Eleições 2018: Por que as próximas duas semanas serão cruciais para Bolsonaro, Marina, Ciro e Alckmin
Partidos devem definir alianças até o dia 5 de agosto; candidatos lutam por tempo de TV e R$ 1,8 bilhão em dinheiro público
"Guerreiros vitoriosos vencem antes de ir à guerra", escreveu o general e filósofo chinês Sun Tzu (544 a.C. - 496 a.C). No Brasil de 2018, as campanhas políticas não tomam decisões baseadas em livros como A Arte da Guerra, escrito por Sun. Mas para quem pretende se eleger presidente da República é crucial chegar ao começo da propaganda eleitoral, em 31 de agosto, com o apoio do maior número possível de partidos. Nos próximos próximos 15 dias, Jair Bolsonaro (PSL), Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB) farão de tudo para fechar alianças com o maior número possível de legendas.
O calendário traçado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as eleições de 2018 determina que as legendas realizem suas convenções partidárias no período entre a sexta-feira passada (20) e 5 de agosto. É nas convenções que os partidos devem tomar a principal decisão da campanha: se vão disputar com candidato presidencial próprio, apoiar um nome de outro partido, ou se permanecerão neutros.
Junto com o apoio dos partidos vêm o tempo de TV e rádio; o dinheiro dos fundos Eleitoral e Partidário e a "máquina" das legendas - governadores, prefeitos, cabos eleitorais etc.. É com essas armas que os candidatos começam a ganhar a eleição antes da abertura oficial da disputa.
Nesta quinta-feira (26), o grupo de partidos conhecido como "centrão" deve oficializar o apoio ao candidato do PSDB ao Planalto, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin. São cinco partidos: DEM, PP, PR, PRB e Solidariedade. Juntos, os partidos somam 164 deputados federais (número usado no cálculo do tempo de TV e rádio), R$ 440,4 milhões no Fundo Eleitoral e 1.221 prefeitos eleitos em 2016.
No dia 1º de agosto, o PCdoB da pré-candidata Manuela D'Ávila realiza sua convenção em Brasília. A candidatura da deputada gaúcha ao Planalto corre risco: dirigentes do partido estão conversando tanto com Ciro Gomes (PDT) quanto com o PT. Neste fim de semana, a cúpula do partido se reuniu em São Paulo para debater a conjuntura eleitoral - e o encontro terminou com a presidente do partido, Luciana Santos, fazendo um apelo pela unidade dos partidos de esquerda.
'Ele nos encolhe e nos envergonha'
Outro que enfrenta alguma resistência dentro do próprio partido para concorrer é o ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Nesta segunda feira (23), ele foi ao Paraná pedir votos dos delegados que decidirão seu destino no encontro do MDB - o diretório do MDB no Estado, sob influência do senador Roberto Requião, é um dos cinco onde há objeções à candidatura de Meirelles, junto com Sergipe, Alagoas, Pernambuco e Ceará.
"Não podemos permitir que o MDB se preste a servir de legenda de aluguel para a anticandidatura de Henrique Meirelles (...). Com menos de 1% nas pesquisas e uma agenda contra o povo, ela nos encolhe e envergonha", escreveu o senador emedebista Renan Calheiros (AL), numa carta enviada na última sexta-feira (20) aos votantes da convenção do MDB, marcada para o dia 2 em Brasília.
Na mensagem, Calheiros pede que o partido libere seus quadros e negue legenda a Meirelles. Este tem o apoio do senador Romero Jucá (RR), do presidente Michel Temer e de outros caciques da sigla - o cálculo da cúpula do partido é o de que Meirelles tenha 443 dos 629 votos na convenção. O partido tem a segunda maior bancada na Câmara (51 deputados) e a maior fatia do Fundo Eleitoral: R$ 234 milhões.
A BBC News Brasil procurou a campanha de Meirelles, mas ele preferiu não responder diretamente às críticas de Calheiros.
Desafios dos candidatos em Pernambuco
Para Ciro Gomes, a definição mais importante será a do PSB. No dia 30, o partido fará uma reunião de seu Diretório Nacional, em Brasília, que na prática definirá quem a legenda apoiará (a convenção oficial será em 5 de agosto). Os socialistas têm a oferecer uma bancada de 26 deputados e R$ 118 milhões no Fundo Eleitoral. Para comparação, o PDT de Ciro tem R$ 61 milhões neste fundo.
O presidente do PSB, Carlos Siqueira, está apoiando abertamente Ciro. O pedetista também conta com o apoio público do governador de Brasília, Rodrigo Rollemberg.
A principal resistência a Ciro no PSB está em Pernambuco. O Estado nordestino é o "berço" da legenda, e o diretório local defende que o partido fique neutro. O atual governador, Paulo Câmara, quer o apoio do PT local para tentar a reeleição - ou pelo menos que o partido retire a candidatura estadual de Marília Arraes, prima do ex-governador e candidato pelo PSB em 2014, Eduardo Campos (1965-2014).
"A nossa posição é tentar a aliança com o PT em Pernambuco. E eles (PT) têm dito que só admitem apoiar as nossas candidaturas se houver aliança nacional. O nosso interesse é esse, mas Pernambuco não resolve as coisas sozinho", admite o deputado Tadeu Alencar (PSB-PE).
Para que serve uma coligação?
Segundo a cientista política Lara Mesquita, pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), uma coligação grande traz três vantagens importantes para o candidato presidencial: mais tempo de propaganda eleitoral, estrutura partidária com abrangência nacional maior e uma imagem de maior capacidade de governar caso eleito.
As coligações também são fundamentais para aumentar a capilaridade da campanha - devido às dimensões continentais do Brasil, é difícil que os candidatos presidenciais consigam percorrer todo o país durante a campanha. Com uma aliança ampla, o concorrente presidencial terá mais candidatos desses partidos em todo o país pedindo votos em seu nome.
Mesquita ressalta que a proibição das doações de empresas para campanhas aumentou ainda mais a relevância das máquinas partidárias. "O único apoio dos partidos que muitos candidatos a deputado recebem é o material impresso para campanha. Esse santinho do candidato já virá com o nome do candidato presidencial que a coligação está apoiando", exemplifica a pesquisadora.
Qual candidato sai na frente com o cenário atual?
Se o quadro atual se mantiver, o grande beneficiado é o candidato do PSDB, Alckmin.
O apoio do "centrão" - DEM, PP, PR, PRB e SD - foi definido na última quinta-feira (19). A aliança foi selada após um café da manhã na residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em Brasília, seguida de uma reunião à tarde no bairro dos Jardins, em São Paulo.
O deputado Efraim Filho (DEM-PB) diz que o grupo "até fez um esforço" para fechar com Ciro Gomes (PDT), mas a falta de identidade ideológica com o pedetista acabou falando mais alto. "A posição de Ciro é mais à esquerda do que aquilo que o centrão desejava", diz ele. "No fim, optou-se pela alternativa que gera o menor ruído", disse Efraim à BBC News Brasil na noite da quinta-feira.
Em troca do apoio, Alckmin teria se comprometido com algumas demandas do "centrão": apoio a alguns candidatos do grupo nos Estados; suporte à candidatura de Rodrigo Maia (DEM-RJ) ao comando da Câmara dos Deputados em 2019; e a vaga de vice-presidente na chapa para o empresário mineiro Josué Alencar (PR).
No fim da semana passada, o tucano também recebeu promessas de apoio do PTB, do PPS e do PSD. Com o PSDB, o grupo de nove partidos soma 275 deputados federais, mais que a metade dos 513 integrantes da Câmara - o número de deputados é o que determina o tempo de TV de cada candidato.
A super-aliança de Alckmin também controlaria R$ 829 milhões de R$ 1,7 bilhão do Fundo Eleitoral - 48% do total. Além disso, os partidos elegeram 2.933 prefeitos em 2016: uma multidão de possíveis cabos eleitorais para o ex-governador paulista.
Para Deysi Cioccari, cientista política da PUC-SP, a ampla aliança construída por Alckmin lhe dá "uma possibilidade concreta de estar no segundo turno".
Na sua avaliação, embora as redes sociais tenham relevância crescente como meio de informação, elas ainda não terão peso determinante na eleição, porque boa parte da população brasileira vive em pequenas cidades ou no meio rural, onde o uso da internet não é tão intenso.
"No interior, muitas pessoas só ouvem rádio, veem TV. Não tem Twitter, Facebook", ressalta. Cioccari acredita que o tempo amplo de propaganda eleitoral pode ser uma oportunidade para Alckmin recuperar parte dos votos, de um eleitor mais conservador de direita, que perdeu para Bolsonaro.
O que Marina e Bolsonaro podem fazer sem aliados?
Apesar do tempo de propaganda ser importante, nem sempre ele é definitivo para a vitória eleitoral. Lula, por exemplo, venceu as eleições de 2002 e 2006 mesmo não sendo o candidato com mais tempo de rádio e TV.
Nas últimas duas semanas, Jair Bolsonaro (PSL) falhou em construir alianças com o PR e, mais tarde, com o nanico PRP. Já Marina Silva tenta alianças com partidos pequenos, como o PROS, o PMN, o PHS e o PPL (este último indica que lançará como candidato presidencial João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart).
Para Lara Mesquita, da FGV, candidatos com pouco tempo de propaganda, como Marina Silva (Rede) e Jair Bolsonaro (PSL) podem se beneficiar caso o voto de oposição ao governo atual prevaleça nessa eleição.
"Bolsonaro e Marina não foram atingidos pela Lava Jato. Se o fator anticorrupção for importante na definição do voto do eleitor, isso pode beneficiá-los", lembra ainda Mesquita. A reportagem da BBC News Brasil procurou as campanhas dos dois candidatos, mas não houve resposta.
Como são as regras para a formação de alianças?
O calendário do TSE determina que as candidaturas e coligações devem ser registradas até o dia 15 de agosto.
Segundo o advogado eleitoral Gustavo Guedes, os partidos têm adotado como prática usar as convenções para oficializar só os pontos mais importantes - como as alianças presidenciais e os nomes dos candidatos a governador, por exemplo. Definições menos relevantes (como os candidatos a deputados), costumam ser repassadas para comissões eleitorais ou para as Executivas dos partidos.
"A convenção, via de regra, define só os aspectos mais relevantes", diz Guedes. Para definir o número de candidatos a deputado federal, por exemplo, os partidos precisam saber quantos serão os partidos de sua coligação - portanto, esta decisão só pode ser tomada depois de todos os partidos fecharem uma posição, diz o advogado.
As coligações também vão determinar o tempo de TV e rádio para cada candidato presidencial - o número exato é calculado pelo TSE com base nas bancadas dos partidos da Câmara dos Deputados, considerando quais foram as coligações formadas. Isto porque só o número de deputados dos seis maiores partidos na coligação é considerado para o cálculo do tempo de TV do candidato.
Além disso, em maio, alguns partidos questionaram o TSE e o STF a respeito do critério a ser usado: a bancada eleita pelo partido para a Câmara em 2014 ou a bancada atual das siglas na Casa. O cálculo final do tempo de TV de cada candidato também dependerá desta definição.