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Tatiana Farah

A pataquada de Jefferson foi um tiro no pé de Bolsonaro

Liberdade de expressão não é liberdade para cometer crime

23 out 2022 - 20h40
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Presidente do PTB, Roberto Jefferson sempre esteve envolvido em grandes escândalos da política brasileira. Sempre representou o "tudo isso que está aí" que os jovens carapintadas de 2013, hoje em grande parte aliados de Jair Bolsonaro, diziam combater. Nada disso impediu que muitos desses ativistas, alguns deles com cargos públicos e eletivos hoje, saíssem em defesa de Jefferson sobretudo nos úiltimos dias, depois que o político, que cumpria prisão domiciliar em casa, atacou de forma abjeta a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal. 

É um combo perigoso defender armas, pretensa liberdade de expressão (ainda que a expressão seja criminosa e mentirosa) e desobediência às instituições. É esse o tal do ovo da serpente, sim, da serpente do fascismo.

Roberto Jefferson armado em seu Instagram
Roberto Jefferson armado em seu Instagram
Foto: Reprodução/Instagram

Se você, jovem, der um google na expressão "decisão judicial se cumpre", verá que, até hoje, os políticos, dizendo-se injustiçados ou não, cumpriram as decisões judiciais. Quando Lula estava para ser preso e que diziam que ele fugiria, reagiria ou não obedeceria a decisão de sua prisão, ele tranquilizou o país e se apresentou para ficar detido em Curitiba. O mesmo aconteceu com José Dirceu e José Genoino. Aliás, com todos os petistas já presos. 

Para não sermos injustos, essa linha de "decisão judicial se cumpre" não é exclusiva dos políticos da chamada esquerda. Você pode encontrar Renan Calheiros (MDB-AL) dizendo isso, assim como o próprio Arthur Lira (PP-AL). Até mesmo o esquecido Paulo Maluf (PP). A contestação à ordem da Justiça, sempre válida em qualquer situação, é feita no âmbito da Justiça. 

Pelo menos era assim até hoje, quando Roberto Jefferson achou OK atirar contra a Polícia Federal. Aliás, muita gente graúda da política achou normal também. Cresceu nas bases bolsonaristas a tese de que esse condenado pela Justiça, cujos escândalos de corrupção nunca foram secretos, poderia ser um mártir da liberdade.

Por isso é tão importante saber o que estamos defendendo hoje e quais são as pessoas que estão ao nosso lado. Você acha mesmo que Roberto Jefferson, armado com fuzil e granada em sua mansão no Rio de Janeiro, atirando em polícia, é um defensor da sua liberdade? Você pode colocá-lo ao lado de Tiradentes, Martin Luther King, Mandela? 

Twitter de Bolsonaro neste domingo.
Twitter de Bolsonaro neste domingo.
Foto:

Momentos depois do ataque de Jefferson à polícia, o presidente Bolsonaro se manifestou. Repudiou o ataque, mas afirmou ali, no post do Twitter, que repudiava também "a existência de inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição e sem a atuação do MP". Ou seja, colocou sob suspeição a decisão do STF de deter Roberto Jefferson. 

Muita gente importante da política bolsonarista engrossou esse caldo. Um caldo que começou a ser fervido há meses, com Jefferson fazendo vídeos exibindo armas e proferrindo um discurso como se fosse um herói da liberdade. Mas acontece que o brasileiro é ordeiro. Não gosta desse tipo de atuação. Ninguém quer esse nível de tensão num domingo. Principalmente num domingo que antecede a eleição presidencial. 

Roberto Jefferson e Jair Bolsonaro
Roberto Jefferson e Jair Bolsonaro
Foto: Reprodução

Restou a Bolsonaro largar a mão do aliado e chamá-lo de bandido. Jefferson queria se tornar uma vítima de um suposto cerceamento à liberdade mas virou apenas a patética figura que conseguiu atrapalhar a campanha do amigo Bolsonaro mais do que qualquer adversário conseguiria. Deu tiros na polícia e um tiro no pé do presidente.

Fonte: Tatiana Farah Tatiana Farah é jornalista de política há mais de 20 anos. É repórter da Agência Brasília Alta Frequência. Foi gerente de comunicação da Abraji, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. Repórter do BuzzFeed News no Brasil de 2016 a 2020.  Responsável por levar os segredos do Wikileaks para O Globo, onde trabalhou por 11 anos. Passou pela Veja, Folha de S. Paulo e outras redações, além de assessorias de imprensa. As opiniões da colunista não representam a visão do Terra. 
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