Carandiru: para defesa, PM não pode ser alvo de revanchismo
Na data que marca os 50 anos do golpe militar de 1964, o advogado Celso Vendramini, que defende 15 policiais acusados por quatro homicídios no Massacre do Carandiru, em 1992, diz que não deve haver revanchismo contra os PMs e que o que aconteceu no presídio não deve ser associado às atrocidades cometidas pelos militares durante o período ditatorial (1964-1985). Vendramini, que foi militar da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) disse ainda ser favorável à desmilitarização da polícia, durante o debate que precede o julgamento dos réus.
"Sou a favor da Comissão da Verdade, mas não podemos estender isso (a ditadura) para esses pais de família que são confundidos com a ditadura militar. Nós não podemos ter mais uma polícia militarizada. Vivi a ditadura e não gostei", disse ele.
O advogado disse ainda que não pode concordar com um julgamento ideológico dos réus, tese defendida pela promotoria, que afirma que condenar os réus é uma forma de a sociedade mostrar que não aceita abusos por parte dos policiais.
"Não posso aceitar julgamento ideológico. Não existe essa coisa de julgamento coletivo.
Não tenho como condená-los sem provar a autoria. Há PMs que fizeram três disparos e há quatro homicídios. Isso é inconcebível", disse ele.
Vendramini disse que o julgamento é uma forma de desmoralizar as tropas de elite da Polícia Militar Paulista: Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) e Comando de Operações Especiais (COE).
O advogado creditou a falta de uma individualização das condutas dos PMs ao Estado, que se negou comprar um equipamento ao custo de US$ 540 mil, em 1992, que poderia comparar as balas que atingiram os presos com as armas apreendidas. "Não é fácil ser policial. Se o Estado não investe, como vou culpar o policial?", perguntou.
Julgamento
A partir desta segunda-feira, 15 policiais militares (PMs) acusados de participação na morte de oito detentos - e na tentativa de outros dois homicídios - serão julgados no Fórum Criminal da Barra Funda, depois de mais de 21 anos do ocorrido. Nas três primeiras etapas do julgamento, os PMs que atuaram em três andares do prédio foram condenados a penas entre 96 e 624 anos de prisão.
Relembre o caso
Em 2 de outubro de 1992, uma briga entre presos da Casa de Detenção de São Paulo - o Carandiru - deu início a um tumulto no Pavilhão 9, que culminou com a invasão da Polícia Militar e a morte de 111 detentos. Os policiais são acusados de disparar contra presos que estariam desarmados. A perícia constatou que vários deles receberam tiros pelas costas e na cabeça.
Entre as versões para o início da briga está a disputa por um varal ou pelo controle de drogas no presídio por dois grupos rivais. Ex-funcionários da Casa de Detenção afirmam que a situação ficou incontrolável e por isso a presença da PM se tornou imprescindível.
A defesa afirma que os policiais militares foram hostilizados e que os presos estavam armados. Já os detentos garantem que atiraram todas as armas brancas pela janela das celas assim que perceberam a invasão. Do total de mortos, 102 presos foram baleados e outros nove morreram em decorrência de ferimentos provocados por armas brancas. De acordo com o relatório da Polícia Militar, 22 policiais ficaram feridos.