Os três filhotes de onça-pintada do Parque Nacional do Iguaçu que são esperança para a espécie
Desde o início dos esforços de conservação do felino no parque, em 1990, por meio do projeto hoje conhecido como Onças do Iguaçu, esta é a primeira vez que é registrado o nascimento de três filhotes. Número de onças-pintadas no parque dobrou entre 2009 e 2016.
A segunda-feira, dia 6 de agosto, foi um dia de agitação e alegria para os pesquisadores que trabalham no Parque Nacional do Iguaçu, no Paraná. Nesse dia, a onça-pintada Atiaia (raio de luz, em tupi-guarani) foi avistada com três filhotes. O nascimento das oncinhas é uma esperança para a sobrevivência da espécie na Mata Atlântica, bioma em que está criticamente ameaçada de extinção.
"Numa população de 22 onças no Parque Nacional do Iguaçu, o nascimento de três filhotes é extremamente importante. Em toda a Mata Atlântica, existem apenas cerca de 300 desses felinos. Por isso, a região do parque é chave para conservação da espécie", afirma a bióloga Yara de Melo Barros, coordenadora executiva do Projeto Onças do Iguaçu, que protege a espécie no Parque Nacional do Iguaçu.
Na manhã de segunda-feira, Atiaia e seus filhotes, que têm cerca de dois meses, foram vistos em um trecho da pista asfaltada que cruza o parque. A mãe e duas oncinhas atravessaram a pista, enquanto o terceiro filhote voltou para a mata. No fim da tarde, o filhotinho que havia se separado da mãe foi resgatado pela equipe do projeto e reunido à família.
Foi a primeira vez que a prole foi vista pelos pesquisadores. Antes do encontro, pensava-se que Atiaia tinha dado à luz apenas um filhote.
Estão sendo feito esforços para evitar que os filhotes ou a mãe sejam atropelados na pista do Parque Nacional do Iguaçu - uma área turística. Para isso, o local está sendo sinalizado com placas que informam sobre os filhotes e com cones nos locais onde os animais são avistados com mais frequência. Além disso, os carros que circulam no parque recebem um GPS que monitora a velocidade.
As oncinhas são uma demonstração do sucesso do Projeto Onças do Iguaçu. Desde o início dos esforços de conservação do felino no parque, em 1990, esta é a primeira vez que é registrado o nascimento de três filhotes. O número de onças-pintadas no parque está crescendo - dobrou entre 2009 e 2016.
As principais ameaças à sobrevivência da onça-pintada são a perda de habitat, provocada por desmatamento, e a caça - seja ela esportiva ou para retaliar a morte de rebanhos. "Acuadas em (pequenos) fragmentos de floresta, que não têm populações adequadas de presas, as onças-pintadas podem acabar predando bezerros", diz Yara.
No entanto, segundo a bióloga, "estudos feitos no Pantanal, no sul da Amazônia e no oeste do Paraná indicam que, em média, apenas uma ou duas a cada 100 cabeças de gado são abatidas por onças-pintadas".
Objetivo é aumentar a população de onças-pintadas na região
Além do Parque Nacional do Iguaçu, as onças-pintadas se espalham mais para o sul, no chamado corredor verde. Trata-se uma área de 2 mil quilômetros quadrados que inclui áreas de conservação na Argentina, como o Parque do Iguazu, e o Parque Estadual do Turvo, no Rio Grande do Sul.
O número de onças nesse corredor passou de 50 para 90 entre 2009 e 2016. "Nosso objetivo agora é chegar a 250 indivíduos até 2030", diz Ronaldo Morato, coordenador do Centro Nacional de Pesquisas e Conservação de Mamíferos Carnívoros (Cenap), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). "É uma meta baseada em análises de viabilidade populacional. Se atingirmos esse número, garantimos uma população viável por pelo menos mais 200 anos."
O Projeto Onças do Iguaçu tem uma longa história. Começou por volta de 1990, como parte do doutoramento do biólogo Peter Crawshaw, hoje aposentado, mas ainda colaborador da iniciativa. "Em seu estudo, Crawshaw observou o forte impacto da caça sobre esses felinos", conta Morado, que também é um dos responsáveis pelo projeto.
"O trabalho teve sequência com coordenação de vários pesquisadores. Em 2008, passou a se chamar Projeto Carnívoros do Iguaçu, coordenado pelo Parque Nacional do Iguaçu, em parceria com o Cenap-ICMBio, Instituto Pró-Carnívoros e Instituto de Pesquisas Ecológicas."
Em 2018, recebeu o nome que tem hoje, também com apoio do CENAP-ICMBio e Instituto Pró-Carnívoros. "Ao longo dos anos, várias pesquisas foram feitas e foi estabelecida uma forte relação de parceria com pesquisadores da Argentina", diz Morato. "O objetivo do trabalho é recuperar a população de onças-pintadas e garantir a sobrevivência da espécie na região".
Onças-pintadas são monitoradas por pesquisadores
Outra meta do projeto é minimizar o risco para pessoas e felinos dentro do Parque Nacional do Iguaçu, nas áreas de uso público e zona de uso especial. Para isso, é preciso monitorar 100% das onças que frequentem essas áreas.
"Além disso, o monitoramento nos dá várias informações e possibilidades de atuação", diz Yara. "Podemos saber, por exemplo, quando uma das onças está próxima de locais com pessoas e implementar medidas de proteção adequadas. Também podemos saber se a onça está deixando o parque em direção a propriedades no entorno e adotar medidas para evitar a predação de animais domésticos".
O monitoramento é feito por meio de dois métodos: armadilhas fotográficas e colocação de um colar com GPS nos animais. Desde 2009, oito animais já foram acompanhados dessa última forma. "Atualmente temos um macho com colar", conta Morato. "Agora estamos realizando um esforço de captura de mais quatro desses felinos".
Em maio, por exemplo, foi realizada uma campanha de captura. "Foram 10 dias intensos", lembra Yara. "Após a instalação das armadilhas, elas são checadas a cada hora, 24 horas por dia, para reduzir o tempo que um animal capturado fique nela. Utilizamos o método de laço, que é considerado o mais seguro para a onça e para a equipe".
Yara conta que, depois de muitos dias "de tentativas frustradas, pouco sono e muitos carrapatos", a equipe decidiu encerrar a campanha e retirar os laços. "Quando fomos pegar o último, para nossa surpresa (e total deslumbramento) tinha uma onça na armadilha", diz. "Pense em pesquisadores dando pulos ridículos de alegria na mata."
O animal capturado foi o Croissant, um macho com cerca de 5 anos, que nunca havia sido pego antes. Foi ele que recebeu o colar, que possibilita acompanhar sua movimentação. O grande felino não sabe, mas pode estar ajudando a salvar sua espécie da extinção na Mata Atlântica.