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Bolsonaro

Bolsonaro pode ser preso após operação da PF?

Operação Tempus Veritatis na quinta-feira (08) impôs algumas medidas a Jair Bolsonaro, prendeu preventivamente alguns de seus aliados e conduziu mandados de busca e apreensão contra ex-ministros. Tudo isso pode ser sinal de que uma prisão preventiva é iminente?

9 fev 2024 - 06h32
(atualizado às 07h23)
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Por ordem judicial, Bolsonaro teve o passaporte apreendido e não pode fazer contato com outros investigados
Por ordem judicial, Bolsonaro teve o passaporte apreendido e não pode fazer contato com outros investigados
Foto: REUTERS / BBC News Brasil

A Operação Tempus Veritatis da Polícia Federal, ocorrida na quinta-feira (08/02), levantou uma pergunta entre diferentes grupos políticos e de eleitores: o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode ser preso em breve?

Três especialistas em Direito Penal entrevistados pela BBC News Brasil se mostram cautelosos quanto à possibilidade de concretização desse cenário.

Em teoria, eles dizem, não há motivos evidentes para que haja uma prisão preventiva do ex-presidente em um futuro próximo. Mas, na prática, a conduta de algumas figuras-chave no Judiciário — principalmente o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes — pode mudar o curso desse entendimento.

"Se for usar a [Operação] Lava Jato como padrão, eu diria que uma prisão preventiva é iminente. Se nós formos adotar o padrão da jurisprudência dos tribunais superiores e de boa parte da doutrina, dos estudiosos do direito, uma prisão não é iminente", resume o advogado criminalista José Carlos Abissamra Filho, mestre e doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

A prisão preventiva seria o principal meio para a prisão do ex-presidente neste momento, uma vez que não há condenação e nem pena a se cumprir.

O Código de Processo Penal prevê a prisão preventiva em alguns casos. "Ela só é cabível em três hipóteses: se houver risco de fuga, se houver violação da ordem pública e se houver risco para a produção de prova", explica Abissamra Filho.

A Lava Jato, na opinião do advogado, "abusou das medidas cautelares", tanto em prisões preventivas "em situações em que não eram necessárias" quanto em operações de busca a apreensão "fora das hipóteses legais".

Para Abissamra Filho, em teoria a prisão preventiva do ex-presidente não caberia no momento porque as investigações em curso dizem respeito — ao menos do que se tem conhecimento através do que é publicado na imprensa, ele destaca — ao período em que Bolsonaro era presidente.

Não estando mais no Planalto, o ex-presidente não teria o mesmo poder para interferir nas investigações de fatos passados.

Outro ponto destacado pelo advogado é que, por ordem judicial em meio à operação da PF nesta quinta, Bolsonaro teve o passaporte apreendido e não pode fazer contato com outros investigados.

"Isso já poderia ser a medida cautelar", aponta Abissamra Filho, indicando que esse tipo de imposição já afasta a necessidade de medidas mais drásticas para garantir a continuidade das investigações, como por exemplo uma prisão preventiva com o objetivo de impedir que um investigado se comunique com outros.

"Se ele descumprisse [a ordem judicial], aí talvez incidiria a prisão preventiva", indica.

Celso Vilardi, advogado criminalista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), também não vê como provável uma prisão iminente.

"Só haverá a preventiva se surgir um fato novo: uma ameaça a testemunha, um perigo de fuga, uma trama... O que eu acho muito improvável que aconteça", exemplifica Vilardi.

O professor da FGV explica que a perspectiva de não haver prisão preventiva agora não significa que Bolsonaro esteja livre de investigações e acusações.

"Nesse caso o jogo tá posto: agora é uma questão de produção de elementos investigativos para suportar ou não uma denúncia", indica.

Já Davi Tangerino, doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP) e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), destaca mais o que tem sido praticado no contexto recente do que a conduta ideal segundo a doutrina.

Perguntado se uma prisão preventiva de Bolsonaro é possível, Tangerino diz que sim — e argumenta lembrando "das prisões já decretadas".

"A possibilidade de interferir [nas investigações] está tão presente quanto no caso de Anderson Torres, por exemplo", diz Tangerino, referindo-se ao ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro que foi preso em janeiro, quando já não estava no cargo, e ficou quase quatro meses detido.

A Polícia Federal esteve na sede do PL em Brasília nesta quinta (08)
A Polícia Federal esteve na sede do PL em Brasília nesta quinta (08)
Foto: REUTERS/Adriano Machado / BBC News Brasil

A prisão ocorreu poucos dias depois dos ataques de 8 de janeiro, quando Torres era secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. Ele foi preso a pedido da PF e por determinação do próprio Alexandre de Moraes por supostas omissões intencionais que teriam contribuído para os atos do 8 de janeiro em Brasília.

"Eu entendo que a preventiva precisa ter justificativa contemporânea: ainda estar no cargo, tentar fugir, coagir, destruir provas e etc", aponta.

"Todavia, a contemporaneidade vem sendo colocada em segundo plano em algumas decisões de Alexandre de Moraes. Ele tem aceitado a mera possibilidade de coação como suficiente para prisões."

"Usando essa métrica dele, a preventiva de Bolsonaro poderia sair em breve."

Relator no STF de vários inquéritos sobre o 8 de janeiro e sobre o governo Bolsonaro, Moraes foi o responsável nesta quinta-feira por autorizar a PF a realizar a Operação Tempus Veritatis.

A decisão foi tomada no âmbito do inquérito que apura a atuação de milícias digitais.

A operação da PF buscou evidências da suspeita de que havia uma organização que agiu antes e depois das eleições de 2022 para manter Jair Bolsonaro no poder por meio de "tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito".

Além da ordem de entrega do passaporte do ex-presidente e da proibição de contato com investigados, três aliados de Bolsonaro foram presos preventivamente e outros foram alvo de mandados de busca e apreensão — entre eles o próprio Anderson Torres e outros ex-ministros, como os generais Augusto Heleno, Walter Braga Netto e Paulo Sérgio Nogueira.

Em nota obtida pelo jornal Valor, a defesa de Bolsonaro afirmou que a apreensão do passaporte é uma medida "absolutamente desnecessária e afastada dos requisitos legais e fáticos que visam garantir a ordem pública e o regular andamento da investigação, os quais sempre foram respeitados".

"O ex-presidente jamais compactuou com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam", assegurou a defesa.

Como seriam etapas até eventual prisão

Mesmo que alguns dos entrevistados vejam a prisão preventiva de Bolsonaro como improvável, eles explicaram como ela poderia ocorrer.

Esse tipo de prisão precisaria ser solicitado pela Polícia Federal ou pela Procuradoria-Geral da República (PGR), explica José Carlos Abissamra Filho.

O pedido de prisão necessitaria então ser analisado pela Justiça. Bolsonaro não tem mais foro privilegiado, mas outros investigados têm — por isso, o advogado criminalista acredita que a decisão viria do Supremo.

Ela provavelmente seria também monocrática, ele diz.

"A prisão preventiva via de regra é urgente, então não dá tempo de esperar o colegiado. Seria monocrática", indica o criminalista.

Para ele, uma dificuldade para o uso correto da prisão preventiva é que a justificativa da manutenção da ordem pública não é algo que possa ser avaliado objetivamente.

"A cláusula mais usada da prisão preventiva é a manutenção da ordem pública, e essa cláusula é aberta. Então muitas vezes algumas prisões são justificadas assim, mas isso nem sempre é facilmente identificável."

Para Celso Vilardi, a pergunta-chave nesse momento não é se Bolsonaro será preso preventivamente ou não, mas sim como os supostos planos de golpe serão interpretados.

Ela menciona o conceito do direito penal do iter criminis, que em latim significa algo como o "itinerário" ou "caminho" do crime. Isso indica que a Justiça precisará avaliar o que aconteceu no percurso entre a intenção do cometimento de um crime e sua eventual concretização — e se há culpa em alguma dessas etapas.

"Havia intenção? Houve uma desistência? Houve desistência voluntária? Isso é uma atenuante? Acho que esse vai ser o grande debate", aponta Vilardi.

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