Nenhum país pode negociar sua soberania, diz Dilma sobre espionagem
A presidente Dilma Rousseff voltou a comentar nesta quarta-feira, antes de embarcar de Nova York para o Brasil, as denúncias de espionagem envolvendo a violação de privacidade na comunicação de brasileiros, inclusive da própria presidente e da Petrobras. Segundo Dilma, a resposta a ser dada pelo governo brasileiro depende das medidas que os Estados Unidos tomarão. "O que sempre colocamos é que era necessário, primeiramente, para tratar do que tinha ocorrido, (um pedido de) desculpas. Segundo, para tratar do futuro, uma clara determinação de não acontecer (novamente)", disse.
"Nenhum governo pode transigir com os direitos civis e com a privacidade da sua população nem tampouco negociar sua soberania", ressaltou a presidente, durante entrevista à imprensa. Apesar da posição de indignação, coerente com a adotada ontem durante abertura da 68º Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Dilma declarou que a relação entre o Brasil e os EUA é estratégica e que ultrapassa essa questão.
"Como uma pessoa que ficou quatro meses em uma empresa privada tem dados sobre o Brasil, a minha pessoa, empresas brasileiras e cidadãos? Esta é a pergunta que eu acho que vai ter que ser esclarecida não só para o Brasil, mas para vários países, e nós aguardaremos", disse, se referindo ao americano Edward Snowden, responsável pelo vazamento das informações que originaram as denúncias. Snowden trabalhava para uma prestadora de serviços da Agência Nacional de Segurança dos EUA (NSA, na sigla em inglês).
O motivo de ter recorrido à ONU para apresentar a reclamação também foi esclarecido por Dilma. Para a presidente, o Brasil não defende interferência da ONU no sentido de controlar a internet. "Estamos pedindo: ONU, preserve a segurança, não deixe que a nova guerra se dê no mundo cibernético, com hackers e tudo."
As declarações foram dadas antes de Dilma participar do seminário Oportunidades em Infraestrutura no Brasil, onde ressaltou a empresários norte-americanos que o Brasil precisa superar sua demanda por infraestrutura e que, para isso, o investimento privado é essencial.
Ao discriminar as propostas que estão sendo discutidas pelo Brasil para evitar o acesso de empresas e governos estrangeiros a dados brasileiros, Dilma citou a tramitação no Congresso do Marco Civil da Internet, cujo pedido de urgência foi feito por ela há duas semanas. "Uma das coisas que para nós vai ser muito importante é que os dados que dizem respeito ao Brasil sejam arquivados e mantidos em base de dados dentro do Brasil", disse.
Espionagem americana no Brasil
Matéria do jornal O Globo de 6 de julho denunciou que brasileiros, pessoas em trânsito pelo Brasil e também empresas podem ter sido espionados pela Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (National Security Agency - NSA, na sigla em inglês), que virou alvo de polêmicas após denúncias do ex-técnico da inteligência americana Edward Snowden. A NSA teria utilizado um programa chamado Fairview, em parceria com uma empresa de telefonia americana, que fornece dados de redes de comunicação ao governo do país. Com relações comerciais com empresas de diversos países, a empresa oferece também informações sobre usuários de redes de comunicação de outras nações, ampliando o alcance da espionagem da inteligência do governo dos EUA.
Ainda segundo o jornal, uma das estações de espionagem utilizadas por agentes da NSA, em parceria com a Agência Central de Inteligência (CIA) funcionou em Brasília, pelo menos até 2002. Outros documentos apontam que escritórios da Embaixada do Brasil em Washington e da missão brasileira nas Nações Unidas, em Nova York, teriam sido alvos da agência.
Logo após a denúncia, a diplomacia brasileira cobrou explicações do governo americano. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, afirmou que o País reagiu com “preocupação” ao caso.
O embaixador dos Estados Unidos, Thomas Shannon negou que o governo americano colete dados em território brasileiro e afirmou também que não houve a cooperação de empresas brasileiras com o serviço secreto americano.
Por conta do caso, o governo brasileiro determinou que a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) verifique se empresas de telecomunicações sediadas no País violaram o sigilo de dados e de comunicação telefônica. A Polícia Federal tambéminstaurou inquérito para apurar as informações sobre o caso.
Após as revelações, a ministra responsável pela articulação política do governo, Ideli Salvatti (Relações Institucionais), afirmou que vai pedir urgência na aprovação do marco civil da internet. O projeto tramita no Congresso Nacional desde 2011 e hoje está em apreciação pela Câmara dos Deputados.
Monitoramento
Reportagem veiculada pelo programa Fantástico, da TV Globo, afirma que documentos que fariam parte de uma apresentação interna da Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos mostram a presidente Dilma Rousseff e seus assessores como alvos de espionagem.
De acordo com a reportagem, entre os documentos está uma apresentação chamada "filtragem inteligente de dados: estudo de caso México e Brasil". Nela, aparecem o nome da presidente do Brasil e do presidente do México, Enrique Peña Nieto, então candidato à presidência daquele país quando o relatório foi produzido.
O nome de Dilma, de acordo com a reportagem, está, por exemplo, em um desenho que mostraria sua comunicação com assessores. Os nomes deles, no entanto, estão apagados. O documento cita programas que podem rastrear e-mails, acesso a páginas na internet, ligações telefônicas e o IP (código de identificação do computador utilizado), mas não há exemplos de mensagens ou ligações.