Tremembé: conheça presídio para onde Lula deve ser mandado
Terra teve acesso a relatório de vistoria da Penitenciária II de Tremembé; situação é acima da média, mas há problemas
Inaugurada em 1955, a Penitenciária Dr. José Augusto César Salgado (Penitenciária II de Tremembé), para onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deverá ser transferido, tem condições acima da média das unidades prisionais do Brasil e mesmo de São Paulo.
A unidade não é superlotada: tem 608 vagas e 526 presos atualmente, contando regime fechado e semiaberto. A quantidade de agentes penitenciários, 105, está praticamente dentro da recomendação de cinco detentos para cada agente. Em vistorias recentes, não foi detectada atuação de facção criminosa, como o Primeiro Comando da Capital, no presídio.
Ainda assim, há problemas. Relatório produzido pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em janeiro deste ano, ao qual o Terra teve acesso por meio da Lei de Acesso à Informação meses atrás, aponta má qualidade na alimentação e na assistência jurídica aos detentos, por exemplo.
“Muitas pessoas presas relataram que praticamente não há atendimento [jurídico], pois não são fornecidas informações sobre o andamento processual, e, nos raros casos em que há atendimento, este é feito de forma ríspida”, diz o documento. Atendimento jurídico é importante para presos em momentos como a defesa de procedimentos disciplinares ou para a passagem do regime fechado para o semiaberto. O serviço é prestado pela Funap, fundação ligada ao governo estadual.
“Inúmeras pessoas presas alegaram que as refeições oferecidas não são de boa qualidade, uma vez que não têm variedade, raramente são incluídas frutas – às vezes é servida banana – e legumes. Além disso, relataram que a quantidade de leite e café – muitos alegaram que o café é ruim – servidos é insuficiente”, escreveram os defensores públicos Leonardo Biagioni de Lima e Thiago de Luna Cury.
Na época da vistoria, as refeições eram produzidas pelos próprios detentos. São servidas nos seguintes horários:
Café – 6h30
Almoço – 11h
Lanche – 14h30
Jantar – 17h
Os defensores públicos ouviram dos presos que há um tempo excessivo entre a última refeição e a primeira.
Apesar de o documento ter sido redigido há cerca de sete meses, ainda pode-se considera-lo recente. O órgão tem pouca disponibilidade de mão de obra. O núcleo especializado na área vistoria cerca de quatro presídios por mês no Estado, de acordo com a Defensoria.
Trabalho, cultura e saúde
Como é comum no sistema prisional, não havia, na época do relatório, vagas de trabalho para todos os presos. Os que conseguiam uma ocupação exerciam funções internas na unidade ou atividades como o conserto de carteiras escolares.
Na prisão em Curitiba, Lula teria adquirido hábito de leitura. Em Tremembé II há duas bibliotecas. A do regime fechado possuía 7.409 títulos quando da visita dos defensores. A biblioteca do semiaberto, 1.209.
Para ter acesso aos livros, os presos tinham de fazer requisição por meio de bilhetes. Os volumes eram recebidos nas celas. Há remissão da pena por leitura na penitenciária – as resenhas, na época da visita dos defensores públicos, eram avaliadas pela Faculdade de Filosofia Dehoniana de Taubaté.
É possível que Lula fique em cela coletiva. Quando determinou a saída do político da carceragem da Polícia Federal em Curitiba, onde está desde abril do ano passado, a juiz Carlina Lebbos negou que o político deveria ficar em uma sala separada.
A vida espiritual de Lula, que recebeu líderes religiosos em Curitiba por diversas vezes, poderá envolver a sala ecumênica da cadeia. Em janeiro, havia cultos às segundas, quartas e sextas.
Segundo o relatório da Defensoria, a Penitenciária II de Tremembé conta com uma equipe de saúde com um clínico geral (que trabalha 12h por semana na unidade), um psiquiatra (12h), dois dentistas (20h cada), dois enfermeiros (30h cada) e dois auxiliares de enfermagem (30h cada).
Em dezembro de 2018, o volume de atendimentos foi o seguinte:
Atendimentos médicos – 246
Atendimentos odontológicos – 66
Atendimentos psicológicos – 84
Atendimentos assistente social – 240
Atendimentos externos – 03
Os defensores públicos ouviram, dos presos, reclamações sobre os atendimentos externos. “Diferentes pessoas presas alegaram que o atendimento médico interno é satisfatório, entretanto, o atendimento externo não ocorre”.
Atendimentos externos acontecem quando um detento tem um problema de saúde complexo demais para ser tratado dentro da unidade.
“Por sua vez, a direção afirmou que, em caso de emergência, as pessoas são levadas ao hospital mesmo sem escolta da PM, se necessário. Apenas informam à polícia que, algumas vezes, vai até o hospital”, diz o relatório.
Doenças comuns fora dos presídios, como hipertensão e diabetes, também são encontradas em presos da unidade. De acordo com o relatório, não havia isolamento de detentos com doenças infectocontagiosas, nem atendimento específico para dependentes químicos.
Os presos afirmam que os produtos de higiene que recebem mensalmente da direção do presídio são insuficientes. O kit descrito no documento tem dois sabonetes, quatro rolos de papel higiênico, cinco lâminas de barbear, uma pasta de dente e uma escova. Havia reclamação semelhante sobre o material de limpeza.
O banho de sol, quando da visita dos defensores públicos, era de duas horas por dia. Das 12h30 às 14h30 em um dos pavilhões e 14h30 às 16h15 no outro.
Os presos também reclamaram dos colchões e do calor na unidade. Haveria, também goteiras e vazamentos. Não havia camas para todos os custodiados.
O caso de Lula
A transferência foi determinada nesta quarta-feira (7) pela juíza Carolina Lebbos, da Justiça Federal do Paraná. O juiz Paulo Eduardo de Almeida Sorci, de São Paulo, decidiu que o destino deve ser Tremembé.
Lula cumpre pena por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do Tríplex do Guarujá. A defesa do político tenta reverter a mudança de local. Até a publicação desta reportagem, Lula ainda estava na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, para onde foi encaminhado em abril do ano passado.
Correção [13.ago.2019 - 9h16]: Inicialmente, foi usado um número desatualizado de presídios vistoriados por mês. A informação foi substituída no texto.