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O que se sabe sobre o ataque de homem-bomba em Brasília

14 nov 2024 - 09h02
(atualizado em 15/11/2024 às 08h10)
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Terrorista suicida de extrema direita que morreu em frente ao STF anunciou ataque previamente e detonou pelo menos dois explosivos. À PF, ex-mulher disse que alvo era o ministro Alexandre de Moraes.Duas explosões foram registradas na noite desta quarta-feira (13/11) nas proximidades de um anexo da Câmara dos Deputados e da sede do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, num atentado suicida cometido por um radical de extrema direita.

Veja o que se sabe sobre o caso:

As explosões

Por volta das 19h30, uma explosão destruiu o porta-malas de um carro estacionado no Anexo 4 da Câmara dos Deputados, em Brasília. Vinte segundos depois, uma segunda explosão foi ouvida na Praça dos Três Poderes, em frente à sede do Supremo.

No porta-malas do veículo danificado foram encontrados tijolos, madeira e fogos de artifício. Bombeiros apagaram as chamas e a fumaça.

Segundo as autoridades de segurança, o autor das explosões, identificado como o chaveiro Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, se matou após tentar e não conseguir entrar no STF. Ao ser interpelado por um segurança, ele jogou explosivos em direção à marquise do edifício e mostrou outros artefatos, antes de se deitar deliberadamente sobre a bomba e detoná-la junto à nuca.

Segundo esse segurança, Wanderley Luiz carregava uma mochila e, antes de se matar, exibiu algo semelhante a um relógio digital, que parecia acoplado a uma bomba.

Ele vestia um terno verde estampado com naipes de cartas de baralho, numa aparente referência ao protagonista do filme Coringa, lançado em 2019, e que foi adotado como símbolo por radicais antissistema.

A ação não deixou outras vítimas, mas levou à suspensão de uma sessão plenária na Câmara dos Deputados. O plenário do Supremo também foi totalmente evacuado. Alguns ministros ainda estavam no prédio no momento das explosões. O Senado operou normalmente até encerrar suas votações, sendo evacuado em seguida.

A suspeita dos investigadores é que Wanderley Luiz provocou um incêndio no carro carregado com explosivos para desviar a atenção das forças de segurança enquanto atacava a praça dos Três Poderes. "Era uma bomba caseira, com pólvora e tijolos. O suspeito tentou causar uma grande explosão e não conseguiu", afirmou ao UOL um sargento da Polícia Militar do Distrito Federal.

Policiais desativaram pelo menos seis artefatos explosivos encontrados na região da Praça dos Três Poderes, sendo que dois deles estavam no cinto do autor dos ataques - razão pela qual o corpo só foi retirado do local na manhã seguinte às explosões, quase 13 horas depois.

Explosivos também foram encontrados em um trailer nas imediações, e numa casa alugada pelo autor do atentado em Ceilândia.

Foram feitas varreduras em busca de outras bombas na praça dos Três Poderes e no entorno do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência.

A Polícia Civil do DF classificou o episódio como um "autoextermínio com explosivo". A Polícia Federal, que investiga o caso, diz que o autor do atentado agiu sozinho, mas que monitora grupos extremistas.

O autor das explosões

O homem-bomba foi identificado pela polícia como Francisco Wanderley Luiz - ou "Tiü França" -, chaveiro de 59 anos e natural de Rio do Sul, interior de Santa Catarina. O carro que explodiu e o trailer com explosivos estavam registrados no nome dele.

Em Rio do Sul, Wanderley Luiz foi candidato em 2020 a vereador pelo PL, partido que desde 2021 abriga o ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo o jornal O Globo, ele fez campanha sob o slogan "Ame tua casa, ame teu país, seja patriota", mas só obteve 98 votos e não se elegeu.

À época, Wanderley Luiz declarou à Justiça Eleitoral R$ 263 mil em bens, que incluíam três carros, uma moto e um prédio de dois andares em Rio do Sul.

Segundo a revista Veja, em 2014 ele cumpriu pena de dois meses e 29 dias por violência doméstica; o processo está sob segredo de Justiça. Também respondia a ações penais por violar regras sanitárias de controle da pandemia de covid-19.

Em depoimento à PF na manhã desta quinta-feira, a ex-mulher do autor do atentado afirmou que a intenção dele era matar o ministro Alexandre de Moraes, do STF.

Preparativos

Segundo o portal UOL, Wanderley Luiz circulou pelo anexo 4 da Câmara durante toda a quarta-feira. O local, que abriga boa parte dos gabinetes dos deputados, é de livre acesso; visitantes têm que passar por um detector de metal, mas não há revista.

Ele havia alugado uma casa em Ceilândia, nos arredores de Brasília. Após as explosões, policiais fizeram buscas no local e encontraram diversos artefatos explosivos. O imóvel, segundo os investigadores, estava em completa "desordem".

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, a casa voltou a ser isolada para perícia após passar a manhã de quinta-feira inteira aberta a curiosos, sem nenhum controle.

Ainda de acordo com o diário paulista, Wanderley Luiz teria deixado um recado no espelho do banheiro do imóvel para uma das presas pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, escrito com batom vermelho: "Débora Rodrigues por favor não desperdice batom!!! Isso é para deixar as mulheres bonitas!!! Estátua de merda se usa TNT".

Rodrigues, que está presa desde março do ano passado, usou um batom naquele dia para pichar a estátua em frente ao STF com a frase "Perdeu, mané".

Homem-bomba exibia sinais de radicalização nas redes sociais

Perfis em redes sociais atribuídos a Wanderley Luiz e agora desativados continham diversas publicações que indicam um perfil de radicalização de extrema direita, com ataques a "comunistas", mensagens de cunho religioso e contra o Judiciário. As mensagens são essencialmente capturas de telas de textos que Wanderley Luiz teria mandado para si mesmo no Whatsapp e depois publicado na sua conta no Facebook.

Ele também anunciou previamente em dezenas de mensagens que pretendia executar algum tipo de ataque, e mencionou o dia 13 de novembro como data de um "grande acontecimento".

"Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas", escreveu o homem dias antes do ataque, citando nomes de políticos como José Sarney, Geraldo Alckmin e Fernando Henrique Cardoso.

Em mensagem obtida pela polícia, Wanderley Luiz indica que os investigadores teriam das 17h48 do dia 13 até o dia 16 de novembro para encontrar os explosivos.

Em outras mensagens, ele pareceu expressar a vontade de se tornar um mártir. "Não chores por mim! Soria!!! (sic) Entrego minha vida para que as crianças cresçam com liberdade", escreveu.

Horas antes do atentado, Wanderley Luiz voltou a ameaçar líderes políticos: "Cuidado ao abrir gavetas, armário, estantes, depósito de materiais, etc."

No Boletim de Ocorrência, a Polícia Civil faz menção às mensagens e constata que elas haviam "manifestado previamente a intenção do autor em praticar o autoextermínio e o atentado a bomba contra pessoas e instituições".

Wanderley Luiz também publicou uma foto em que aparece no interior do plenário do STF, com a mensagem "deixaram a raposa entrar no galinheiro". Segundo o site Poder360, Wanderley Luiz esteve no STF em 24 de agosto, durante uma visitação pública, ocasião em que a fotografia foi feita.

Na rede X, Wanderley Luiz também compartilhava mensagens de cunho religioso e publicou um vídeo que mostrava o republicano Donald Trump num comício nos EUA.

De acordo com a Folha, o deputado federal bolsonarista Jorge Goetten (Republicanos-SC) disse que conhecia Wanderley Luiz e que se encontrou com ele em agosto, na mesma época em que o chaveiro visitou o STF.

Em uma mensagem enviada num grupo de Whatsapp, o deputado contou que conhecia Wanderley Luiz e sua família e que o chaveiro "realmente aparentava severos problemas mentais". Ao jornal, ele disse que "no ano passado, comentei no gabinete que tinha achado ele meio estranho, emocionalmente abalado. Ele falava muito da separação dele. Ele me pareceu meio abalado".

Alvo corriqueiro da extrema direita, STF volta a sofrer nova ameaça

Nesta quinta-feira, o STF voltou a ser alvo de ameaças. Segundo o blog da Daniela Lima, no G1, email enviado à instituição diz que não haverá descanso até que a Corte seja eliminada. A mensagem foi acompanhada de uma foto de uma arma de fogo ao lado de dois livros religiosos.

O STF é há anos um dos principais alvos de ataques da extrema direita brasileira, que enxerga o tribunal como intrusivo e um obstáculo no caminho do bolsonarismo. As disputas entre o STF e os apoiadores de Jair Bolsonaro começaram ainda em 2019, quando o tribunal passou a investigar bolsonaristas suspeitos de propagar fake news e ataques a ministros.

A relação continuou a se deteriorar nos anos seguintes. Em 2021, o então presidente Jair Bolsonaro chegou a afirmar que não pretendia mais cumprir ordens do ministro do STF Alexandre de Moraes.

No final de 2022, um bolsonarista foi preso em flagrante por terrorismo, após confessar ter montado um artefato explosivo que foi instalado em um caminhão-tanque, perto do Aeroporto de Brasília.

Semanas depois, em 8 de janeiro de 2023, o prédio do STF, assim com o Palácio do Planalto e o Congresso, foi invadido e destruído por uma turba de bolsonaristas que tentava alimentar uma ruptura institucional para reverter o resultado das eleições presidenciais de 2022. O STF foi o prédio que mais sofreu danos no ataque.

Reações

Tanto o Congresso quanto o STF decidiram suspender seus trabalhos até às 12h desta quinta-feira, enquanto prosseguiam varreduras em busca de explosivos adicionais nos prédios da região.

Além da investigação conduzida pela Polícia Civil do Distrito Federal, a Polícia Federal também abriu um inquérito, que deve ser remetido ao ministro Alexandre de Moraes.

Diversos membros da classe política reagiram ao episódio. O deputado Arthur Lira, presidente da Câmara pediu uma apuração urgente. "Reafirmo, veementemente, meu total repúdio a qualquer ato de violência", disse.

O ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, Paulo Pimenta, por sua vez, disse: "Os ataques às instituições são ataques à democracia e ao povo brasileiro (…) Cada vez mais, a defesa da democracia, o combate à intolerância e à política de ódio que contaminou setores da sociedade se tornam fundamentais. Não podemos, em hipótese nenhuma, naturalizar atos antidemocráticos".

Já o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE) afirmou na rede X que, caso as explosões que aconteceram em Brasília, tenham "motivação política, que os responsáveis sejam punidos".

"Confiamos nos órgãos de segurança e nas instituições do Estado no cumprimento de suas funções de esclarecer o fato à sociedade brasileira e, caso tenha motivação política, que os responsáveis sejam punidos com o rigor da lei. Basta de violência!", escreveu.

Em pronunciamento publicado no X, o ex-presidente Bolsonaro disse lamentar e repudiar "todo e qualquer ato de violência", referindo-se ao atentado desta quarta-feira como "fato isolado" e atribuindo-o a "perturbações na saúde mental da pessoa que, infelizmente, acabou falecendo".

"Já passou da hora de o Brasil voltar a cultivar um ambiente adequado para que as diferentes ideias possam se confrontar pacificamente, e que a força dos argumentos valha mais que o argumento da força", escreveu, em tom conciliador, antes de apelar às instituições para que "neste momento de tragédia, deem os passos necessários para avançar na pacificação nacional".

Na quinta-feira, reagindo à declaração de Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes disse que as explosões eram fruto do clima extremismo que se instalou no país durante o mandato do ex-presidente, e descartou anistia a golpistas.

"O que ocorreu ontem não é um fato isolado do contexto", disse Moraes. "O contexto é um contexto que se iniciou lá atrás, quando o famoso 'gabinete do ódio' começou a destilar discurso de ódio contra as instituições; contra o Supremo Tribunal Federal, principalmente; contra a autonomia do Judiciário; contra os ministros do Supremo e as famílias de cada ministro."

Para Moraes, a "necessária pacificação do país" só é possível com a "responsabilização de todos os criminosos".

"Não existe possibilidade de pacificação com anistia a criminosos", frisou o ministro. "A impunidade vai gerar mais agressividade, como gerou ontem, porque as pessoas acham que podem vir a Brasília, entrar no STF para explodir o STF."

jps/cn/ra (ots)

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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