Por que chora, Bolsonaro?
Vídeo de presidente chorando em culto viraliza e expõe, enfim, sua fragilidade
O pastor fala que Deus conhece a dor de cada coração. Que as lágrimas que o homem derrama em segredo não passam despercebidas. Cabisbaixo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) chora. Limpa rápido o rosto e é confortado por aliados. Gravada em um ato de campanha no Recife, no dia 13 de outubro, a cena inundou as redes sociais nesta sexta-feira, 11, como se ele chorasse pelo que perdeu.
Não se sabe o que levou o presidente às lágrimas e se, àquela altura, ele já pressentia a derrota. Sabe-se apenas que ele jamais demonstrou tamanha sensibilidade em nenhuma questão pública. Em seus discursos, sempre falou de armas e do exercício da força, de aniquilar adversários e de homenagear torturadores. Banalizou a morte e, por consequência, o luto e a dor das pessoas mesmo diante de uma pandemia que arrastou 600 mil vidas. A vitória da força sobre o sentimento.
É um alívio saber que o presidente chora. Ainda que chore apenas pelo que lhe aflige, pelo que toca na carne. Não há doença, morte ou fome suficientes para que se derramem lágrimas, nos diz o presidente.
Mas perder… ah, perder sempre é muito doloroso. Trancado no Palácio do Alvorada, o presidente tem demonstrado que não está preparado para lidar com essa dor. Deve ter ouvido demais na vida que homem não chora, que isso é coisa de maricas e que chega de mimimi. É que deve ter ensinado aos filhos e que, certamente, tentou ensinar aos brasileiros. Mas perder… ah, perder faz parte da vida, assim como morrer (ele sempre é muito claro em pontuar isso).
Quem está na lida do emprego e de trazer todo dia o jantar para casa sabe como é perder. Perde-se todo dia. O homem preto inocente perseguido como um bandido pela deputada loira que brandia uma arma nos Jardins deve saber bem o que é uma derrota. Também conhece a derrota aquela mulher negra e periférica demitida do emprego apenas porque não queria votar no candidato dos patrões. E como não saberiam perder aquelas 4.500 famílias de profissionais de saúde que morreram na linha de frente da Covid-19?
Os brasileiros perdemos todos os dias. Uns bem mais que os outros, com certeza. Mas a maioria se levanta no dia seguinte e enfrenta o que a vida lhe apresenta. Fica a dica.
Saber perder é uma arte. E a poeta Elizabeth Bishop nos ensina que “a arte de perder não é nenhum mistério”. “Tantas coisas contêm em si o acidente de perdê-las, que perder não é nada sério. Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero, a chave perdida, a hora gasta bestamente. A arte de perder não é nenhum mistério.”