"Usam o Whatsapp para pedofilia", diz delegado do Piauí
Alessandro Barreto, um dos responsáveis pelo pedido de bloqueio do aplicativo, acredita que ele serve como facilitador no ambiente virtual para crimes cometidos em ambientes comuns
"Sabemos que o Whastapp é usado no Brasil para crimes como pedofilia, assaltos e tráfico de drogas. O aplicativo serve como facilitador no ambiente virtual para crimes cometidos em ambientes comuns."
Quem afirma é Alessandro Barreto, delegado do núcleo de inteligência da policia civil do Piauí e um dos responsáveis pela operação que culminou no pedido de bloqueio do aplicativo de mensagens instantâneas mais popular do Brasil.
A BBC Brasil apurou que a investigação, que corre em segredo de justiça, tentaria identificar suspeitos que usariam o app para troca de imagens de crianças e discussões sobre encontros sexuais com menores de idade no Estado. A Secretaria de Segurança do Piauí não confirma a informação.
Segundo o delegado, a polícia pediu que o aplicativo compartilhasse o teor das mensagens trocadas pelos envolvidos. Após tentativas sem sucesso, o juíz Luiz Moura Correia, da Central de Inquéritos de Teresina, ordenou às operadoras de telefonia que bloqueassem o aplicativo em todo o país por não colaborar com as investigações.
Procurados, representantes do Whatsapp não responderam às solicitações de entrevistas feitas pela BBC Brasil. Já as operadoras prometem recorrer da decisão, que consideram "desproporcional".
O último capítulo da novela surgiu na tarde desta quinta-feira. Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, um desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI) pediu que a decisão de bloqueio nacional do app fosse sustada, alegando que a investigação é local e não nacional.
'Desproporcional'
A ordem judicial do juíz piauiense pede que as operadoras bloqueiem os domínios usados pelo Whatsapp - whatsapp.com e whatsapp.net - em seus "backbones".
O termo em inglês significa "espinha dorsal" - no caso, as principais redes por onde passam dados de todos os usuários de internet no Brasil.
À reportagem, Vivo e TIM disseram que o SindiTelebrasil (Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal) falaria em nome de todas as operadoras. A Claro não respondeu aos chamados.
O sindicato se pronunciou por nota. "O setor de telecomunicações recebeu com surpresa a decisão", afirma. "Para o SindiTelebrasil, a medida é desproporcional, já que para conseguir informações de um número reduzido de pessoas, negadas pela proprietária do WhatsApp, decidiu-se suspender o serviço em todo o País."
O delegado piauiense contra-argumenta: "Desproporcional é um aplicativo vir não sei de onde, ser instalado aqui e a polícia ter que ficar em silêncio. A decisão não só não é exagerada como tem amparo legal", diz.
A nota das operadoras prossegue: "O SindiTelebrasil entende que a medida pode causar um enorme prejuízo a milhões de brasileiros que usam os serviços, essenciais em muitos casos para o dia a dia das pessoas, inclusive no trabalho".
Privacidade x prevenção
Adeptos do "zap-zap", como o aplicativo é conhecido por muitos brasileiros, estão divididos em relação ao imbróglio.
A leitora Thayse Amorim defende a decisão judicial: "Não colabora com a Justiça, tem que bloquear mesmo. Ainda mais em casos tão graves como pedofilia", escreveu, via Facebook.
Ícaro Marques concorda: "Eu 'acho' que pedofilia não é liberdade de expressão, então...".
Mas há quem classifique o episódio como "autoritarismo".
"Acho o cúmulo do autoritarismo, por ventura na Internet como um todo não há vídeos de pedofilia? Por que não suspendem logo toda a Internet então? Na verdade o Governo é uma praga que tem a necessidade de controlar tudo e todos", escreveu o internauta Gill Motta no perfil da BBC Brasil no Facebook.
A leitora Rachel Marques concorda: "Autoridades não podem ter acesso às conversas particulares assim, aleatoriamente. Isso viola nosso direito à liberdade de expressão e à privacidade", disse. "Tô do lado do Whatsapp nessa."
Foram necessários sete anos de debate no Congresso para que fosse sancionado o Marco Civil da Internet, conjunto de regras que regem a conduta dos usuários online.
O texto final foi aprovado pela presidente Dilma Rousseff em abril de 2014 e prevê proibição ao acesso de terceiros "a dados, correspondências ou comunicação" pela rede.
A ideia é garantir a liberdade de expressão e a proteção da privacidade e dos dados pessoais.
Apesar de resguardar o direito de expressão dos internautas, o Marco Civil indica que casos de racismo, pedofilia e violência devem ser tratados com rigidez e que estes conteúdos podem ser excluídos sem ordem judicial.
"Após a recusa na colaboração [pelo Whastapp], o que nos restou foi solicitar a suspensão das atividades até que a ordem da Justiça seja cumprida", disse o delegato Barreto.
"A legislação prevê tudo isso. Criminosos estão usando a ferramenta e a polícia não pode ficar inerte."