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Número de venezuelanos no Brasil dobrará em 2019, diz ONU

Plano aponta para situação preocupante em Roraima e prevê US$ 56 milhões em recursos internacionais para ajuda ao Brasil. No total, 5,3 milhões de venezuelanos terão deixado o país até o final do próximo ano

14 dez 2018 - 11h18
(atualizado às 11h19)
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GENEBRA - O número de venezuelanos no Brasil em 2019 dobrará, chegando a quase 200 mil, informou a Organização das Nações Unidas (ONU) nesta sexta-feira, 14. Os dados fazem parte de um plano da organização para socorrer os migrantes e refugiados venezuelanos.

A ONU apela a doadores internacionais para enviarem ao Brasil pelo menos US$ 56 milhões para atender ao fluxo de venezuelanos no próximo ano, além de reforçar saúde e escolas para cerca de 110 mil brasileiros na região de fronteira.

Venezuelanos buscam abrigo em Roraima
Venezuelanos buscam abrigo em Roraima
Foto: Walterson Rosa/FramePhoto / Estadão Conteúdo

Essa é a primeira vez que a situação é classificada como uma crise humanitária e a ONU, no total, estima que uma resposta para a crise sul-americana custará US$ 736 milhões. Até o final de 2019, mais 2 milhões de venezuelanos deixarão o país, elevando o êxodo para 5,3 milhões de pessoas. A perspectiva é de que, à medida que o fluxo aumente, a população afetada estará cada vez mais vulnerável e em situação desesperadora.

"Esse é um movimento sem precedentes na região", alertou Eduardo Stein, o representante especial da ONU para a crise na Venezuela. Segundo ele, o fluxo "é o maior deslocamento de pessoas na história da América Latina".

Stein estima que os governos da região fizeram esforços importantes. "Mas muito mais precisa ser feito", disse. Segundo ele, existem problemas no que se refere à regularização, a capacidade do sistema de asilo, acesso à saúde e à educação, além de abrigo.

O representante deixa claro que está "preocupado" com sinais de discriminação e xenofobia registrados contra os venezuelanos em outros países, "colocando uma sombra sobre a tradição de generosidade da região".

Entre 2015 e 2018, o fluxo migratório de venezuelanos passou de 700 mil para 3 milhões. Essas, porém, são estimativas conservadoras e a entidade aponta que o volume total é maior. Entre os venezuelanos, 958 mil têm algum tipo de visto, enquanto outros 365 mil pediram asilo. "Com mais de 5 mil pessoas chegando a cada dia, a capacidade de resposta está no limite e há um risco de aumento de xenofobia se isso não for lidado", alertou.

Venezuelanos atravessam a fronteira com o Brasil em Roraima
Venezuelanos atravessam a fronteira com o Brasil em Roraima
Foto: Edmar Barros / Futura Press

Falta de documentação

A ONU também alerta para um enorme número de venezuelanos que continua sem documentos e na irregularidade, uma tendência que deve aumentar. Em alguns países, isso significa que um número cada vez maior de pessoas estará sem acesso à saúde e vulnerável a abusos e violência.

"A experiência mostra que movimentos de grande escala de populações persistem e se deterioram na ausência de soluções políticas e falta de solidariedade internacional", alertou. "Dada a magnitude do fluxo de venezuelanos, apenas uma resposta coordenada regional, com o apoio da comunidade internacional, permitirá que a região lide com a dimensão disso", afirmou.

Para a ONU, o ritmo do êxodo vai continuar em 2019 e as atuais taxas de pessoas cruzando a fronteira por dia vão "persistir". Dos 5,3 milhões de venezuelanos pelo mundo, 3,6 milhões precisarão de ajuda, incluindo 460 mil crianças. "Não há perspectiva de um retorno a curto ou médio prazo (para a Venezuela)", alertou.

Com o dinheiro solicitado, a ONU espera ajudar a 2,2 milhões de venezuelanos. Cerca de outros 500 mil cidadãos de países vizinhos também serão beneficiados.

O país mais afetado será a Colômbia, com a expectativa de receber um total de 2,3 milhões de venezuelanos. Quase um milhão entrarão apenas em 2019. Por isso, 43% dos recursos da ONU vão para ajudar Bogotá a dar uma resposta. O Equador receberá 16%, e o Peru, 14%.

Cerca de outros 1,4 milhão de venezuelanos estarão "em trânsito" entre mais de um país até chegar ao seu destino. "Essas pessoas precisarão de proteção durante a viagem", indicou a ONU. Com o dinheiro, portanto, a entidade espera fortalecer os serviços nos países da região.

Cambista venezuelano exibe notas do 'Bolívar Soberano' em Roraima
Cambista venezuelano exibe notas do 'Bolívar Soberano' em Roraima
Foto: Edmar Barros / Futura Press / Estadão Conteúdo

Brasil

No caso do Brasil, a ONU indica que existem atualmente 88,9 mil venezuelanos no país. Desses, 65 mil solicitaram status de refugiado.

A partir de novembro, uma média de 400 a 500 pessoas passaram a cruzar a fronteira em direção ao País, "muitas em condições desesperadoras e precisando de ajuda humanitária urgente". "O Brasil continuará a receber um número substancial de refugiados e migrantes", explicou a ONU.

"Projeta-se que haverá cerca de 190 mil refugiados e migrantes da Venezuela no Brasil ao final de 2019, incluindo 86 mil novos chegados ao longo do ano", afirma a entidade em seu plano. A ONU estima que, desses, 180 mil precisarão de ajuda.

Além deles, 110 mil brasileiros em comunidades que receberão esses estrangeiros também terão de contar com um pacote de assistência.

Com os US$ 56 milhões, a ONU espera ajudar o Brasil a atender a 95 mil refugiados e migrantes, além de 55 mil brasileiros da região de fronteira. O pacote vai incluir alimentos, material higiênico, água e itens de saúde. Novos abrigos prometem ser erguidos e programas criados para treinar funcionários públicos e acelerar processo de registro.

Uma parte importante da verba vai para a realocação de venezuelanos pelo Brasil e garantia de educação, além de esforços para dar empregos e cursos de português. O objetivo é fortalecer a integração, além de fazer campanhas para lidar com a xenofobia e discriminação. A ONU destaca que o governo ampliará os esforços para trasladar parte dos venezuelanos para outras regiões do País. A meta é de distribuir mil pessoas por mês. Para 2019, o foco ainda será o de acelerar a documentação desses venezuelanos e dar uma resposta humanitária.

A ONU quer garantir investimentos em serviços e infra-estrutura e fortalecer o monitoramento do governo sobre as necessidades de cidades nacionais que estão recebendo os estrangeiros.

49% do dinheiro ao Brasil será destinado para que haja uma integração sócio-econômica e promoção da coexistência entre os venezuelanos e populações locais, além de proteção aos grupos mais vulneráveis. 28% vai para uma ajuda humanitária emergencial e direta, como alimentos e remédios. 16% do pacote vai para proteção e 7% para reforçar a estrutura do governo.

A ONU, porém, destaca o desafio que isso impõe sobre Roraima, um dos Estados mais pobres do País, com renda de US$ 270,00. "A situação social desafiadora e a falta de recursos estão influenciando as condições para violência e distúrbios no Estado, assim como a tensão social entre a comunidade local e aqueles que chegam", alertou.

"Diante de sua localização isolada e com fraca rede de serviços públicos, a situação apenas se exacerbou depois da chega de venezuelanos", indicou o plano, que não hesita em alertar para a "tensão" existente por conta de serviços sobrecarregados.

Venezuelanos chegam a Roraima
 16/11/2017   REUTERS/Nacho Doce
Venezuelanos chegam a Roraima 16/11/2017 REUTERS/Nacho Doce
Foto: Reuters

Fome

Os números revelam uma situação alarmante vivida pelos venezuelanos no Brasil. Até outubro, 5,2 mil estrangeiros viviam em abrigos em Boa Vista e Pacaraima. Mas os documentos revelam que "a demanda por moradia superou a capacidade local e estruturas". Entre fevereiro e junho, o total de venezuelanos vivendo fora dos abrigos oficiais aumentou ainda em 23%.

Um terço deles não encontra locais em abrigos oficiais da ONU ou do governo e acaba se alimentando apenas uma vez por dia, mesmo que tenha fugido da fome em seu país de origem.

90% daqueles que estão fora dos locais de abrigo em Boa Vista não têm acesso a saneamento. 66% não têm acesso a água. 32% dos venezuelanos entrevistados disseram não ter acesso à saúde no Brasil e 55% das crianças não frequentam escolas.

De acordo com a ONU, apesar de o Brasil ter uma lei exemplar para migrantes, sua aplicação é "desafiadora" diante da falta de recursos, além da falta de coordenação entre diferentes níveis de governos.

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