Quadrilha desvia mais de R$ 1 mi em projetos culturais em MT
Os criminosos usavam "laranjas" para assinar espetáculos de dança, peças de teatro e shows que nunca foram realizados
Uma quadrilha conseguiu desviar mais de R$ 1 milhão das secretarias de Estado de cultura de Mato Grosso e municipal de Cuiabá, nos últimos três anos, inventando projetos, como a gravação de CD e vídeo, espetáculos de dança, peças de teatro, shows e outras atividades artísticas, que nunca foram executadas ou, se foram, apenas parcialmente e sem a devida prestação de contas.
O conselheiro estadual de cultura de Mato Grosso, Alceu Marcial Cazarin, foi preso, nesta segunda-feira de manhã, durante a deflagração da Operação Alexandria, desencadeada pela Delegacia Especializada em Crimes Fazendários e Contra a Administração Pública (Defaz). Ele é acusado de coordenar o esquema.
A polícia já pode assegurar que mais de 90% do dinheiro da fraude foi embolsado pelo conselheiro Alceu. A pedido dele, pessoas que não são da cena cultural, ou seja “laranjas”, assinavam os projetos “frios”, encaminhados e votados no Conselho. Empregadas domésticas, um soldado do Exército, funcionários de empresas, e até mesmo pessoas que não sabem ler, nem escrever, se envolviam no esquema. Conforme o secretário de Estado de Cultura, Fabiano Prates, “outros comparsas alimentavam o sonho de ser artista, o que os fazia colaborar com a fraude”.
Essas pessoas não ficavam com nem 3% do valor do projeto. A polícia avalia que boa parte delas sabia que alguma coisa de errada estava acontecendo mas não tinha a consciência plena da dimensão criminal, nem do volume desviado.
Até o final da tarde, a Equipe da Defaz já tinha detido 18 pessoas, sendo 16 na capital e dois no interior - um em Rondonópolis e um e São José dos Quatro Marcos.
A denúncia foi formalizada em 2 de abril de 2014, pela então secretária de Estado de Cultura, Janete Riva, que desconfiou da falta de prestação de contas de vários projetos. Mediante a dificuldade da Secretaria em encontrar os proponentes em débito, ela resolveu levar o caso à Defaz, através do ofício de Nº 041/2014/JUR-SEC/MT, pedindo providências.
O delegado Gianmarco Paccola Capoani, que preside as investigações do caso, disse em entrevista coletiva à imprensa hoje à tarde, que, assim que as investigações foram iniciadas, dois projetos com fraudes grosseiras e que contaram com a participação de proponentes forjados já foram identificados.
Foram encontradas irregularidades em 50 dos 337 projetos aprovados na Secretaria de Estado de Cultura de 2012 a 2014 e pelo menos 25 tinham documentos falsos. Na secretaria municipal de Cuiabá, dos 204 projetos analisados, oito são duplicatas e têm os mesmos proponentes do Estado.
“O conselheiro não pode apresentar projeto. Então precisa de alguém para fazer isso. E esse alguém, quem é? É alguém que não faz parte da área de cultura. Então ele aliciava essas pessoas e forjava documentos, currículos, endereços e elas assinavam o que tinham que assinar, para dar fé aos projetos”, reforça o delegado Rogers Elizandro Jarbas, que também investiga o caso.
A dificuldade, conforme os investigadores, não foi identificar o modo da quadrilha operar, mas provar o envolvimento de todos do grupo, que foi crescendo, à medida que o desvio dava certo.
“A quadrilha toda vai responder, igualmente, por lavagem de dinheiro, crime contra a fé pública, falsificações, peculato, ameaça e outros crimes que podemos identificar ainda no contexto das investigações”, explica o delegado Capoani.
Mediante a Operação Alexandria, todo o corpo de conselheiros está sob suspeita, embora nem todos os integrantes estejam necessariamente envolvidos. O delegado Geanmarco destaca, porém, que só o voto favorável a projetos fraudulentos pode complicá-los.
Por ironia, o debate sobre o que fazer para evitar que novas fraudes ocorram será proposto no âmbito dos próprios conselhos estadual e municipal. No conselho estadual, por exemplo, são sete representantes da classe artística e sete da governamental. O secretário de Estado de cultura, Fabiano Prates, que é locutor de rodeio e preside o conselho, tem somente o poder de desempate. Ela reclama que o dinheiro para cultura já é curto e “a turma ainda quer fazer lobbies”.
De acordo com a Defaz, as duas secretarias de cultura envolvidas movimentaram nos últimos três anos 18 milhões, sendo que 1 milhão caiu no ralo da corrupção.