Irmão de PC Farias: delegados sugeriram que incriminasse seguranças
O ex-deputado federal Augusto Farias (PPB, antigo PP), irmão do empresário Paulo César Farias, prestou depoimento à Justiça nesta terça-feira, segundo dia do julgamento de quatro policiais militares acusados de envolvimento na morte de PC Farias e da namorada dele, Suzana Marcolino, ocorridos em 1996. Augusto é testemunha da Promotoria (responsável pela acusação) no júri dos quatro réus, que são ex-seguranças do empresário morto. PC Farias, como era conhecido o empresário, ganhou notoriedade após assumir a função de tesoureiro da campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
O julgamento de Adeildo Costa dos Santos, Reinaldo Correia de Lima Filho, Josemar Faustino dos Santos e José Geraldo da Silva, acusados de homicídio qualificado por omissão, foi retomado por volta das 8h45 desta terça-feira. O depoimento do irmão de PC iniciou às 10h30.
Augusto chegou a ser indiciado como mandante dos crimes, mas o inquérito foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em seu depoimento, o empresário afirmou que os delegados responsáveis pela investigação lhe fizeram uma proposta para livrá-lo do indiciamento, jogando a culpa nos quatro réus.
"Eles me falaram: 'nós temos uma forma de não pedir o seu indiciamento'. E eu disse 'que forma é essa?'. 'Você entrega os seguranças e nós não pediremos o indiciamento de vossa excelência'. (...) Eu respondi: 'E a minha consciência? Como eu vou dormir, entregando quatro inocentes?'", afirmou. O juíz Maurício Breda informou que, nesta quarta-feira, vai solicitar a presença dos dois delegados citados por Augusto Farias para esclarecimentos.
Milane Valente de Melo, que era namorada de Augusto na época do crime, foi a primeira a prestar depoimento. Manoel Alfredo da Silva, que trabalhava como vigila da casa de praia onde aconteceu o duplo homicídio, também respondeu às perguntas dos advogados e do juiz.
Depois, também foi ouvida uma testemunha de defesa. Trata-se de Cláudia Dantas Buarque de Holanda, que foi chamada pelos advogados de Adeildo Costa dos Santos.
Suposta tentativa de suicídio
Após o irmão de PC Farias, prestaram depoimento três funcionários que prestavam serviços na casa de praia do empresário: o camareiro Ronaldo Plácido Santiago, a cozinheira Irene Maria da Silva França e o garçom Josinaldo da Silva França.
A cozinheira relatou que o relacionamento de PC e Augusto Farias era "bom", mas citou desavenças entre o empresário e Suzana Marcolino. Irene afirmou que, na noite anterior ao crime, ela preparou um jantar para o casal que, segundo ela, estaria brigando muito.
Questionada pela defesa dos policiais, Irene afirmou que Suzana era muito ciumenta, relatando uma suposta tentativa de suicídio depois de um telefonema entre PC Farias e uma mulher não identificada. "Eu não vi, não, quem comentou foram meus filhos. Disseram que o doutor Paulo recebeu um telefonema, ela ficou enciumada e correu para a praia. Entrou dentro do mar e disse que queria se afogar. Um dos meus filhos que salvou ela", afirmou.
O filho em questão era Josinaldo da Silva França, que trabalhava como garçom na casa e foi ouvido como testemunha após a sua mãe. Diante dos jurados, o garçom relatou o salvamento a Suzana, do qual teria participado o réu José Geraldo da Silva. "O Geraldo pegou ela pelo braço, e ela tentou voltar pro mar. Foi quando o doutor Paulo chegou e falou: 'Suzana, eu não aguento mais'", afirmou o garçom. O funcionário, porém, disse não estar presente na casa de PC Farias no dia do crime.
Jornalista diz que fatos apontavam para crime passional
Outra testemunha a depor nesta terça-feira foi o jornalista Joaquim de Carvalho Gil Filho, que trabalhava para a revista Veja na época e fez reportagens sobre o crime. Ele contou que, desde o início, os repórteres acreditavam que os assassinatos eram "queima de arquivo". "E a ideia era tentar comprovar isso. Porém, todos os fatos que nós apuramos apontavam para um crime passional. Do ponto de vista jornalístico, chegou a ser frustrante", disse o jornalista.
Gil Filho também afirmou que sofreu pressão para divulgar a tese de que o caso se tratava de queima de arquivo. O jornalista disse que conhecia PC Farias "jornalisticamente". "Quando ele, empresário, tinha relacionamento com o Fernando Collor."
O jornalista foi responsável por uma reportagem sobre a incompatibilidade da declaração de renda de PC Farias à época e a vida que o empresário levava. "Ele tinha aviões, algumas propriedades, e isso não constava na declaração de renda", disse.
Durante o depoimento da testemunha, convocada pela defesa, o juiz Maurício Breda e o advogado José Fragoso Cavalcanti chegaram a discutir. O defensor acusou o magistrado de "estar cerceando a defesa" após Breda repreender o jornalista alertando-o de que não era possível emitir juízo de valor.
"Quero que fique registrado em ata o cerceamento de defesa que vossa excelência está fazendo, dizendo que a testemunha tinha que 'se limitar, se limitar' e não fez isso a outras testemunhas", disse o advogado.
Filha diz que família é unida
A filha de PC Farias, Ingrid Farias, também prestou depoimento hoje. Ela, que tinha 16 anos quando o pai morreu, afirmou que sua família "é muito unida". Segundo Ingrid, PC e Augusto Farias tinham um bom relacionamento. "Eram mais que irmãos. (Augusto) era o irmão que ele tinha mais intimidade."
Ingrid afirmou ainda que o pai tinha "total confiança" em seus seguranças. Segundo ela, até hoje José Geraldo da Silva trabalha para a família.
Depoimentos chegam ao segundo dia
Ontem, duas das 27 testemunhas foram ouvidas no fórum - o servente Leonino Tenório de Carvalho e o garçom Genival da Silva França, que trabalhavam para PC Farias. O Ministério Público acredita que os depoimentos deverão durar, pelo menos, dois dias. Na sequência, os peritos serão interrogados e, por último, sentarão no banco dos réus os acusados.
Os crimes
Paulo César Farias e Suzana Marcolino foram assassinados na madrugada do dia 23 de junho de 1996, em uma casa de praia em Guaxuma. À época, o empresário respondia a vários processos e estava em liberdade condicional. Ele era acusado dos crimes de sonegação de impostos, falsidade ideológica e enriquecimento ilícito. A morte de PC Farias chegou a ser investigada como queima de arquivo, já que a polícia suspeitou que o ex-tesoureiro poderia revelar nomes de outras pessoas que teriam participação nos mesmos ilícitos.
Entretanto, a primeira versão do caso, que foi apresentada pelo delegado Cícero Torres e pelo legista Badan Palhares, apontou para crime passional. Suzana teria assassinado o namorado e, na sequência, tirado a própria vida. A versão foi contestada pelo médico George Sanguinetti, que descartou tal possibilidade e, mais tarde, novamente questionada por uma equipe de peritos convocados para atuar no caso. Os profissionais forneceram à polícia um contralaudo que comprovaria a impossibilidade, de acordo com a posição dos projéteis, da tese de homicídio seguido de suicídio.