Pólvora nas mãos de namorada de PC indica homicídio, diz legista
O médico legista Daniel Muñoz afirmou nesta quinta-feira que é "impossível" que os resíduos de pólvora encontrados nas mãos de Suzana Marcolino indiquem que ela tenha cometido suicídio. Muñoz prestou depoimento no julgamento dos quatro policiais militares acusados de envolvimento nas mortes do empresário Paulo César Farias e da namorada dele, ocorridas em 1996. "Não tem como Suzana ter atirado no próprio tórax e ter uma quantidade de resíduos de pólvora na região palmar. (...) Só teria uma saída: se ela estivesse com as mãos na lateral da arma, em posição de defesa", afirmou.
O médico contestou a versão apresentada inicialmente pelas investigações, que afirmava que Suzana havia matado PC Farias com um tiro e, em seguida, atirado contra o próprio peito. Daniel Muñoz participou do caso após ser convocado pelo juiz Alberto Jorge Correia de Barros Lima a integrar uma comissão formada por dois médicos legistas e dois peritos criminais. "Ele nos chamou para fazer o que chamou de 'contraperícia' para reanalisar as provas e separar o que era prova técnica do que era opinião pessoal, porque havia muitas opiniões no primeiro laudo", afirmou.
Segundo o médico, a comissão concordou com vários pontos do laudo, mas discordou de alguns aspectos. Um deles diz respeito aos resíduos de pólvora nas palmas das mãos de Suzana. "Eles concluíram que Suzana atirou contra o próprio tórax segurando a arma com as duas mãos, o que chamamos de empunhadura anômala", disse Muñoz, mostrando fotos de uma simulação da cena.
Porém, de acordo com o legista, testes feitos com a arma nessa posição indicaram que o revólver deixaria resíduos em outras partes das mãos - como os polegares e os indicadores - em vez de sujar as palmas. "Vejam que, quando é feito o disparo, o fogo sai pelas laterais do tambor e pela boca da arma, principalmente."
O médico afirmou que, em vez de suicídio, os restos de pólvora nas palmas das mãos indicam que houve homicídio. No telão, Muñoz mostrou uma imagem de simulação em que aparecia uma mulher em posição de defesa, com uma arma apontada por outra pessoa em direção ao tórax dela.
Daniel Muñoz também contestou o resultado do primeiro laudo a respeito da falta de marcas de sangue na arma - segundo ele, se o revólver estava a 3 centímetros de Suzana, seria lógico ter resíduos de sangue. O médico afirmou que foram realizados testes de simulação do tiro, que concluíram que a mão e a arma ficariam totalmente sujas. "Em outras palavras, deveria ter sangue na arma. Os testes mostram isso. Se não tinha, a hipótese lógica é que alguém limpou a arma. (...) Quando alguém limpa uma arma, não é para tirar o sangue, e sim para remover as impressões digitais."
O legista é a segunda pessoa a prestar depoimento ao júri nesta quinta-feira. Antes dele, o perito criminal Domingos Tochetto também falou sobre as falhas no laudo que concluiu a tese de homicídio seguido de suicídio. A Promotoria alega que o casal foi morto por outras pessoas, com participação ou conivência dos réus, que trabalhavam como seguranças do empresário.
Após o relato de Daniel Muñoz, será iniciado o interrogatório dos réus. Em seguida, o julgamento passará para a fase dos debates entre acusação e defesa. Segundo a assessoria do Tribunal de Júri de Maceió, onde ocorre o julgamento, o juiz quer concluir o caso até sexta-feira.
Estão sendo julgados Adeildo Costa dos Santos, Reinaldo Correia de Lima Filho, Josemar Faustino dos Santos e José Geraldo da Silva, policiais militares que trabalhavam como seguranças de PC. Tesoureiro da campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello, PC Farias era apontado como uma das pessoas mais próximas do então presidente. Ele foi denunciado por sonegação fiscal, falsidade ideológica e enriquecimento ilícito.
O crime
Os PMs trabalhavam como seguranças de PC Farias e são acusados de homicídio qualificado por omissão. Paulo César Farias e Suzana Marcolino foram assassinados na madrugada do dia 23 de junho de 1996, em uma casa de praia em Guaxuma. À época, o empresário respondia a vários processos e estava em liberdade condicional. Ele era acusado dos crimes de sonegação de impostos, falsidade ideológica e enriquecimento ilícito. A morte de PC Farias chegou a ser investigada como queima de arquivo, já que a polícia suspeitou que o ex-tesoureiro poderia revelar nomes de outras pessoas que teriam participação nos mesmos ilícitos.
Entretanto, a primeira versão do caso, que foi apresentada pelo delegado Cícero Torres e pelo legista Badan Palhares, apontou para crime passional. Suzana teria assassinado o namorado e, na sequência, tirado a própria vida. A versão foi contestada pelo médico George Sanguinetti, que descartou tal possibilidade e, mais tarde, novamente questionada por uma equipe de peritos convocados para atuar no caso. Os profissionais forneceram à polícia um contralaudo que comprovaria a impossibilidade, de acordo com a posição dos projéteis, da tese de homicídio seguido de suicídio.