Aras avalia desistir de recurso por dados da Lava Jato
Já há procedimentos internos sobre o compartilhamento na Corregedoria-Geral do MPF, no Conselho Nacional e na própria PGR
A Procuradoria-Geral da República (PGR) avalia não recorrer da decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a autorização para o órgão copiar os dados sigilosos das forças-tarefa da Operação Lava Jato. A cúpula do Ministério Público Federal estuda um recuo estratégico para tentar resolver a questão internamente, sem envolver mais o Supremo.
Isso porque já há procedimentos em andamento na Corregedoria-Geral do MPF, no Conselho Nacional do MP e na própria PGR tratando do compartilhamento. A força-tarefa da Lava Jato no Paraná resiste em liberar o acesso indiscriminado de todos os dados, com o argumento de que há informações sigilosas.
A ofensiva de Aras contra a "República de Curitiba" tem como objetivo revelar se há "segredos" mantidos pela operação. A cúpula da PGR suspeita que procuradores estejam avançando sobre autoridades com prerrogativa de foro.
A discussão, então, foi levada ao Supremo pela própria PGR, em uma ação apresentada pelo vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques. O "número 2" do órgão foi escalado para liderar o que Aras tem chamado de "correção de rumos" da Lava Jato e enquadrar os investigadores que atuam na primeira instância após os nomes dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), terem aparecido em um processo.
No mês passado, após o presidente do Supremo, Dias Toffoli, autorizar a PGR a ter acesso aos dados da Lava Jato, Aras afirmou que, se todo o MP tem 40 terabytes, só Curitiba possui 350 terabytes e 38 mil pessoas com dados depositados. "Ninguém sabe como foram escolhidos, quais os critérios, e não se pode imaginar que uma unidade institucional se faça com segredos", disse ele em uma transmissão ao vivo com advogados. Segundo interlocutores do procurador-geral, os dados não estavam armazenados em canais oficiais do MPF.
A autorização dada por Toffoli, no entanto, foi derrubada por Fachin na segunda-feira, 3. No entendimento da PGR, a decisão do relator da Lava Jato na Corte desobrigou o órgão de prestar explicações ao STF sobre o conteúdo das bases de dados e, por isso, pode ser melhor nem tentar revertê-la.
A PGR afirma que já possui autorização conferida pela 13.ª Vara da Justiça Federal do Paraná para acessar os dados, com base em decisões de 2015 do então juiz Sérgio Moro e pela juíza Gabriela Hardt. Para a Lava Jato, porém, essas ordens não permitem a cópia dos procedimentos sigilosos, que só podem ser compartilhados após solicitações específicas.
Discussão "doméstica"
Na avaliação de procuradores ouvidos pela reportagem, dos dois lados, manter essa discussão no âmbito "doméstico" pode ser melhor para os planos de Aras, uma vez que, quando se trata de temas administrativos, a PGR é a instância máxima na instituição.
Entre procuradores que não fazem parte da PGR, uma das leituras é que manter a discussão no Supremo pode resultar em alguma decisão que Aras não consiga reverter. Ao derrubar o compartilhamento, Fachin alegou questões processuais, apontando que o instrumento utilizado - uma reclamação - não era a via adequada.
Um dos principais argumentos usados pela PGR é que a negativa do envio dos dados pelas forças-tarefa confrontaria uma decisão do Supremo em que se discutiu a unidade do Ministério Público Federal e o deslocamento de integrantes dentro da instituição. "Decisão sobre remoção de membros do Ministério Público não serve, com o devido respeito, como paradigma para chancelar, em sede de reclamação, obrigação de intercâmbio de provas", concluiu Fachin.
Mesmo integrantes da ala mais crítica aos métodos da Lava Jato na Corte avaliam que o pedido de Aras tinha falhas na sua fundamentação. "O compartilhamento é sempre específico, limitado e com finalidade definida. Não pode implicar devassa", disse ao Estadão o ministro Marco Aurélio Mello.
Se a PGR não recorrer, possibilidade que tem ganhado força internamente, pouparia o Supremo do desgaste de ter de julgar a ação de maneira colegiada, após Toffoli e Fachin terem divergido em suas decisões liminares, escancarando as divisões internas em torno dos métodos de investigação da Lava Jato. Seria, então, um problema a menos para a Corte.
A cópia dos dados da Lava Jato no Paraná vinha sendo feita pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise (SPPEA), ligada ao gabinete do procurador-geral, mas foi interrompida na segunda-feira, dia 3, logo após a decisão de Fachin, segundo uma fonte que acompanha o procedimento. A PGR não informa qual o volume de dados já copiados até o momento. Os materiais de São Paulo e do Rio de Janeiro, por outro lado, nem sequer começaram a ser recolhidos.
Três dias depois da decisão de Fachin, a PGR ainda não esclareceu o que vai fazer com os dados já enviados. Uma fonte no órgão com conhecimento do procedimento disse que as informações, obtidas de forma eletrônica, ainda não estão disponíveis para acesso.