Nos EUA, Guedes diz que 'Brasil é contra guerra e contra sanções' e que país 'pertence aos BRICS, não à OCDE'
Ministro da Economia disse que Brasil votará contra expulsão da Rússia de organismos como o FMI e o Banco Mundial.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o Brasil é contra a guerra na Ucrânia, mas também contra sanções aplicadas à Rússia por ter invadido o país vizinho.
Em uma entrevista na tarde desta terça (19/4), no Center of Strategic and International Studies, em Washington D.C., Guedes também disse que o Brasil é contrário à expulsão da Rússia de instituições multilaterais como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), como querem os Estados Unidos e os países-membros do G-7.
No fim de fevereiro, a Rússia invadiu a Ucrânia, em uma guerra que já matou milhares e levou cerca de cinco milhões de ucranianos a buscar refúgio fora da zona de conflito. De lá pra cá, sob a liderança dos americanos, parte dos países ricos tem pressionado para que a Rússia seja retirada dos organismos internacionais, como o G-20.
"Pelas regras, você não pode expulsá-los. O Brasil é a favor das regras. Na minha visão pessoal, você tem que manter as pontes para convencê-los a um cessar-fogo. A pergunta que deveríamos fazer pra eles (russos) é: 'Olha, se vocês não querem respeitar as instituições, se vocês não se comportam apropriadamente, por que vocês querem ficar?'", disse Guedes.
Instado a explicar a posição do Brasil em relação à guerra, Guedes afirmou que é uma posição "complexa", "contra a guerra e contra as sanções". O posicionamento brasileiro é considerado confuso pela comunidade internacional.
O país condenou as ações russas no Conselho de Segurança da ONU, mas votou contra a expulsão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. E dias antes da guerra, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, expressou "solidariedade ao povo russo" em uma visita a Moscou e depois desautorizou seu vice, Hamilton Mourão, que havia criticado as ações bélicas de Vladimir Putin.
O posicionamento do Brasil levou a porta-voz do presidente americano Joe Biden, Jen Psaki, a dizer que o país precisaria escolher se ficaria do lado certo ou errado da história, posicionamento que incomodou o Itamaraty.
"Nós somos contra a guerra e como consequência, se somos contra a guerra, somos contra as consequências econômicas, que é a guerra econômica, as sanções. Somos contra a guerra e contra as sanções", disse Guedes, utilizando o termo "guerra econômica" adotado por Putin para denunciar as medidas restritivas adotadas contra a elite e a economia russa por americanos e europeus.
Guedes também afirmou que a Constituição brasileira proíbe o Brasil de endossar sanções não aprovadas pela ONU. Chamou as sanções de "civilizadas", mas afirmou que legalmente o Brasil não poderia apoiá-las.
"A Constituição do Brasil veda sanções, exceto aquelas que a ONU endossa", afirmou Guedes. Não é tradição na política externa brasileira que o país apoie sanções unilaterais.
Segundo Elaini da Silva, professora de direito internacional da PUC, o texto da Constituição prevê soluções multilaterais e não intervenção em relação a outros países, e por isso existe a interpretação de que sanções unilaterais ferem esses princípios.
'Não pertencemos à OCDE'
Questionado sobre se o Brasil estaria facilitando que a Rússia evadisse as sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos e pela Europa Ocidental, Guedes mencionou BRICS e OCDE: "Eu não colocaria nesses termos, facilitando… o Brasil é governado por um presidente que recebeu 60 milhões de votos e está pensando em fertilizantes, importados da Rússia. Nós não pertencemos ao globo, à OCDE. E pertencemos aos BRICS, somos os únicos nos BRICS a ter condenado a invasão. Índia e China, metade da população mundial, disseram 'nós não nos importamos'. Então estamos em uma situação complexa. Minha posição seria: cessa-fogo agora e suspensão imediata de sanções", respondeu Guedes, que defendeu durante a entrevista que esse era o momento para que o Brasil fosse finalmente admitido na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), uma bandeira do governo brasileiro atual.
Bolsonaro já mencionou a importância dos fertilizantes para o agronegócio e os interesses econômicos do Brasil como um motivo para se posicionar com cautela diante da guerra.
Em tom crítico, a respeito da expulsão da Rússia de organismos multilaterais, o entrevistador Daniel F. Runde, diretor do programa de Americas do CSIS, afirmou a Guedes: "Você vai descobrir que existem visões bem fortes sobre isso aqui e vai ser interessante ver a resposta que você obterá com a sua posição".
Runde também afirmou que "em Washington ninguém acredita que seu presidente vai ganhar a reeleição". Falando sempre em inglês, Guedes afirmou que Bolsonaro é aclamado em qualquer lugar que vá no Brasil e escorregou nos números. "Ele vai a todo lugar e é recebido por centenas de milhões, escapa de segurança, abraça as pessoas", afirma.
Guedes está em Washington para as reuniões de primavera do FMI e do Banco Mundial. Nesta terça, o FMI divulgou nova expectativa de crescimento para a economia brasileira, com revisão para cima, e afirmou que o Brasil deve crescer 0,8% em 2022.