: exclusão, militarização e desdemocratização. Ele promete, por exemplo, pulso firme contra a criminalidade. O que se pode esperar disso é apenas um aumento da violência policial, que já um problema no Brasil. Na verdade, isso terá como consequência a criminalização dos mais pobres, sem combater as causas da criminalidade.

A melhor solução para a paz social e o desenvolvimento de um país continua sendo uma distribuição justa de oportunidades e riqueza. O desenvolvimento social do Brasil traria também o desenvolvimento econômico, como mostrou o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O rumo fascista de Bolsonaro irá dividir ainda mais o país e não trará nenhuma melhora para os pobres. Por isso, vejo um grande problema para o Brasil e sua democracia, e também, porque investidores estrangeiros, incluindo empresas alemães, deverão evitar investir no Brasil.

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