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Política

Congresso vê retaliação e deixa MPs de Bolsonaro 'caducarem'

Medidas devem perder validade mês que vem; para parlamentares, governo tentou atingir grupos com regras para carteirinhas estudantis

21 jan 2020 - 05h11
(atualizado às 08h32)
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Duas medidas provisórias (MPs) consideradas pelo presidente Jair Bolsonaro como ações positivas de sua gestão devem perder a validade no mês que vem sem nem sequer passarem por análise do Congresso. As medidas, que tratam da emissão de carteirinhas estudantis e da publicação de editais de licitações em jornais, são vistas por parlamentares como retaliação do governo aos grupos afetados por essas novas regras. Por isso, serão arquivadas.

Para não "caducarem", as MPs precisariam ser aprovadas pelo Congresso até 16 de fevereiro, o que, na visão de parlamentares ouvidos pelo Estado, é praticamente impossível, uma vez que os textos não passaram por nenhuma comissão, primeira etapa da análise de qualquer lei. Câmara e Senado voltam do recesso no dia 3.

No fim de semana, o vereador do Rio Carlos Bolsonaro (PSC), filho do presidente, foi às redes sociais para defender a votação das duas propostas. Segundo ele, a MP sobre a publicação de editais economizará "bilhões do pagador de impostos". A medida altera quatro leis para desobrigar órgãos públicos de publicar documentos relativos a licitações em jornais de grande circulação. Com isso, basta a publicação em site oficial e no Diário Oficial da União para que a exigência seja cumprida.

O presidente Jair Bolsonaro durante evento no 1º Distrito Naval, no Rio, onde almoçou com almirantes
O presidente Jair Bolsonaro durante evento no 1º Distrito Naval, no Rio, onde almoçou com almirantes
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil / Estadão Conteúdo

Outra medida similar já havia sido derrubada pelo Congresso. Em agosto, o presidente assinou uma MP para pôr fim à divulgação de balanço de empresas de capital aberto em jornais. Bolsonaro chegou a dizer que a MP era uma "retribuição" à forma como foi tratado pela imprensa durante a campanha. O texto, que perdeu validade em 3 de dezembro, recebeu parecer contrário na comissão que analisou a medida e não chegou a ser pautado no plenário da Câmara. Na época, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que jornais impressos são instrumentos importantes de "divulgação de informação, da garantia da liberdade de imprensa, liberdade de expressão e da nossa democracia".

Para o líder do Podemos na Câmara, deputado José Nelto (GO), qualquer medida que tenha como alvo a liberdade de imprensa será rejeitada pelos parlamentares. "Há duas palavras de que não podemos nos distanciar: liberdade e direito. O que o presidente queria era tolher a liberdade da imprensa", afirmou o parlamentar.

O governo admite que não há como salvar a MP, mas planeja retomar o tema futuramente. "Vai ter que fazer uma análise sobre o mérito da MP, mas também sobre a praticidade. As coisas realmente estão mudando e aí vai chegar um momento que a publicação (de editais de licitações) já será eletrônica", disse o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO).

Já a MP da Liberdade Estudantil retira o monopólio da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) para emissão dos documentos, utilizados principalmente para o pagamento de meia entrada em eventos culturais e esportivos. As entidades são ligadas ao PCdoB, partido de oposição a Bolsonaro.

Na postagem em que cobra a aprovação da MP, Carlos Bolsonaro compartilhou um vídeo no qual o pai defende a proposta. "Vamos facilitar a vida dos estudantes. Não vão ter que pagar mais para a UNE, que quem manda lá é o PCdoB", diz o presidente, que, depois, afirma que o partido terá de "arranjar dinheiro em outro lugar".

Retaliação

Segundo o líder da minoria no Congresso, Carlos Zarattini (PT-SP), medidas consideradas como "retaliação" do governo não vão prosperar. "Apesar de o Congresso ser bem conservador, nem todos apoiam medidas extremistas", afirmou o deputado.

Além de acabar com a exclusividade da UNE e da Ubes na emissão de carteirinhas, a MP de Bolsonaro prevê a criação de um documento digital para que estudantes possam ter direito à meia entrada. Mesmo com a possibilidade de a medida caducar, o MEC tem feito propaganda em rede nacional de televisão da nova carteirinha.

Segundo a pasta, desde que a MP foi assinada, em setembro, mais de 184 mil documentos foram emitidos gratuitamente. Cada carteira digital custa, ao governo, R$ 0,15, ante cerca de R$ 35 cobrado por UNE e Ubes. O governo ainda gasta R$ 250 mil com hospedagem e desenvolvimento de sistemas. Os dados também são usados para manutenção do cadastro do sistema educacional brasileiro. Procurado, o MEC não informou o que acontecerá caso a MP não seja aprovada.

Pensão em casos de zika aguarda aval do Senado

Outra medida provisória que corre o risco de perder a validade é a que determina o pagamento de pensão vitalícia para crianças com microcefalia por causa do vírus da zika. A medida, já aprovada pela Câmara, precisa passar pelo crivo dos senadores até 12 de fevereiro. Apesar do prazo apertado, congressistas acreditam que ela será chancelada com facilidade.

O relator na comissão mista que analisou o texto, senador Izalci Lucas (PSDB-DF), disse esperar que não haja resistência no plenário do Senado. "Foi feito um acordo na comissão. Foi aprovado com unanimidade. Ninguém deve votar contra essa medida, não vejo nenhuma preocupação ou risco", afirmou.

Pelo texto do governo, cerca de 3 mil crianças nascidas entre janeiro de 2015 e dezembro de 2018 têm direito ao benefício. Os deputados, no entanto, ampliaram o prazo para nascidos até o último dia de 2019, o que deve elevar o número de beneficiados. Dados do Ministério da Saúde apontam que os casos de infecção pelo vírus aumentaram de 8,7 mil em 2018 para 10,7 mil até novembro do ano passado.

A ajuda financeira é voltada para a população de baixa renda que recebem o Benefício de Prestação Continuada (BPC).

Para receber a pensão do governo, as crianças devem ser submetidas à perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Além disso, as famílias têm de abrir mão de ações judiciais contra o governo e de possíveis indenizações que receberiam no fim do processo.

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