De coadjuvante a protagonista: PMDB faz escalada em 100 dias
Durante esse período, Dilma Rousseff (PT) sofreu derrotas sucessivas no Congresso e viu o partido da base governista se transformar em algoz
Apesar de ter encolhido de 79 para 66 deputados e de 20 para 18 senadores após as últimas eleições, o PMDB continua sendo o fiel da balança no Legislativo, decisivo para a governabilidade. Com o avanço da oposição nas urnas, o partido de políticos históricos como José Sarney, Pedro Simon, Ulysses Guimarães e do atual vice-presidente Michel Temer aproveitou a fragilidade na articulação política da presidente e assumiu papel de comando, na maior parte das vezes saindo em defesa de projetos que vão contra os interesses do governo que ajudou a eleger.
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Após um janeiro de relativa tranquilidade, a posse, em fevereiro, dos novos parlamentares e a sucessiva eleição de Eduardo Cunha e Renan Calheiros para a presidência das duas casas legislativas deram início ao martírio da presidente, que passa por queda brusca de popularidade, rumores de impeachment e vê, dia a dia, o PMDB avançar na definição da agenda do País.
Acompanhe a sequência de fatos que elevaram o PMDB ao centro do poder em 2015.
Dezembro de 2014
Fragilizada após uma vitória apertada nas urnas e com a brusca queda no número de parlamentares do PT, Dilma tratou de reduzir o espaço do seu partido (de 16 para 13 ministérios) e ampliar o número de pastas ocupadas pelo PMDB (cinco para seis) no novo mandato. De largada, o partido do vice-presidente tomou as pastas da Agricultura, Minas e Energia, Turismo, Aviação Civil, Pesca e Portos.
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A manobra foi considerada insuficiente pelos principais caciques do partido, que reclamaram de falta de espaço em ministérios importantes e da ausência de peemedebistas no núcleo próximo da presidente, responsável pela tomada das decisões de governo.
“Se der mais dez ministérios para o PMDB, o problema vai continuar igual”, reclamou Eduardo Cunha ao afirmar que a dificuldade no relacionamento do partido com o PT emergia da ausência de compartilhamento das decisões.
1°de fevereiro – Posse e eleições no Congresso
Se com os parlamentares em férias o clima não estava dos melhores para o governo, o início do ano legislativo deu o empurrão necessário para aprofundar o desconforto da presidente e marcar o avanço acelerado do PMDB.
Após pesada campanha pelo candidato do PT, Arlindo Chinaglia, o governo Dilma viu Eduardo Cunha vencer a eleição para presidência da Câmara dos Deputados ainda em primeiro turno, com 267 dos 513 votos. O peemedebista conseguiu reunir 14 partidos em torno de seu projeto, enquanto o PT atraiu apenas outras quatro legendas e ficou de fora da mesa diretora da Casa pelos próximos dois anos.
De imediato, Cunha anunciou a intenção de votar o segundo turno da PEC do orçamento impositivo, que obriga o governo a liberar recursos para as emendas parlamentares, e a prioridade a projetos como o a reforma política e o pacto federativo.
No Senado, a eleição para o cargo mais importante da Casa ocorreu entre dois peemedebistas, Renan Calheiros e Luiz Henrique da Silveira, senador por Santa Catarina. Com o apoio do governo, Calheiros venceu, o que não representou um alívio ao Executivo.
“Há muito a fazer”, afirmou em seu discurso de posse.
5 de fevereiro – Criação da CPI da Petrobras
Com o governo já abalado pelas denúncias de corrupção na Petrobrás em função da Operação Lava-Jato, Cunha autorizou a criação de uma nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar os supostos crimes cometidos na empresa. Em confronto com PT, reivindicou tanto a presidência quanto a relatoria da CPI, cargos-chave da comissão.
Ao fim, o PMDB levou a presidência e o PT a relatoria, mas viu sua importância reduzida pela ação do peemedebista Hugo Motta (PMDB-PB), apadrinhado por Cunha, que criou sub-relatorias, o que na prática enfraqueceu o poder do partido governista na investigação.
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10 de fevereiro – PEC do Orçamento Impositivo
Ação anunciada por Cunha em seu primeiro discurso, a Câmara concluiu a votação em segundo turno da proposta de emenda à Constituição (PEC) que obriga o governo a pagar a verba destinada pelos congressistas no Orçamento para seus redutos eleitorais. A chamada PEC do Orçamento Impositivo tramitou no Congresso por 15 anos e destina 1,2% da receita corrente líquida (RCL) do ano anterior para as emendas apresentadas por parlamentares.
Câmara dos Deputados aprova PEC do Orçamento Impositivo
3 de março – Renan devolve MP ao Planalto
A articulação política sempre esteve no topo das reclamações do PMDB em relação ao governo. A ação do chefe da Casa Civil, Aloízio Mercadante, e do então ministro de Relações Institucionais, Pepe Vargas, deu mais um sinal de fraqueza com a devolução ao Planalto, pelo presidente do Senado, da Medida Provisória 669/2015, que previa a redução da desoneração da folha de pagamentos, uma das MPs do propagado ajuste fiscal anunciado pela presidente no início do ano.
“Aumentar impostos por meio de medida provisória poucos meses após ter concedido uma vantagem fiscal, que se dizia definitiva, sem a mínima discussão com o Congresso Nacional, é um péssimo sinal para quem deseja vender a imagem da normalidade institucional e econômica do Brasil”, disse Renan Calheiros na ocasião.
Renan devolve MP que reduz desoneração da folha de pagamento
5 de março – Deputados aprovam PEC que eleva idade de aposentadoria no STF
O governo mal tinha se recuperado da devolução da Medida Provisória pelo presidente do Senado e já sofreu outra derrota. Dessa vez, os deputados comandados pelo PMDB aprovaram em primeiro turno a chamada “PEC da Bengala”, que eleva a idade de aposentadoria compulsória dos integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) de 70 para 75 anos. Na prática, a medida tira de Dilma a possibilidade de indicar cinco novos ministros ao STF ao longo do segundo mandato.
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16 de março – PMDB mais próximo
Os protestos de 15 de março reuniram milhões de manifestantes em todo o Brasil. Para responder às demandas das ruas, o governo escalou os ministros da Justiça, José Eduardo Cardoso, e da Secretaria-Geral da Presidência, Miguel Rossetto, como porta-vozes. O resultado da entrevista coletiva comandada por ambos foi considerada um desastre por petistas e aliados. Como resposta, o Planalto tirou Rossetto de cena e colocou o peemedebista, titular da pasta de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB) para apresentar a opinião do governo.
18 de março – PMDB exige saída de Cid Gomes
E se o governo Dilma já não tinha problemas suficientes para enfrentar, a presença no Congresso do ministro da Educação Cid Gomes colocou mais lenha na fogueira. O titular da pasta foi convidado a prestar explicações em plenário sobre uma declaração dada na Universidade Federal do Pará, de que haveria entre 300 e 400 deputados federais “achacadores”. A esperada explicação veio em forma de novos ataques, incluindo ao presidente da Câmara Eduardo Cunha, a quem chamou de “acusado de achaque”.
Resumo da ópera: PMDB ameaçou deixar a base do governo caso o ministro não fosse demitido, o que não foi necessário, já que Cid pediu para deixar o cargo na Esplanada tão logo saiu da sessão.
Sob as ordens de Cunha, a Câmara ainda entrou com dois processos contra o agora já ex-ministro. “O ex-ministro é um desqualificado, teve o destino que queria ter, ao ser demitido. A Câmara o está processando. E eu não vou bater boca com aquele que se acha inimputável. Ele se acha um indígena. Então, efetivamente ali é um caso de processo judicial”, afirmou o presidente da Casa.
Câmara move ação por danos morais contra Cid Gomes
23 de março – Pressionada pelo PMDB e por Lula, Dilma tira Mercadante da articulação política
Após a série de derrotas e reclamações pela falta de diálogo, Dilma tirou o ministro-chefe da Casa Civil, Aloízio Mercadante da articulação política. A jogada da presidente seguiu recomendação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que viu no ex-senador paulista o responsável pela tática de confronto com os peemedebistas.
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24 de março – Câmara aprova regra que muda indexador da dívida dos Estados
Os pedidos da equipe de Dilma foram ignorados e a Câmara aprovou regra que garante a execução da lei que troca o indexador das dívidas dos estados e municípios. O projeto base havia sido aprovado no final de 2014, mas a regulamentação da medida, que na prática alivia os cofres dos mais endividados, havia sido deixada de lado em função do ajuste fiscal promovido pelo governo.
“Achamos importantíssimo tratar da dívida dos Estados, mas não podemos fazer essa despesa. O governo federal não pode dizer para vocês – porque seria inconsequente da nossa parte – que temos espaço fiscal para resolver esse problema”, argumentou Dilma, sem sucesso.
A proposta segue agora para o Senado e é motivo de preocupação para o governo, já que a Casa também comandada pelo PMDB deve aprovar o projeto.
3 de abril – Lula pressiona por mais espaço ao PMDB
Se a articulação segue falha e o governo sofre derrota atrás de derrota no Congresso, o ex-presidente Lula aponta que a concessão de mais espaço ao PMDB no Planalto vai auxiliar na governabilidade. O conselheiro político de Dilma avaliou que a presença de um peemedebista na articulação política seria a forma mais rápida de superar a crise.
7 de abril – Michel Temer assume articulação política
Ignorado pelos caciques do PMDB desde a posse e após pressão de Lula, o ministro das Relações Institucionais, Pepe Vargas, deixou o cargo. A função de negociar projetos de interesse do Executivo no Congresso chegou a ser oferecida ao ministro da Aviação Civil, Eliseu Padilha, que recusou a oferta. Sem opções dentro do PMDB, Dilma delegou a tarefa ao vice-presidente Michel Temer, que passa a participar efetivamente das decisões do núcleo central do governo e assume a articulação junto ao Congresso.