Análise: Ministério de Lula está longe de refletir uma boa articulação no Congresso
Cara do novo governo está mais próxima da representação social do Brasil, mas ainda mantém de fora maiores partidos da frente ampla e nomes importantes, como Simone Tebet e Marina Silva, diz Marco Antonio Teixeira, cientista político da FGV
Legitimamente eleito presidente da República com pouco menos de 2% de vantagem sobre a votação de Jair Bolsonaro, Lula herda um país extremamente dividido para sua terceira gestão, o que lhe traz um desafio urgente para viabilizar suas propostas e se imunizar contra eventuais crises políticas precoces e agudas: ampliar sua aceitação no cargo tanto em termos de opinião pública como em relação à formação da base de apoio no Congresso Nacional.
O perfil da equipe ministerial é fator crucial para viabilizar tais objetivos. Lula tem demorado mais do que se esperava para anunciar a totalidade dos novos titulares da Esplanada dos Ministérios porque isso implica várias questões e requer ampla negociação para que a redução dos apetites dos aliados tradicionais e do próprio PT por espaços cativos no governo seja assimilada sem grandes traumas.
Além disso, a engenharia política em torno desse processo e o perfil do novo governo requisitou a criação (ou retorno) de ministérios que foram extintos ou incorporados a outros no governo Bolsonaro. Não apenas para acomodar o amplo espectro de apoio, mas também para dar a determinados temas de políticas públicas como Trabalho, Mulheres, Igualdade Racial e Povos Originários entre outros, o adequado tratamento de primeiro escalão que merecem.
Ao anunciar parte expressiva de sua equipe de ministros, Lula revela alguns acertos e entraves que dificultam a formação de um governo mais representativo dos diferentes interesses e grupos sociais. Nos acertos estão uma maior presença de mulheres, de negros e negras em ministérios.
Nos entraves estão o fato de ainda haver controvérsias a serem resolvidas com duas mulheres que foram fundamentais para a sua vitória: Simone Tebet e Marina Silva. Em relação a Simone, ao que tudo indica, ficará fora do governo, pois o PT não abriu mão do Ministério do Desenvolvimento Social, pasta reivindicada por ela. Vale destacar que Simone Tebet esteve mais envolvida na campanha de Lula do que seu partido: o MDB. A presença dela depende muito mais de um gesto de Lula, que implicaria em contrariar o PT. Essa briga ele não quis comprar e anunciou o ex-governador Wellington Dias para o MDS, que vai cuidar do novo Bolsa Família.
Sobre Marina, nome indispensável para a presença destacada do Brasil no debate ambiental internacional, falta resolver questões acerca da Secretaria do Clima e se esta responderá ao Ministério do Meio Ambiente ou à Presidência da República, o que implicaria também na presença ou ausência da ex-ministra Izabela Teixeira no governo.
Já o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin na Industria e Comércio - que Lula chegou a garantir publicamente como nome fora da Esplanada - traduz bem as dificuldades de trazer alguém do setor para a pasta, apesar de o vice ter uma ponte bem construída com esses segmentos.
Por enquanto, a cara do governo Lula está mais próxima da representação social do Brasil com a presença de ministros e ministras de diferentes regiões do País, assim como de negras e negros, mas ainda se mantém longe ser reflexo de uma boa articulação política no Congresso. Faltam, por exemplo, a presença de nomes de partidos fora do grupo tradicional de aliados como o MDB, o União Brasil e o PP, além do PSOL. Possivelmente, a próxima rodada de nomes vai se encarregar de revelar o espaço do Centrão e se o litígio político entre Renan Calheiros e Artur Lira por espaço no governo será equacionado.
*Marco Antonio C. Teixeira é cientista politico, professor e coordenador do mestrado em gestão e politicas públicas da FGV-EAESP