Delegada: PM achava que Amarildo sabia paradeiro das armas do tráfico
Segunda testemunha da acusação ouvida na primeira audiência do julgamento dos 25 acusados de terem torturado e assassinado Amarildo de Souza, morador da favela da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, a delegada-assistente da Delegacia de Homicídios (DH), Helen Souto, afirmou que o major Edson Santos, então comandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, mandou os policiais irem atrás de Amarildo depois de receber informações de que ele saberia o paradeiro do paiol do tráfico.
Helen disse que o soldado Douglas Roberto Vital ficou sabendo através de uma informante que Amarildo não queria mais cuidar do barraco de armas do tráfico. Ao contar isso ao major, ele teria sido orientado a levar Amarildo para a UPP. Segundo a delegada, a decisão teve relação com o que definiu como o "fracasso" da Operação Paz Armada, realizada dias antes na comunidade pela 15ª Delegacia de Polícia (Gávea) em conjunto com a UPP e que teria, nas palavras de Helen, feito "poucas e inexpressivas prisões e encontrado nada de drogas e armas".
Segundo Helen, o major Edson e outros PMs ajudavam as falsas testemunhas para manter a versão de que Amarildo foi morto pelo tráfico. Prometeram casa, compravam fraldas e davam dinheiro.
Mais cedo, a Justiça ouviu o delegado titular da DH, Rivaldo Barbosa. Ele afirmou que a ação dos policiais foi uma "manobra ardilosa para imputar a terceiros a tortura contra Amarildo", referindo-se a uma das primeiras hipóteses da investigação, de que o ajudante de pedreiro poderia ter sido morto por traficantes. Segundo o delegado, os policiais da UPP já haviam feito ameaças e torturado outros moradores da favela e "podem ter surgido outros Amarildos".
Nesta quinta-feira começam a ser ouvidas as 19 testemunhas de acusação, entre elas 18 delegados e inspetores da Polícia Civil envolvidos na investigação e a esposa de Amarildo, Elisabeth Gomes da Silva.
Os réus respondem pelos crimes de tortura, ocultação de cadáver, fraude processual, omissão imprópria e formação de quadrilha.
O ajudante de pedreiro desapareceu após ser levado por policiais militares para a sede da UPP entre os dias 13 e 14 de junho. De acordo com a denúncia apresentada pelo Ministério Público (MP), o tenente Luiz Medeiros, o sargento Reinaldo Gonçalves e os soldados Anderson Maia e Douglas Roberto Vital teriam torturado Amarildo depois de ele ter sido levado para a base da UPP.
Ainda de acordo com o MP, outros policiais militares são suspeitos de participar ativamente da ação, vigiando do lado de fora da base ou sendo omissos por não terem impedido os atos de tortura contra Amarildo.
A vigésima testemunha de acusação, Júlio Cesar Coutinho, dono do Bar do Júlio, último local em que Amarildo foi visto, chegou à sede do TJ por volta das 20h, atrasado. Ele afirmou que se atrasou para depor porque a intimação chegou poucas horas antes, por conta de problemas com a correspondência.
Em seu depoimento, Júlio afirmou que Amarildo foi abordado por policiais quando estava no bar. Os policiais diziam, “já era boi, já era”, pediram a sua identidade e o levaram embora.
Após ouvir o inspetor de polícia Rafael Rangel, chefe de investigação da Delegacia de Homicídios, a sessão foi encerrada. O julgamento será retomado no dia 12 de março.